Dois dias após o que já considerado o maior atentado terrorista desde o 11 de setembro norte-americano foram suficientes para que as notícias sobre a Somália fossem escanteadas dos principais jornais do Brasil e do mundo.
Nesta segunda-feira (16), autoridades locais informaram que já passa de 300 o número de pessoas mortas após o ataque duplo à bomba ocorrido no último sábado (14) no país africano.
Apesar da gravidade do episódio, a mídia tradicional preferiu dar mais destaque hoje a assuntos relacionados à política, aos incêndios na Europa ou mesmo à "eventos cósmicos".
Para os maiores jornais do Brasil e do mundo, o fato de morrerem 300 pessoas de forma brutal em um país africano historicamente castigado pela miséria e pelos conflitos de milícias locais não é assim tão importante.
As vítimas e a localização geográfica deste tipo de tragédia, no entanto, é um fator determinante para a comoção ou a falta dela nas pessoas, de acordo com o que pauta essa mesma mídia.
Para se ter uma ideia, o último atentado antes ao do país africano, o de Las Vegas (EUA), em que 58 pessoas morreram e outras centenas ficaram feridas, causou uma comoção instantânea baseada na cobertura em tempo real dos principais jornais do mundo. A diferença de tratamento com relação às vítimas e aos lugares onde este tipo de assassinato em massa acontece começa pela escolha do termo.
Em Las Vegas, não é "atentado", é "ataque". O assassino, por sua vez, não é "terrorista", é "atirador". Na Globo, teve até o famoso "plantão". O assunto permaneceu como capa de jornal por dias e dias e a tag #PrayForLasVegas dominou as redes sociais - ela segue, inclusive, como sendo uma das mais utilizadas do Twitter, 15 dias após o fatídico episódio
No The New York Times, por exemplo, a notícia sobre o atentado na Somália já não aparece na capa do portal. Já a atualização do número de feridos hospitalizados em Las Vagas está lá com destaque.
Não é muito diferente do que fez o G1, um dos portais de notícias mais lidos do país. No site vinculado à Globo, não há na capa qualquer menção ao caso da Somália e assuntos como a descoberta de um "evento cósmico" ganharam mais destaque. Folha de São Paulo e Estadão, por sua vez, até deram a notícia, mas sem destaque algum, quase que escondida.
Dada essa seletividade na cobertura jornalística, fica fácil entender o motivo pelo qual apenas dois dias depois as únicas menções à tag #PrayForSomalia sejam apenas de internautas reclamando da falta de destaque do assunto na mídia, mesmo o ataque tendo vitimado mais que o triplo de pessoas que o ataque de Las Vegas, que segue com destaque na mídia mundial.
O que está em jogo neste tipo de atuação da mídia não é se um ataque é mais ou menos grave que o outro, mas a capacidade deste setor de escolher por quem ou não você ou nós devemos nos comover.
Se nós rezamos por Las Vegas ou somos todos Charlie Hebdo, também rezamos pela Somália e somos todos somalis. Episódios como esses devem ser registrados e lembrados no curso da história para que não mais aconteçam. Mas no que depender da mídia tradicional, se for na África, uma nota escondida já é o suficiente.
Eles não deixam de ser humanos só por estarem num continente diferente. Meter-se no lugar dos outros é fundamental... #prayforsomalia pic.twitter.com/Nmv9cGTdVY — #PrayForSomalia (@zanetetuscenia) 16 de outubro de 2017
Mais de 200 mortes na Somália e nenhuma repercussão, se morresse 1 no eua ou na Europa o mundo tava chorando #PrayForSomalia — coe rafael (@Minardittkk) 16 de outubro de 2017
VAMOS COLOCAR NOS TRENDING TOPICS, A ÁFRICA NÃO É MENOS IMPORTANTE QUE O RESTO DO MUNDO #PrayForSomalia — Gabrikel (@zunevester) 15 de outubro de 2017
Mais de 300 morreram em mais um atentado terrorista. Não foi na Europa e sim na África. A dor é igual sabiam? #PrayForSomalia pic.twitter.com/ngzuEzJiT1 — Adriano Barbosa (@adririo) 16 de outubro de 2017
Mais de 300 mortos em atentados na Somália. Não veremos muito destaque na mídia, mas nos solidarizamos aos somalis. Triste.#PrayForSomalia pic.twitter.com/NGjRB5qqt3 — Flamengo Retrô (@flamengoretro) 16 de outubro de 2017
E a mídia quase ñ divulgou.C fossem 3 mortos em Paris tava td mundo chorando.Q triste #ForçaSomália #PrayForSomáliahttps://t.co/JtYqVqOuSg — Rah Novaes (@rahnovaes) 16 de outubro de 2017
Cadê a tag #PrayForSomalia? Ah, não é Paris né, nem Londres! É só a Somália! — Lia ? (@Lia_Lua) 16 de outubro de 2017
231 MORTOS em um atentado na Somália e oq está nos Trends é o braço do Ed Sheeran! um absurdo!!! #PrayForSomalia pic.twitter.com/Ux9nqUf2Aa — Júliazinha (@jjuliadiass) 16 de outubro de 2017
Ninguém soltou um #prayForSomalia na minha TL. A hipocrisia determina só ter alguma relevância o atentado quando é em Paris ou Nova Iorque. https://t.co/ehPJztztdD — André Figaro (@FigaroAndre) 15 de outubro de 2017
Atentado com mais de 200 mortos na Somália e ainda não tem nenhum #PrayForSomalia têm q entender que os que morreram tbm são seres humanos — UCHIHA D.A.N™ (@therealnagatou6) 15 de outubro de 2017
Atentado na Somália, mais de 200 mortos. Ainda não vi nenhum #PrayForSomália. Como é na África, pouco importa. — Célio Pirola (@celiopirola) 15 de outubro de 2017
#PrayForSomalia O continente africano sofre à décadas com uma tragédia humanitária ignorada pelo mundo. Triste demais. — Milt?n Jr. (@jogopegado) 16 de outubro de 2017
Quase 300 mortos e pouco destaque nos grandes portais. Resta a nós, povo do Twitter, prestar solidariedade e procurar ajudar #PrayForSomalia pic.twitter.com/fMHJReAc6a — Estagiário Social 1 (@estag_social1) 16 de outubro de 2017