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Uma plataforma sustentada por todos, inclusive com dinheiro público, não somente deixa de prestar satisfação às legislações locais, como também lucra exatamente por estar imune a qualquer tipo de controle ou regulação democrática. Não é preciso muito esforço de imaginação para intuir onde tudo isso pode parar
Por Vinicius Wu
O Facebook acaba de divulgar seus resultados referentes ao ano de 2015. Os números impressionam e nos dão uma ideia de como as redes sociais digitais estão nos conduzindo à conformação do maior monopólio de informação e comunicação da história da humanidade, em meio à perplexidade e paralisia de governos e organismos internacionais.
A empresa liderada por Mark Zuckerberg ampliou em 44% seu volume de negócios e chegou a faturar U$ 17,9 bilhões em 2015. Somente no quarto trimestre, o Facebook movimentou US$ 5,6 bilhões, registrando um aumento de 57% nos negócios. Já são mais de 1,5 bilhões de usuários da rede no mundo, quase a metade dos seres humanos que acessam a internet em todo o planeta.
A publicidade, com base no armazenamento e processamento de dados de seus usuários, é sua grande fonte de receita. Os investimentos do Facebook em dispositivos móveis surtiram efeito: a publicidade móvel já representa mais de 80% de seus ganhos.
Impressiona o apetite e a força de atração da rede. O Facebook, que já era dono do Instagram e tentou comprar o Snapchat, adquiriu recentemente o Whatsapp, que deve chegar a 1 bilhão de usuários em 2016. Grandes grupos e veículos de comunicação, como o The New York Times, National Geographic e The Guardian, caminham para a oferta de conteúdo diretamente na rede, dispensando o uso de suas próprias plataformas. Isso sem falar no audacioso projeto internet.org, que supostamente pretende oferecer internet gratuita, mas que, na verdade, visa ampliar seu número de usuários com apoio governamental.
A promessa de democratização da informação que a internet suscitou está seriamente ameaçada pela concentração em torno das maiores redes privadas, em especial, o Facebook. E ao contrário do que sugerem os mais ingênuos, não há democracia na circulação de dados e informação na rede de Zuckerberg.
Afinal, os mecanismos de funcionamento de seus algoritmos permanecem sigilosos e poucas informações a respeito deles são acessíveis ao público. A maior parte das pessoas não sabe, mas apenas de 2 a 4% dos amigos de um usuário “comum” consegue visualizar seus posts. Se quiser ir além disso, o usuário tem de pagar para “impulsionar” suas publicações, com anúncios pagos. O Poder Público, por sinal, tem ampliado, significativamente, seus gastos com publicidade no Facebook, mesmo sem qualquer comprovação de que essa modalidade seja eficiente nesse tipo de comunicação.
A monumental massa de dados que circula, diariamente, pela rede social nos dá uma dimensão do tamanho da concentração de informação da plataforma. Pelo Facebook circulam, diariamente, 100 milhões de horas de vídeo. A cada segundo, 4.501 fotos são postadas. Elas se somam às 80 milhões postadas, todos os dias, no Instagram, de propriedade da mesma empresa. Fora as postagens, os comentários, as visitas a milhões de páginas etc. Com base nesse tipo de dado, disponibilizados voluntariamente pelos usuários, que Zuckerberg amplia seus ganhos.
E o problema é que os Estados nacionais estão longe de dar conta da regulação desse mercado. Não há regras claras em relação às políticas de privacidade dos usuários, ao controle e restrição de conteúdo, à observância de legislações locais etc.
Enquanto isso, avolumam-se casos de censura no “Face”, que atentam contra a liberdade de expressão, conflitos com os sistemas de justiça locais, derrubada de páginas e perfis com base em critérios obscuros, dentre inúmeros outros problemas.
Ou seja, uma plataforma sustentada por todos, inclusive com dinheiro público, não somente deixa de prestar satisfação às legislações locais, como também lucra exatamente por estar imune a qualquer tipo de controle ou regulação democrática. Não é preciso muito esforço de imaginação para intuir onde tudo isso pode parar.
É preciso avançar no debate a respeito dos direitos da cidadania no ambiente digital. A liberdade de expressão, o direito à memória e à privacidade – apenas para citar alguns – não podem se subordinar aos interesses de megacorporações que ignoram legislações nacionais e direitos conquistados no âmbito de cada país.
Claro que essa não é uma discussão que se encerra em cada território nacional, isoladamente e, portanto, organismos internacionais têm um papel a cumprir nesse sentido. O fato é que até lá, os lucros das grandes corporações que oferecem serviços na internet seguirão em franca expansão, mesmo ignorando, por tantas vezes, preceitos básicos referentes aos direitos humanos e a soberania das nações.
Foto de capa: Pixabay