CRISE CLIMÁTICA

Saiba quem são os políticos brasileiros negacionistas do clima

Políticos que negam a crise climática ou ignoram suas consequências representam um perigo em relação a tragédias como a do Rio Grande do Sul

Políticos negacionistas do clima.Créditos: Amanda Perobelli/Agência Brasil
Escrito en MEIO AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE el

O discurso negacionista sobre a crise climática voltou a se destacar após as enchentes no Rio Grande do Sul, que afetaram mais de 2 milhões de pessoas. Nas redes sociais, tanto usuários comuns quanto políticos negam a relação entre as ações humanas sobre o meio ambiente e fenômenos extremos como as chuvas que causaram a maior tragédia climática da história do estado gaúcho. 

De um lado, alguns negacionistas encaram como mais um episódio "normal" e comparam com outras situações parecidas. No caso do Rio Grande do Sul, algumas pessoas relembram as enchentes de 1941, que também causaram um estrago no estado. 

Já por outro lado, outros divulgam até teorias conspiratórias para negar a crise climática. Segundo alguns negacionistas, as chuvas no Rio Grande do Sul teriam sido provocadas pelo sistema HAARP,  um projeto de estudo dos Estados Unidos focado na análise da interação de transmissões de ondas de rádio com elétrons e íons livres na ionosfera, usado para aprimorar sistemas de comunicação, como wi-fi, internet móvel para celulares e aplicativos baseados em localização.

A reprodução desses discursos negacionistas representa um perigo para o combate ao real motivo desses fenômenos extremos: a crise climática. Negar essa nova realidade impede que políticas públicas avancem, principalmente se o discurso negacionista estiver sendo reproduzido por políticos - como acontece, e muito, no Brasil. 

O cientista Carlos Nobre, que estuda o aquecimento global, ressaltou a grave ameaça que o crescimento de políticos populistas negacionistas representam. 

"O crescimento de políticos populistas negacionistas é um risco enorme. Bolsonaro não é o único. Milei é um negacionista. Trump é um supernegacionista. Quando era presidente, retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris. Não querem admitir os riscos das alterações climáticas e não querem implementar medidas. Trump já disse que, se vencer, autorizará a exploração de petróleo e gás natural", aponta, em entrevista ao jornalista Bernardo Gutiérrez, no site CTXT.

Abaixo, listamos alguns políticos negacionistas e suas declarações que negam a crise climática.

Jair Bolsonaro

Em 2019, durante seu primeiro ano de governo, Jair Bolsonaro (PL) declarou que o aquecimento global seria um "jogo comercial" ao comentar sobre a Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP-25, que teria sido realizada no Brasil, mas não foi aceita pelo ex-presidente. 

Além disso, Bolsonaro conduziu um dos maiores desmontes ambientais no país, alcançando recordes de desmatamento, destruindo a estrutura do Ministério do Meio Ambiente - onde colocou outro negacionista, Ricardo Salles, à frente da pasta -, dando aval para a mineração e o garimpo ilegal, atacando comunidades indígenas e outras medidas. Durante três anos de governo, Bolsonaro cortou 93% da verba para pesquisa em mudanças climáticas, segundo levantamento da  BBC News Brasil.

Já neste ano, ao falar sobre a tragédia no Rio Grande do Sul, Bolsonaro afirmou que as "problemáticas climáticas" são "pura desinformação" utilizada "pela organização" (governo federal) com o objetivo de atingir um fim: tornar as pessoas dependentes do Estado. Ele também classificou como "tirania verde" e "ecoterrorismo" as práticas ESG ( Ambiental, Social e Governança em português) adotadas em todo mundo para redução do efeito estufa, que vem provocando as mudanças climáticas.

Carlos Bolsonaro 

Em 2019, um dos filhos de Jair Bolsonaro e vereador do Rio de Janeiro, viralizou ao usar o frio para negar o aquecimento global e as mudanças climáticas. Em um post no X (antigo Twitter), ele questionou: "Só por curiosidade: quando está quente a culpa é sempre do possível aquecimento global e quando está frio fora do normal como é que se chama?". Após a declaração, especialistas explicaram a distinção entre tempo e clima e por que usar dias frios é um erro para negar o aquecimento global.

Já em 2024, ele voltou a negar a crise climática. "Mais e mais liberdades que nos são tiradas todos os dias sob a falácia do bem-estar físico e das mudanças climáticas. Quem é o governo para decidir o quê é bom para cada um de nós? Quem é o governo para restringir as nossas liberdades de escolha? Mais: quem é o governo para fazer tudo isso com base numa hipótese tremendamente duvidosa como é essa das chamadas mudanças climáticas? Por trás dessa suposta preocupação com a saúde e a ecologia, está a tentativa de controlar cada aspecto da vida privada para a imposição de uma filosofia de vida coletivista. É a toada do 'você não terá nada, pagará mais caro, mas será feliz' a pleno vapor", publicou, também no X, a partir de uma reportagem do G1 que fala sobre a cobrança de impostos sobre cigarros, bebidas alcoólicas, açucaradas, carro e petróleo. 

Além disso, em um projeto de lei apresentado na Câmara Municipal do Rio de Janeiro no começo deste mês, o vereador propõe proibir a atuação de ONGs socioambientais na cidade e, em seu discurso, também nega a crise climática. 

Flávio Bolsonaro 

No dia 14 de maio, durante votação no Senado para aprovar o projeto de lei que estabelece diretrizes para planos de adaptação climáticas municipais e estaduais, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que votou contra, negou a relação das chuvas no Rio Grande do Sul com a crise climática.

“Eu pergunto: o que está acontecendo no Rio Grande do Sul tem relação com emissão de carbono na atmosfera ou tem relação com o zoneamento urbano de todas as cidades impactadas? Tem a ver com queima de petróleo ou tem a ver com questões geográficas, a realidade regional daquelas várias cidades que estão em uma área suscetível a alagamento?”, disse.

“Se aconteceu algo similar, óbvio que não nas mesmas proporções do que está acontecendo neste momento, em 1941 [quando se deram as enchentes que, até o início do mês, tinham sido as maiores já registradas no RS], no estado do Rio Grande do Sul, é de se concluir, de uma forma lógica, que não é pelas circunstâncias globais”, acrescentou.

Ricardo Salles

Ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro conhecido por "passar a boiada" na Amazônia, Ricardo Salles é mais um dos políticos negacionistas. 

Logo após assumir o cargo, em janeiro de 2019, o ex-ministro acabou com a Secretaria de Mudanças do Clima e Florestas com a justificativa de que as pessoas estavam "fazendo turismo internacional às custas do governo". Ele usou como exemplo a viagem de 48 servidores do ministério para participar da Conferência das Partes (COP) 24 na Polônia. O evento é um dos mais importantes para debater a crise climática e reúne representantes de todo o mundo. 

Além disso, Salles também desistiu de sediar a COP 25 no Brasil naquele ano. Questionado, ele afirmou que o tema das mudanças climáticas  era “um assunto acadêmico controverso” e que havia “muito alarmismo sobre o assunto”

Em 2021, ele voltou a criticar a COP, afirmando que os cientistas queriam "convencer que peido do boi é culpado do efeito estufa", após mais de 100 líderes mundiais firmarem um acordo para reduzir em 30% as emissões de metano até 2030 em relação aos níveis de 2020. 

Antonio Fernando Pinheiro Pedro

Antonio Fernando Pinheiro Pedro, ex-secretário de Mudanças Climáticas do município de São Paulo, declarou em julho de 2023 que o “planeta se salva sozinho” durante  um fórum organizado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para discutir os efeitos da crise climática.

“O planeta não será salvo por nós. Ninguém salva o planeta Terra, geralmente ele se salva sozinho. Ele o faz há 4,3 bilhões de anos. E muda o clima em todo esse período. [...] Nós somos parte do problema para a vida na Terra neste momento, mas nossa solução é muito pequena. Os fatores são de ordem geológica, cósmica e solar”, disse o ex-secretário, que após a afirmação foi exonerado do cargo.

Em janeiro deste ano, o ex-secretário declarou apoio à candidatura de Ricardo Salles. Ele chegou a fazer parte da equipe de transição do governo Bolsonaro e ajudou a elaborar a política adotada pelo ex-ministro do Meio Ambiente.

Ernesto Araújo

Em setembro de 2019, o  ministro das Relações Exteriores de Bolsonaro, Ernesto Araújo, em um uma palestra na Fundação Heritage, centro de estudos conservador em Washington, negou as mudanças climáticas, as queimadas na Amazônia e afirmou que uma "ditadura climática" foi criada em cima do debate ambiental.

Ele ainda acrescentou que tanto Bolsonaro quanto o ex-presidente Donald Trump começaram a ser odiados por se afastarem do "globalismo", que segundo o ex-ministro opera com três instrumentos: "Um é a ideologia das mudanças climáticas, outro é a ideologia de gênero e a terceiro, a oikofobia, o ódio à sua própria nação", disse. "O ponto principal da ditadura do clima, do climatismo, é o fim do debate político normal".

Em 2023, o ex-ministro voltou a negar a crise climática em um artigo em que, novamente, ataca o globalismo, além da China, o Fórum Econômico Mundial em Davos e os governos de esquerda da América Latina.

"Não existe crise climática, mas uma oscilação de temperaturas que já ocorreu muitas vezes no passado e independe das emissões de CO2, como indica o fato de que a temperatura média da terra no período 2015-2022 teve tendência de queda de 0,11 grau centígrados por década, a despeito do aumento contínuo das emissões de dióxido de carbono", afirma um trecho do seu texto.

Em outro, ele diz que "a 'crise climática', principalmente, tornou-se um grande mecanismo de lavagem ideológica das ditaduras"; e que "por meio da adesão à histeria climática, sistemas ditatoriais e propostas autoritárias de toda ordem, desde Maduro e Petro até a China comunista, adquirem respeitabilidade internacional e ganham sua inclusão no sistema que controla os destinos do mundo".

Ricardo Gomes

O vice-prefeito de Porto Alegre também é outro político que atua em prol do negacionismo climático. Além do cargo na prefeitura, Ricardo Gomes também atua como apresentador da produtora Brasil Paralelo, que dissemina diversos conteúdos que negam a crise climática. 

Segundo alguns políticos de Porto Alegre, as atuações como vice-prefeito e vereador, no mandato anterior, sempre foram regidas pelo negacionismo. Como vereador, se posicionou a favor da perda de atribuições pela Secretaria de Meio Ambiente, defendeu que o plano diretor fosse “atropelado” e que passasse a vigorar o autolicenciamento ambiental.

Em uma reunião com integrantes da Câmara Municipal e o prefeito Sebastião Melo, Gomes causou uma confusão com políticos de esquerda que propuseram “socializar” recursos em meio às enchentes em Porto Alegre. Segundo ele, os parlamentares estavam querendo implementar o comunismo.

Negligência

A negligência frente a anúncios globais emitidos por pesquisadores há anos também colabora com as práticas negacionistas. Esse é o caso do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e do prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB). Os políticos não realizam discursos em que negam ou minimizam a crise climática - porque sequer entram no debate sobre o tema. Porém, atuam para promover desmontes ambientais ou ignoram políticas públicas para mitigir os efeitos de eventos extremos.

Eduardo Leite

Apesar de ter negado que não agiu para minimizar os impactos das chuvas no Rio Grande do Sul em razão do negacionismo, o governador Eduardo Leite foi responsável por flexibilizar quase 500 normas ambientais desde 2019, quando assumiu o cargo. Atacar o meio ambiente, principalmente em meio a um cenário em que pesquisadores alertam há anos para a crise climática e a importância da preservação ambiental para mitigar seus efeitos, também é agir como negacionista.

Sebastião Melo

Nesta terça-feira (21), o deputado estadual Matheus Gomes (PSOL-RS) mostrou que o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, agiu com negligência após ignorar uma série de alertas sobre riscos de inundações emitidos pelo Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) desde novembro de 2023. 

Além disso, seu governo não destinou nenhuma verba para a prevenção de enchentes, mesmo tendo R$ 428,9 milhões em caixa, segundo informações publicadas pelo site UOL com base no Portal da Transparência de Porto Alegre.

Os cavaleiros do apocalipse

Há também os políticos que podem não tocar no assunto da crise climática para negá-la, mas que defendem uma série de projetos de lei que atacam o meio ambiente e, consequentemente, agravam as consequências do fenômeno.

O Clima Tempo, o Instituto Socioambiental e o Observatório do Clima listaram os "cavaleiros do apocalipse": políticos que articulam o "Novo Pacote da Destruição" no Congresso Nacional. Para saber mais, leia a matéria Conheça os cavaleiros do apocalipse climático no Congresso segundo entidades ambientais.