Além de auxiliar jornalistas a imergir dentro deste universo ainda pouco conhecido, a separar fatos e mitos sobre alguns recursos da internet e proporcionando uma melhor perspectiva sobre suas prioridades de segurança, o curso também pretende tratar dos paradigmas e das implicações sociais, políticas e econômicas que tornaram a existência dessas ferramentas indispensável para garantir a integridade da troca de informações, possibilitando aos participantes a disseminação dessas técnicas em seus espaços de convivência, ampliando ainda mais a suas redes de comunicação segura
Por Actantes
Há exatamente um ano a TV Conquista, afiliada do SBT no Mato Grosso, sofria um ciberataque. Na ocasião, os dados armazenados em três dos seus computadores foram deletados. A assessoria de imprensa alegou que o conteúdo perdido era “de alta relevância técnica”, mas não entrou em detalhes. Duas semanas antes, no Rio de Janeiro, a casa da jornalista Rebeca Mafra foi “revirada” na sua ausência em busca de “potenciais provas de uma suposta difamação” contra o então pré-candidato à presidência da república Aécio Neves. O ocorrido se deu em meio de uma série de incursões às residências de jornalistas promovidas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Essas incursões – parte controversas, parte ilegais – atendiam à uma representação legal impetrada pelo atualmente senador pelo estado de Minas Gerais. “Levaram um computador, dois HDs externos, pendrive e CD com fotografias pessoais minhas” – contou a jornalista.
Esses dois casos com intervalo de 15 dias são exemplos de situações onde profissionais de comunicação sofreram algum tipo de retaliação ou ataque digital com relação direta à função que desempenham. E não se trata apenas de jornalistas que lidam com uma editoria específica ou outra. Após as “jornadas de junho” o número de relatos de jornalistas e midialivristas que sofreram alguma ameaça à integridade física ou ao conteúdo do seu trabalho, seja por interceptação de suas comunicações digitais ou retaliação direta, cresceu sem que entidades de classe ou entidades representantes do estado de direito pudessem – ou mesmo quisessem – fazer algo.
Diante de um mundo onde a busca pela notícia bate de frente com interesses corporativos e estatais, onde a coerção e a falta de tranparência são inimigos reais do bom jornalismo, a criptografia é uma arma essencial.
Partindo dessa premissa a ACTANTES e a ThoughtWorks Brasil realizarão o curso de técnicas de proteção da comunicação e navegação segura voltado para jornalistas, coletivos de comunicação e estudantes de jornalismo. O curso tem como objetivo compartilhar com os seus participantes informações cruciais sobre segurança da informação permitindo identificar ameaças e utilizar medidas eficazes para proteger a interface digital do seu ambiente de trabalho por meio das ferramentas de criptografia. Batizado de Criptomídia, o curso abordará o funcionamento da WEB e dos e-mails, passando pelas suas vulnerabilidades, tipos de ataque/interceptação das comunicações, até o funcionamento dos tipos de criptografia computacional existentes.
Especialmente vulneráveis
Independente do perfil individual, procedência ou ofício desempenhado, todos estamos tecnicamente vulneráveis à interceptação dos nossos dados pessoais enquanto interagimos com qualquer mínimo elemento conectado à rede mundial de computadores – a ameaça pode partir de algum indivíduo malicioso que trabalha sozinho através de simples “exploits” por conta de alguma questão diretamente ligada ao alvo ou de grandes corporações que dispõem de sofisticados programas para mineração de dados privativos com centenas de linhas de código armazenando perfís em massa e revendendo essas informações a diferentes clientes em diferentes ramos de negócio.
Jornalistas e midialivristas em especial são um alvo em potencial justamente por seu ofício lidar com pautas sensíveis que envolvem interesses delicados. Um flagrante visualmente documentado ou um relato bem embasado em fontes seguras e fatos concretos pode transformar a opinião pública sobre um determinado assunto por conta de uma guinada de perspectiva. Um grande poder de fogo mas que raramente dispõe dos necessários escudos que as ferramentas de criptografia e uma cultura de segurança certamente poderiam lhe prover.
“A melhor defesa é também um ataque”.
Na ultima década, a figura do “whistler blower” se tornou recorrente no universo do jornalismo. De Edward Snowden que detalhou para o jornalista do The Guardian Glenn Greenwald o funcionamento clandestino de um aparato de espionagem da Agencia Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA) a Herve Falciani, o ex-funcionário do HSBC em Genebra que revelou a existência de contas secretas – 5,5 mil delas de correntistas brasileiros, dentro os quais figuram nomes pertinentes da política, do judiciário e da mídia – fruto de sonegação e lavagem de dinheiro e que somadas ultrapassam o montante de mais de 106 bilhões de euros, esses denunciantes elevaram o jornalismo baseado em dados digitalmente documentados a um patamar de incrível relevância. Porém, acessar esses denunciantes muitas vezes só é possível caso seu interlocutor esteja equipado com alguma ferramenta de comunicação criptografada e ciente de algumas medidas de segurança. Caso contrário, essas fontes geralmente recusam qualquer contato justamente por temer por sua integridade física. Um simples e-mail com chave criptográfica pode expadir enormemente o acesso de um jornalista à fontes relevantes e representar a diferença entre um grande furo e um mero “cozido”.
Bem-vindo ao CriptoMídia
Além de auxiliar jornalistas a imergir dentro deste universo ainda pouco conhecido, a separar fatos e mitos sobre alguns recursos da internet e proporcionando uma melhor perspectiva sobre suas prioridades de segurança, o curso também pretende tratar dos paradigmas e das implicações sociais, políticas e econômicas que tornaram a existência dessas ferramentas indispensável para garantir a integridade da troca de informações, possibilitando aos participantes a disseminação dessas técnicas em seus espaços de convivência, ampliando ainda mais a suas redes de comunicação segura.
A princípio, serão 3 turmas com 20 alunos que poderão participar dos 4 módulos de 3 horas nas segundas e quartas ou aos sábados na sede da Actantes que fica na sala 04 da Rua Conselheiro Ramalho, 945, Bela Vista – São Paulo/SP . O curso CriptoMídia é gratuito e as aulas da primeira turma começam no dia 6 de julho. Detalhes sobre o curso como os módulos, datas e horários, bem como as inscrições, estarão disponíveis em actantes.org.br/criptomidia .