Advogado analisa repercussão das declarações homofóbicas de Fidelix

Ativistas vão entrar com ação contra o candidato por dano moral coletivo. Porém, para Paulo Iotti, do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual (GADVS), a quantidade de pessoas que apoiou o discurso homofóbico de Levy Fidelix mostra que o Brasil ainda tem muito a evoluir

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Ativistas vão entrar com ação contra o candidato por dano moral coletivo. Porém, para Paulo Iotti, do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual (GADVS), a quantidade de pessoas que apoiou o discurso homofóbico de Levy Fidelix mostra que o Brasil ainda tem muito a evoluir Por Maíra Streit Fórum - Discurso de ódio, injúria, incitação à violência. Do ponto de vista jurídico, quais atitudes do candidato Levy Fidelix, durante o último debate presidencial, no domingo (28), são cabíveis de punição? Paulo - Fidelix transcendeu o "direito a reacionarismos" (e idiotices em geral) que certamente a liberdade de expressão garante, pois ele não se limitou ao simplismo acrítico de suas considerações sobre aparelho excretor. Ele claramente insinuou relação entre homossexualidade e pedofilia, ele patologizou as identidades LGBT ao dizer que toda pessoa LGBT precisaria de "tratamento psicológico e afetivo", defendeu a segregação social de tal população ao dizer que tal "tratamento" teria que se dar "bem longe da gente" e foi, no mínimo, extremamente irresponsável ao falar que a maioria não deve ter medo de enfrentar essa minoria no contexto de uma pergunta que se focava, primordialmente, na violência contra pessoas LGBT – Luciana Genro fez a pergunta que fez focando na violência contra essa população. Irresponsabilidade essa que, reconheça ele ou não, tem efetivamente o condão de incitar a violência contra pessoas LGBT. Tais afirmações levianas, ofensivas à dignidade e à honra de pessoas LGBT em geral, caracterizam dano moral coletivo. Fórum - O Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual (GADVS) e a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABLGT) vão entrar com uma ação judicial coletiva por danos morais contra o candidato. Como está o andamento dessa ação? Paulo - Sim, entraremos com tal ação, de indenização por dano moral coletivo contra a comunidade LGBT. O andamento dela ainda não existe porque ela não foi distribuída, o que providenciaremos o mais rápido possível. Fórum - A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com recurso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pedindo a cassação da candidatura de Levy Fidelix. Quais as chances de deixá-lo, de fato, fora da disputa à Presidência? Paulo - Acho difícil fazer previsões a respeito, mas temos esperança de que isso ocorra, consoante os fundamentos da representação da OAB, assinada por Maria Berenice Dias. Fórum - O senhor acredita que a mobilização em torno do assunto é um sinal de que as coisas estão mudando? A comunidade LGBT e seus apoiadores estão ganhando força contra a intolerância e a discriminação? Paulo - Creio que sim. Sempre digo que estamos vivendo uma verdadeira banalidade do mal homotransfóbico, já que muitas pessoas se sentem detentoras de um pseudo "direito" de discriminar, ofender, agredir e até matar pessoas LGBT por sua mera orientação sexual ou identidade de gênero, e isso por conta da verdadeira sensação de impunidade claramente constante no inconsciente coletivo social relativamente à homofobia e à transfobia. Hoje, pessoas negrofóbicas não se manifestam porque, como costumo dizer, a Lei de Racismo calou os racistas, não se vendo os discursos de ódio/discriminatórios contra negros que víamos no passado. Daí, aliás, a necessidade de equiparar homofobia e transfobia à negrofobia, incluindo-as como espécies do gênero racismo, até porque a Lei de Racismo pune a discriminação por cor, etnia, procedência nacional e religião. Logo, não protege apenas negros, mas vários grupos sociais, inclusive religiosos. Daí a necessidade de incluir "orientação sexual" e "identidade de gênero" nela para proteger a população LGBT. De qualquer forma, concordo que a repercussão do caso mostra que talvez as coisas estejam mudando, mas já vi comentários referendando a fala de Fidelix. Reinaldo Azevedo, da VEJA, com o direitismo que lhe é tradicional, disse que não via nada de ilícito na fala de Fidelix, embora tenha criticado-a, mas o interessante (e trágico) é que vi lá comentários referendando a fala de Fidelix. Uma pessoa comentou na minha página que gostaria que o Brasil tivesse "centenas de milhares de Fidelix. Ou seja, a fala dele tem respaldo em parcela da sociedade, o que é assustador em pleno século XXI. Logo, creio que os repúdios que vimos após a nefasta fala de Fidelix são positivos e podem realmente mostrar um início de consolidação de mudança na tolerância social contra a homofobia e a transfobia, mas infelizmente ainda há muito a caminhar. Foto de capa: Reprodução / Captura de Tela