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Por Leonardo Attuch*
A Constituição brasileira define a liberdade de expressão como um direito fundamental, uma cláusula pétrea. Além disso, proíbe qualquer forma de censura prévia. Nenhum direito, no entanto, é absoluto. Ofensas à honra, à dignidade e à privacidade podem ser coibidas na forma da lei. Esse é o arcabouço básico que rege a comunicação no Brasil e nas sociedades minimamente civilizadas.
A internet, no entanto, acelerou o ritmo da história. As notícias falsas, que existem desde que o mundo é mundo, ganharam, nessa nova era, o rótulo de 'fake news'. Elas proliferam sobretudo em períodos eleitorais, em que interesses rasteiros penetram no submundo da comunicação – sobretudo da mídia corporativa.
Na comunicação digital, o fluxo das ideias passou a ser determinado pelos algoritmos de gigantescas empresas de tecnologia, como Google e Facebook, que têm sido, nos últimos anos, importantes instrumentos de democratização da informação. No entanto, depois de sucessivos escândalos sobre manipulações eleitorais, que atingiram sobretudo o Facebook, essas duas empresas passaram a tratar com cuidado o tema das notícias falsas.
No caso do Facebook, foram contratadas, no Brasil, duas agências de checagem: Lupa e Aos Fatos. A primeira é financiada por João Moreira Salles, herdeiro de um banco privado, e presta serviços a meios de comunicação corporativos. A segunda também oferece seus préstimos a ONGs com interesses no Brasil, como a Transparência Internacional. Na semana passada, essas duas empresas se viram imersas numa crise de reputação. Ambas qualificaram como falsa uma informação que se provou verdadeira – a de que Juan Grabois, consultor do Vaticano, tentou trazer ao ex-presidente Lula um terço abençoado pelo Papa Francisco, assim como algumas palavras do pontífice.
O episódio serviu para revelar os riscos que pairam sobre a sociedade brasileira, depois de sucessivos ataques à democracia. Uma presidente honesta já foi afastada sem crime de responsabilidade, um ex-presidente que lidera todas as pesquisas está preso para ser impedido de disputar as próximas eleições presidenciais e, se tudo isso não fosse o bastante, agora há o risco de uma nova forma de censura, travestida de combate a fake news.
Cabe ao Facebook corrigir seus erros internos e dar uma demonstração cabal à sociedade de que não pretende se converter num superpoder, uma espécie de Big Brother digital, definindo o que circula ou não na internet, no conforto da chancela de agências de fiscalização patrocinadas por bilionários e submetidas a interesses privados. Qualquer ataque liberticida certamente será enfrentado, com rigor e afinco, por todas as forças democráticas da sociedade brasileira. Censura nunca mais!
*Leonardo Attuch é jornalista e editor-responsável pelo 247, além de colunista das revistas Istoé e Nordeste.