EXCLUSIVO: Pânico é condenado por discriminação contra ativista trans não binário

Jovem Pan terá que pagar multa de R$ 40 mil a Rosa Laura

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Rosa Laura, ativista trans não binário, conseguiu vitória judicial nesta terça-feira (27) em ação movida contra Jovem Pan por discriminação promovida pelo programa Pânico. Em setembro de 2020, os apresentadores fizeram chacota de vídeo em que o ativista fala sobre o uso da gramática neutra.

"Verifica-se que se discute nos autos caso de discriminação de gênero. O autor, transgênero não binário, foi exposto ao ridículo por uma emissora de radiofusão, por defender uma demanda em rede social", disse o juiz André Augusto Salvador Bezerra, do Tribunal de Justiça de São Paulo, em sentença que a Fórum teve acesso.

O magistrado aponta que o Pânico não fez uma crítica regular, mas realizou "uma exposição da pessoa do autor ao ridículo, imputando-lhe características que, historicamente, imputam-se a pessoas discriminadas: características relacionadas à objetificação (como se fosse uma coisa) e à uma suposta incapacidade mental deste".

Linguagem neutra

"Para elucidar melhor a questão, é preciso anotar que a demanda sustentada pelo autor se refere ao uso de linguagem neutra. Trata-se de questão que, realmente, tem sido objeto de discussões, baseadas no fato de o uso da língua portuguesa poder incitar discriminações contra estratos populacionais pela terminologia de suas palavras. Nesse sentido, a escritora e teórica portuguesa Grada Kilomba aponta que certas terminologias escritas em português '[…] revelam uma profunda falta de reflexão e teorização da história e herança coloniais e patriarcais […]' (Memórias da Plantação, 2019, p. 14)", diz trecho da decisão.

O juiz destaca que "a linguagem neutra apareceria, então, como uma alternativa ao colonialismo e ao patriarcalismo acima referido, podendo igualar situações que, na forma que se encontram atualmente, colocam determinados grupos sociais em desvantagem perante os demais".

"Politicamente correto"

"Cabe observar ainda que a questão em debate não configura aquilo que setores saudosistas de um bom tempo que nunca existiu [...] de ditadura do politicamente correto", sustenta o juiz. "Não se discute aqui o que é ou não é politicamente correto. Discute-se aqui eventual responsabilização de emissora de radiofusão por transposição dos limites ao exercício da liberdade de expressão à luz do ordenamento jurídico brasileiro", completa.

Com base nesse entendimento, Salvador Bezerra fixou multa de R$40.000,00 à Rádio Jovem Pan por danos morais em razão da discriminação promovida pelo Pânico contra o ativista não binário.

Reconhecimento de pessoas não binárias

A advogada Beatriz Branco, representante legal de Rosa Laura na ação, celebrou a decisão contra o Pânico. "O reconhecimento do judiciário dos direitos de pessoas não binárias é um precedente importantíssimo para a comunidade LGBTQI+. A sentença cita tratados de direitos humanos internacionais, além de estudiosos do tema, para fundamentar os danos morais que foram fixados no máximo pedido por conta da gravidade da conduta", afirma.

"Não trata-se apenas de danos individuais à honra, mas um atentado contra todo um setor da sociedade que resiste diariamente por sua existência e sobrevivência no país que mais mata LGBTQI+ no mundo. Significa um grande avanço na sociedade no reconhecimento desses direitos, inclusive direito de repensar linguagem patriarcal igual o português por linguagem inclusiva a todes", completou.

CONFIRA ABAIXO A SENTENÇA NA ÍNTEGRA: