CHINA EM FOCO

Como a China passou de um país pobre e feudal a uma potência mundial

Confira o comparativo dos principais índices econômicos e sociais do país asiático em 1949, ano da fundação da República Popular da China, e em 2024, e os planos estratégicos que orientaram esse sucesso

Créditos: Fotomontagem (VCG e Xinhua) - De um país rural e famélico em 1949 à segunda potência mundial com indústria robotizada, a China é vitrine do sucesso do socialista chinês
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Desde 1949, com a vitória da Guerra de Libertação Popular e a fundação da República Popular da China, o país asiático alcançou uma série de avanços significativos em diversos setores, que contribuíram para sua transformação de um país pobre e feudal em uma potência global. 

Estabilização econômica e recuperação pós-guerra: Nos primeiros anos após a fundação da República Popular da China, o governo centralizou a economia e combateu com sucesso a hiperinflação, estabilizando os preços e restabelecendo a ordem econômica. Esse esforço preparou o terreno para os futuros planos quinquenais que impulsionaram a industrialização do país

Reformas agrárias e aumento da produção agrícola: O movimento de reforma agrária redistribuiu terras dos proprietários ricos para os camponeses, o que permitiu a China alimentar uma vasta população, superando desafios históricos relacionados à fome e à pobreza rural.

Industrialização e crescimento econômico acelerado: A China optou por uma estratégia de industrialização planejada pelo Estado, com forte ênfase na indústria pesada, especialmente durante os primeiros planos quinquenais (1953-1957). Na década de 1980, com as reformas de Deng Xiaoping, o país passou por uma abertura econômica que acelerou seu crescimento e ampliou sua inserção internacional. Entre 1990 e 2009, a indústria chinesa representou cerca de 46% do PIB, enquanto a média global foi de 29%

Crescimento da manufatura: O setor manufatureiro chinês, especialmente nas indústrias químicas, metal-mecânicas e eletroeletrônicas, teve um papel fundamental no crescimento econômico, registrando um aumento médio anual de 9,5% entre 1991 e 2007.

Tecnologia e inovação: Nas últimas décadas, a China tem se concentrado na promoção da ciência e da tecnologia, consolidando sua posição como líder global em áreas estratégicas, como a tecnologia espacial e a automação industrial. As políticas industriais do país foram cruciais para garantir essa autonomia tecnológica.

Esses avanços colocam a China em uma posição de destaque no cenário global, com conquistas impressionantes em termos de industrialização, modernização e redução da pobreza.

A transformação da China em 75 anos de socialismo

De um país paupérrimo a uma potência mundial, os avanços da Nova China não foram milagrosos, mas fruto de trabalho árduo, com erros e acertos e muito planejamento. Confira um comparativo dos principais índices econômicos e sociais do país asiático em 1949 (ano da fundação da República Popular da China) e em 2024

Produto Interno Bruto (PIB)

  • 1949: Estimativas sugerem que o PIB da China estava em torno de 30 bilhões de dólares
  • 2024: O PIB chinês é estimado em cerca de 17 trilhões de dólares, tornando-se a segunda maior economia do mundo

PIB per capita

  • 1949: O PIB per capita era muito baixo, estimado em cerca de 50 dólares por pessoa
  • 2024: O PIB per capita atingiu aproximadamente 12 mil dólares, refletindo um aumento significativo no padrão de vida da população.

População

  • 1949: A China tinha cerca de 540 milhões de habitantes.
  • 2024: A população é estimada em aproximadamente 1,41 bilhão de pessoas.

Taxa de alfabetização

  • 1949: A taxa de alfabetização era inferior a 20% da população.
  • 2024: A taxa de alfabetização subiu para mais de 96%, com vastos investimentos em educação ao longo das décadas.

Expectativa de vida

  • 1949: A expectativa de vida média era de 35 anos a 40 anos.
  • 2024: A expectativa de vida subiu para cerca de 78 anos, refletindo melhorias na saúde pública e bem-estar.

Taxa de pobreza

  • 1949: A pobreza extrema era predominante, com a maior parte da população vivendo abaixo da linha da pobreza.
  • 2024: A pobreza extrema foi praticamente erradicada, com menos de 1% da população vivendo nessa condição após décadas de políticas de redução da pobreza.

Setor agrícola vs. industrial

  • 1949: O setor agrícola era a base da economia, representando mais de 50% do PIB e empregando a maioria da população.
  • 2024: A agricultura representa apenas cerca de 7% do PIB, enquanto o setor industrial e de serviços dominam a economia.

Taxa de urbanização

  • 1949: Menos de 12% da população vivia em áreas urbanas.
  • 2024: Cerca de 65% da população vive em áreas urbanas, como resultado de rápidas migrações internas e desenvolvimento de cidades.

Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)

  • 1949: O conceito de IDH não existia na época, mas as condições de vida indicariam um baixo nível de desenvolvimento humano.
  • 2024: O IDH da China é de 0,768, colocando o país na categoria de desenvolvimento humano elevado.

Infraestrutura

  • 1949: A infraestrutura do país era subdesenvolvida, com poucas estradas pavimentadas e uma rede de ferrovias limitada.
  •  2024: A China tem uma das maiores redes de infraestrutura do mundo, incluindo mais de 150 mil km de estradas de alta velocidade, além de sistemas ferroviários e aeroportos modernos.

Esse comparativo evidencia o gigantesco salto da China desde 1949 em termos de desenvolvimento econômico e social, transformando-se de uma nação predominantemente agrícola e empobrecida para uma das maiores economias e potências industriais do mundo.

Planos Quinquenais

Essas transformações profundas na vida do povo chinês com desenvolvimento econômico e social foram feitas por meio de uma série de planos quinquenais (Five-Year Plans - FYPs, da sigla em inglês) desde 1953. Estes planos traçam as diretrizes estratégicas para a economia, indústria, agricultura e tecnologia.

Primeiro Plano Quinquenal (1953-1957)

  • Industrialização pesada e recuperação econômica pós-guerra.
  • Foco na construção de indústrias básicas, como siderurgia e carvão, com apoio soviético.
  • Desenvolvimento da infraestrutura, incluindo ferrovias e barragens.
  • Avanços na produção industrial, mas a agricultura sofreu com menor investimento.

Segundo Plano Quinquenal (1958-1962)

  • "Grande Salto Adiante" (leia abaixo) para transformar rapidamente a China em uma potência industrial.
  • Esforço para coletivizar a agricultura e expandir rapidamente a produção industrial.
  • Fome generalizada e falhas na produção agrícola, com consequências econômicas graves

Terceiro Plano Quinquenal (1966-1970)

  • Recuperação dos problemas do "Grande Salto Adiante".
  • Investimentos na defesa nacional e construção de infraestrutura militar.
  • Desenvolvimento mais moderado, com foco no fortalecimento da indústria pesada.

Quarto Plano Quinquenal (1971-1975)

  • Reforço da infraestrutura e da agricultura.
  • Expansão da produção agrícola e foco em melhorar o padrão de vida.
  • Melhora parcial na agricultura, mas ainda sob pressão política interna (Revolução Cultural, leia abaixo).

Quinto Plano Quinquenal (1976-1980)

  • Reconstrução após a Revolução Cultural.
  • Modernização e recuperação econômica.
  • Início das reformas econômicas sob Deng Xiaoping, movendo o país em direção a uma economia de mercado.

Sexto Plano Quinquenal (1981-1985)

  • Reformas econômicas e abertura.
  • Foco em produtividade agrícola e introdução de elementos de mercado.
  • Crescimento econômico acelerado e aumento na produtividade.

Sétimo Plano Quinquenal (1986-1990)

  • Modernização industrial e tecnológica.
  • Abertura econômica e expansão das Zonas Econômicas Especiais.
  • Aumento dos investimentos estrangeiros e crescimento contínuo.

Oitavo Plano Quinquenal (1991-1995)

  • Crescimento estável e reforma das empresas estatais.
  • Reestruturação de setores-chave da economia e abertura ao comércio exterior.
  • Desenvolvimento econômico sustentável e avanço da reforma do setor público.

Nono Plano Quinquenal (1996-2000)

  • Continuidade nas reformas e manutenção do crescimento econômico.
  • Foco em inovação tecnológica e modernização das indústrias.
  • Adoção da economia de mercado e grandes avanços na infraestrutura.

Décimo Plano Quinquenal (2001-2005)

  • Desenvolvimento equilibrado e sustentável.
  • Preparação para a entrada na OMC e estímulo ao crescimento interno.
  • Integração ao comércio global, com crescimento robusto das exportações.

Décimo Primeiro Plano Quinquenal (2006-2010)

  • Reduzir disparidades regionais e promover a inovação.
  • Aumento dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento e melhorias ambientais.
  • Crescimento do setor tecnológico e maior ênfase em sustentabilidade.

Décimo Segundo Plano Quinquenal (2011-2015)

  • Transformar o padrão de crescimento econômico.
  • Foco em inovação, tecnologia verde e economia de baixo carbono.
  • Avanços nas energias renováveis e aumento da sustentabilidade.

Décimo Terceiro Plano Quinquenal (2016-2020)

  • Inovação e reequilíbrio econômico.
  • Foco em crescimento sustentável, urbanização e aumento do consumo interno.
  • Expansão tecnológica, fortalecimento do setor de serviços e maior urbanização.

Décimo Quarto Plano Quinquenal (2021-2025)

  • Modernização e independência tecnológica.
  • Aumentar a autossuficiência em tecnologia, como semicondutores, e fortalecer o crescimento verde.
  • Estratégias de crescimento autossuficiente e foco na neutralidade de carbono.

Esses planos quinquenais destacam a evolução da China de uma economia centralizada para uma potência global integrada ao comércio mundial, com avanços significativos em tecnologia, infraestrutura e sustentabilidade.

Lições do "Grande Salto Adiante"

O "Grande Salto Adiante" foi uma campanha de desenvolvimento econômico e social lançada em 1958 pelo Partido Comunista da China (PCCh), sob a liderança de Mao Zedong. O objetivo principal era transformar rapidamente a China de uma sociedade agrária em uma potência industrial através da coletivização da agricultura e da industrialização em larga escala.

O Grande Salto Adiante foi concebido como uma maneira de aumentar drasticamente a produção agrícola e industrial em um curto período, para superar o atraso econômico e alcançar o nível de desenvolvimento das potências ocidentais.

A proposta central envolvia a criação de comunas populares, onde agricultores deveriam trabalhar coletivamente, e o incentivo à produção em massa de aço em pequenas fundições caseiras, na tentativa de dobrar a produção do país em curto prazo.

No entanto, as autoridades chinesas reconhecem que a campanha foi mal planejada e levou a uma série de erros. A produção agrícola caiu drasticamente devido à falta de conhecimento técnico adequado, má gestão das políticas de produção e condições climáticas desfavoráveis. Esses fatores, somados à relutância das lideranças locais em relatar falhas, resultaram em uma grande fome que matou milhões de pessoas entre 1959 e 1961.

O "Grande Salto Adiante" é lembrado na história chinesa como uma tentativa ambiciosa, mas fracassada, de acelerar o desenvolvimento econômico. Hoje, o governo chinês reconhece que os métodos empregados eram excessivamente radicais e que erros foram cometidos.

Lições da Revolução Cultural

A Revolução Cultural (1966-1976), oficialmente chamada de "Grande Revolução Cultural Proletária", foi uma campanha política e social liderada por Mao Zedong com o objetivo de reafirmar o controle do PCCh e reavivar o espírito revolucionário socialista, eliminando influências burguesas e revisionistas dentro do partido e da sociedade.

Mao via o PCCh e o país caminhando em direção a um "revisionismo capitalista" e acreditava que era necessário renovar o fervor revolucionário e eliminar elementos que se desviavam da ideologia socialista. Ele incentivou o movimento das Guardas Vermelhas, compostas majoritariamente por jovens, para enfrentar figuras da burocracia estatal e educadores que promoviam ideias contrarrevolucionárias.

A Revolução Cultural foi inicialmente vista como uma maneira de engajar as massas, especialmente a juventude, em um esforço para manter vivo o espírito revolucionário. De fato, o movimento conseguiu limpar o PCCh e o governo de elementos burgueses e restaurar a pureza ideológica do socialismo. Apesar do caos inicial, a liderança de Mao foi reafirmada, e o PCCh manteve o controle após um período de instabilidade interna.

A economia chinesa foi gravemente afetada, com produção agrícola e industrial interrompidas. Escolas e universidades foram fechadas, e houve perseguição de professores, intelectuais e profissionais.

As autoridades chinesas posteriores à Revolução Cultural reconheceram os erros cometidos durante o movimento. Deng Xiaoping e outros líderes usaram o período como um exemplo de como o radicalismo pode desestabilizar uma sociedade e um partido.

A partir da década de 1980, a China adotou políticas de reforma e abertura, com o objetivo de garantir o crescimento econômico e a estabilidade social, aprendendo com os erros da Revolução Cultural para evitar futuras campanhas políticas desastrosas.

Hoje, a Revolução Cultural é oficialmente vista como um período de "grande turbulência", mas que faz parte da história da China.

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