Owen Gleiberman é o principal crítico de cinema da tradicional revista de filmes, moda e entretenimento Variety. Há dois dias ele publicou na revista sua opinião sobre "Ainda Estou Aqui" (I'm Still Here) e revelou uma estranha sensação que sentiu ao assistir o filme, que nunca havia lhe acontecido antes.
Ele começa o artigo elogiando o filme e sua história, que conta a procura de uma mulher (Eunice Paiva, interpretada por Fernanda Torres) por seu marido desaparecido (o deputado Rubens Paiva, interpretado por Selton Mello) durante a ditadura no Brasil.
"Tenho assistido a filmes sobre opressão política e cenários como este durante a maior parte da minha vida. Mas em todo esse tempo, posso dizer honestamente que raramente experimentei uma reação tão arrepiante quanto a que tive assistindo a "I'm Still Here". O filme em si, especialmente a primeira hora, é poderoso. Mas não foi isso; já vi muitos filmes políticos poderosos. O que parecia novo para mim — e intensamente inquietante — era absorver uma saga de repressão como esta e me perguntar se agora tinha potencial para acontecer na América. Senti como se fosse uma pergunta que nunca tive que me fazer antes" — escreveu Gleiberman.
"Mas estou falando de algo diferente: o espectro da ditadura. Em 249 anos, isso nunca definiu a América. E enquanto todos nós lutamos para entender a questão do que o segundo mandato de Trump significará, até onde ele irá, o quanto o estado de direito está ameaçado e quanta liberdade será perdida — a questão de se, de fato, isso pode acontecer aqui — está claro para mim agora mais do que nunca que os filmes têm nos ensinado sobre tudo isso por décadas."
Nos dois parágrafos finais do artigo, Owen Gleiberman revela o que o perturba no filme e o motivo pelo qual "Ainda Estou Aqui" está mobilizando o país:
"O fim da democracia é o que vimos em filmes ambientados na Europa, ou em países como a Argentina (como “The Official Story”, o “I'm Still Here” dos anos 80), ou a China de Mao. Em algum nível, confesso, sempre absorvi esses filmes sentindo como se estivesse assistindo ao que acontece com “eles”. As pessoas que vivem nos lugares onde o totalitarismo pode criar raízes. Acho que um dos maiores filmes do nosso tempo é “The Unbearable Lightness of Being”, de Philip Kaufman, porque é um drama de pessoas comuns apaixonadas presas em um pesadelo político. Sempre assisti a esse filme com uma sensação de dois gumes: que os personagens são como eu... mas como estão lidando com a repressão comunista de 1968 na Tchecoslováquia, eles também não são como eu. Porque é onde acontece. Lá .
"Quando vi “I'm Still Here”, pensei: Quão certo estou de que isso ainda é verdade? Quão assustador é pensar que lá, pela primeira vez, pode se tornar aqui?"
O medo do que o segundo governo de Donald Trump pode significar para o país, com os poderes que conquistou, com maioria de deputados, senadores e juízes da Suprema Corte e rodeado por um grupo de bilionários sem caráter nem escrúpulos como ele. Medo que o mundo divide com o crítico da Variety.
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