Um caso bárbaro que veio a público em 2020, na França, chega agora aos seus capítulos finais. É o julgamento de Dominique Pélicot, hoje com 71 anos, um aposentado que durante anos, pelo menos entre 2011 e 2020, drogava sua esposa para que ela ficasse inconsciente e então “recrutava” dezenas de homens para estuprá-la de forma grupal, filmando as violações.
As autoridades francesas conseguiram contar pelo menos 72 homens que teriam estuprado Gisèle Pélicot, mas 22 não puderam ser identificados. Os outros 50, assim como Dominique, se encontram neste momento no banco dos réus., num julgamento que entrou em seu quarto dia nesta sexta (6). Agora, a vítima, que chegou a ser contaminada com quatro ISTs por conta dos abusos, resolveu mostrar o rosto e tornar público o seu depoimento, o que trouxe um contorno ainda mais dramático para o acontecimento, fazendo com que o julgamento se tornasse central na cobertura jornalística da imprensa francesa.
“Assisti a todos os vídeos. Não são cenas de sexo, são cenas de estupro; dois, três deles sobre mim. Fui sacrificada no altar do vício. Quando vemos essa mulher, drogada, maltratada, morta na cama... Claro que o corpo não está frio, está quente, mas eu estou como se estivesse morta. Esses homens estão me contaminando, aproveitando-se de mim”, disse Gisèle.
Os repórteres que cobrem a sessão judicial questionaram a vítima sobre o que ela pensava do fato de 35 dos 50 acusados terem alegado inocência na frente de um juiz, enquanto os outros 15, além de seu marido, terem se declarado culpados.
“Que eles reconheçam os fatos, o contrário é insuportável. Que eles tenham, pelo menos uma vez na vida, a responsabilidade de reconhecer seus atos. Estes senhores permitiram-se entrar na minha casa, não me violaram com uma arma apontada à cabeça. Estupraram-me com toda a consciência. Por que não foram à delegacia? Até um telefonema anônimo poderia salvar minha vida”, respondeu a vítima.
Descoberta dos crimes por acaso em 2020
Há mais de quatro anos, Dominique Pélicot foi a um shopping center na França e começou a filmar mulheres por debaixo de suas saias. Notado e denunciado no estabelecimento, ele acabou detido pela polícia. Enquanto a ocorrência era lavrada em uma delegacia, os agentes conseguiram acesso ao celular usado pelo acusado para cometer o crime no shopping, e então encontraram centenas de arquivos, especialmente de vídeo, nos quais uma mulher desacordada aparecida sofrendo inúmeros estupros coletivos.
Questionado, o idoso revelou que aquela era sua esposa e contou como realizava tais atos desumanos. Ele a adormecia com fortes sedativos, contactava os homens em sites de relacionamento franceses, os chamando para ir até a residência do casal e estuprarem a mulher enquanto ele gravava. A prática era recorrente e cercada de cuidados por parte do autor, que proibia os homens de usar perfume ou de fumar horas antes dos crimes, para que Gisèle não sentisse cheiro nenhum diferente no ambiente quando acordasse. Eles também eram obrigados a se despir e deixar as roupas na cozinha, para que nenhuma vestimenta pudesse ser esquecida no quarto.
Durante mais de um ano a Polícia Nacional da França investigou os arquivos para identificar os estupradores envolvidos nos diversos episódios gravados, tendo sido possível chegar à identidade de 50 dos 72 homens que apareciam nas imagens. Alguns permaneceram presos desde suas localizações, enquanto outros ganharam o direito de responder ao processo em liberdade.
Julgamento mostrou que filha e noras também foram vítimas
Com o andamento do caso, veio a público a descoberta da Polícia Nacional de que a filha de Dominique, hoje com 48 anos, foi fotografada inúmeras vezes nua, sem seu consentimento. As noras do estuprador também foram registradas sem roupa no banho, uma delas no período que estava grávida, em 2011.
Veja o momento em que Gisèle Pélicot chega à corte para o julgamento: