A história dos hipopótamos levados para a Amazônia colombiana pelo icônico narcotraficante Pablo Escobar é, talvez, a mais famosa da atualidade a respeito de espécies invasoras que causam impactos ambientais onde são introduzidas, sobretudo reduzindo a biodiversidade. Nesse caso, Escobar trouxe os animais africanos para o seu zoológico particular, em propriedade no meio da floresta. Mas os problemas na Justiça que o chefão do tráfico enfrentou acabaram levando ao abandono do local, e os animais escaparam e passaram a viver soltos na região, causando uma série de danos ambientais e sociais, inclusive tendo matado seres humanos que vivem em comunidades indígenas e tradicionais dada a agressividade da espécie.
Mas a questão das espécies invasoras, que engloba plantas e animais, é muito mais complexa. Assim como no caso de Pablo Escobar, uma das maneiras mais comuns de uma espécie invadir um determinado ecossistema é a ação humana – o incomum desse caso é a criação de um zoológico particular. No geral, é a ação humana a principal promotora das invasões, seja pelo comércio e criação direta dos animais e plantas invasoras, seja de forma indireta, sobretudo a partir do desenvolvimento dos transportes e do turismo, onde muitas dessas espécies podem pegar uma carona para lugares distintos do seu habitat natural.
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Há ainda os casos de animais e plantas domésticos, como cães e gatos, que muitas vezes são abandonados em ambientes naturais, e os casos de tráfico de fauna e flora exóticas.
O problema é que essas espécies invasoras, em geral, não encontram predadores e, ao mesmo tempo, competem com as espécies locais por comida, espaço e abrigo, alterando o equilíbrio ecológico. Entre os impactos finais da invasão, podem ser verificadas extinções de populações inteiras de espécies nativas e a transmissão de doenças, o que pode provocar a redução da biodiversidade de determinada região, podendo afetar inclusive, a saúde e a economia humana.
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Impactos das espécies invasoras no mundo
Uma recente pesquisa da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, na sigla em inglês) apontou que os prejuízos globais decorrentes da ação de espécies invasoras estão na ordem de R$2,1 trilhões, ou 423 bilhões de dólares. Além dos impactos econômicos, medidos pelo desequilíbrio ambiental e sua influência em atividades humanas – em especial na produção de alimentos –, o prejuízo também é calculado com relação a extinção de espécies.
“As espécies invasoras influenciaram 60% e foram a maior causa de 16% das extinções globais de animais e plantas que registramos”, afirmou Aníbal Pauchard, professor da Universidade de Concepción, no Chile, que participou da elaboração do relatório.
A introdução de espécies invasoras figura ao lado do tráfico, da caça, da poluição, das práticas econômicas extrativas e das mudanças climáticas entre as principais causas da perda de biodiversidade em todo o mundo.
De acordo com o estudo, produzido ao longo de 4 anos por 86 cientistas de 49 países, mais de 37 mil espécies foram introduzidas em todo o planeta em ambientes que não eram seus habitats naturais. Entre elas, 3500 são nocivas diretamente ao organismo humano e 2300 foram registradas em terras indígenas, ameaçando o próprio ecossistema onde as comunidades se reproduzem socialmente. Ainda, doenças como a malária e a zika também costumam ser transmissíveis através de espécies invasoras.
“Espécies invasoras muitas vezes são ignoradas até que seja tarde demais, são um grande desafio em todos os países”, afirma nota da IPBES assinada pela pesquisadora Helen Roy, do Centro de Ecologia e Hidrologia do Reino Unido.
No Brasil
Em estudo da revista NeoBioma publicado em 2021 é possível observar que o Brasil gastou o equivalente a R$ 503 bilhões de reais entre 1984 e 2019 com as invasões biológicas. Quase a totalidade desse montante é calculado como perdas econômicas causadas pelas espécies invasoras e apenas 1% entra na conta da verba destinada a prevenção e controle das mesmas.
O Brasil tem uma infinidade de espécies invasoras. Algumas delas, como sagui, são originários de certas áreas do país e invadem ecossistemas de outras regiões. Outras, como o javali, vieram de fora e se reproduzem sem encontrar predadores, mais ou menos como os hipopótamos de Pablo Escobar na Colômbia.
Confira a seguir as cinco espécies de animais invasoras mais famosas do Brasil
Caramujo-gigante-africano
O Lissachatina fulica, ou caramujo-gigante-africano, é, de longe, a espécie invasora que mais causa impactos ambientais e à agricultura no Brasil. Trazido em 1983 do leste e nordeste da África por criadores de escargot, não deu muito certo comercialmente e acabou-se perdendo o controle da espécie.
O animal, bem maior do que um caramujo comum encontrado no Brasil, possui uma concha marrom com tonalidades mais claras e é considerado uma praga. Se alimenta de maneira voraz, danifica plantações e é vetor de doenças que podem afetar a saúde humana.
Javali
Natural da Europa, Ásia e África, o javali chegou à região Sul do Brasil na década de 1960, com a finalidade de ser criado para o abate, uma vez que sua carne é consumida pelos seres humanos. Mas deu errado, uma vez que são muito agressivos e se adaptam facilmente a diferentes ecossistemas. Sua reprodução está descontrolada uma vez que não possuem predadores naturais por aqui. Os principais impactos econômicos afetam principalmente pequenos agricultores.
Os javalis estão na lista das 100 piores espécies invasores do mundo elaborada pela União Internacional de Conservação da natureza.
Coral-sol
Nativo dos oceanos Pacífico e Índico, o coral-sol (que realmente possui um aspecto solar) é conhecido por dominar os locais em que invade, matando as demais espécies de corais. O primeiro registro da sua chegada ao Brasil data de 1951 e a principal teoria é de que tenham vindo pegando carona em cascos de navios. Os litorais de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Santa Catarina, Bahia e Ceará são os principais lugares em que o coral-sol já foi registrado.
Mexilhão-dourado
Natural do continente asiático, a principal teoria para sua chegada ao Brasil é parecida com a do coral-sol. O mexilhão-dourado teria chegado por essas águas de forma acidental através de navios cargueiros. Sem predadores, multiplica-se enormemente e oferece perigo a mexilhões e espécies correlatas nativas.
Sagui
O sagui é um caso de invasão doméstica. Ou seja, oriundo de determinadas regiões do Brasil, sobretudo Norte, Nordeste e Sudeste, acabou sendo introduzido em locais que não o abrigavam naturalmente. Carismáticos e inteligentes, acabaram se tornando espécies invasoras no Sul e Centro-oeste por conta do tráfico de animais.
Uma vez introduzidos em um ecossistema, apresentam comportamento territorialista e, por vezes, agressivo. Se alimentam de répteis, aves e seus ovos, e, na busca por espaço e comida, expulsam espécies nativas. Além disso, também podem ser vetores de doenças que afetam os seres humanos.