O passado bizarro e obscuro dos casamentos ingleses que quase ninguém conhece
Poucos sabem dessa tradição curiosa na Inglaterra pós Idade Média que consistia em maridos, literalmente, venderem suas esposas
Antes que o divórcio fosse legalmente aceito e socialmente normalizado, o casamento era visto como um contrato quase inquebrável — uma instituição sagrada, especialmente em contextos religiosos. No entanto, durante séculos, a realidade para muitas mulheres na Inglaterra foi marcada por práticas que hoje seriam consideradas impensáveis. Entre elas, a venda de esposas.
O casamento como propriedade
Na sociedade inglesa dos séculos XVIII e XIX, as mulheres eram frequentemente tratadas como propriedade de seus maridos após o casamento. Essa visão legal e social dificultava (ou mesmo impossibilitava) a separação formal, já que o divórcio era restrito à elite e envolvia custos altíssimos, além de uma longa batalha judicial.
Diante desse cenário, surgiu uma prática informal: a venda de esposas. Os maridos, ao desejarem se desfazer da "obrigação" do casamento, levavam suas esposas a mercados públicos, muitas vezes com uma corda amarrada ao pescoço, braço ou cintura — como se fossem animais — para vendê-las ao maior (ou mais conveniente) interessado.
Nem sempre contra a vontade
Apesar do tom chocante, nem todas essas vendas eram forçadas. Algumas mulheres consentiam com a venda, vendo nela uma oportunidade de escapar de casamentos infelizes e, às vezes, até de começar uma nova vida com um homem de sua escolha. Outras, no entanto, não tinham opção e eram trocadas como mercadorias, reforçando a vulnerabilidade legal e social da mulher na época.
Em alguns casos, as mulheres combinavam previamente a venda com o novo parceiro, e o evento no mercado era apenas uma formalidade simbólica para dar aparência de legalidade à transação.

(foto: wikipédia)
Curiosamente, a prática não era reconhecida oficialmente pela lei inglesa, mas em muitos lugares era tolerada pelas autoridades locais, especialmente em áreas rurais. Os mercados — locais de venda de gado e alimentos — tornaram-se também palco dessas transações conjugais. A população assistia com curiosidade ou indiferença, e há registros históricos em jornais e ilustrações da época que documentam esses eventos com certo grau de naturalidade.
O declínio da prática
Com o passar do tempo, especialmente a partir da segunda metade do século XIX, as mudanças legais e sociais começaram a transformar a realidade das mulheres na Inglaterra. O Matrimonial Causes Act de 1857 tornou o divórcio mais acessível à população em geral. As reformas legais e a luta pelos direitos femininos contribuíram para o gradual desaparecimento da venda de esposas, embora registros ainda tenham sido encontrados até o início do século XX.
A venda de esposas é um episódio sombrio e, muitas vezes, ignorado da história britânica. Ela nos lembra como o casamento — uma instituição muitas vezes idealizada — já foi usado como instrumento de dominação e desigualdade. A normalização do divórcio e os avanços dos direitos das mulheres são conquistas recentes, construídas sobre séculos de lutas e abusos.