O Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia, nesta segunda-feira (5), contra uma brasileira residente em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, acusada de recrutar pessoas para trabalhos forçados em uma organização criminosa transnacional especializada em fraudes cibernéticas. A acusada, segundo o MPF, atraía as vítimas com promessas falsas de emprego na Tailândia, na Ásia, de onde eram encaminhadas ilegalmente para Mianmar, local das operações da quadrilha.
Essa denúncia é a segunda apresentada pelo MPF contra membros desse esquema. Outro brasileiro já enfrenta acusações de tráfico de pessoas e participação em organização criminosa pelo recrutamento de compatriotas. Em junho de 2022, ele foi uma das vítimas aliciadas pela mulher agora denunciada, mas, ao perceber a oportunidade de lucro no agenciamento de mão de obra, passou a colaborar com ela na captação de novos trabalhadores. Trocas de mensagens entre os dois mostram a coordenação para enviar mais brasileiros à Ásia.
"Majoritariamente composta por chineses, a organização criminosa dedicava-se a fraudes eletrônicas contra estadunidenses. Brasileiros e pessoas de outras nacionalidades levados a trabalhar na rede criminosa ficavam encarregados do diálogo inicial com as vítimas dos golpes, estabelecendo contato por mensagem para obter dados pessoais e convencê-las a efetuar investimentos em ativos digitais. Bem sucedida essa primeira etapa, outros trabalhadores forçados cuidavam dos encaminhamentos até que os alvos do esquema fizessem aportes financeiros em uma plataforma falsa de criptomoedas", diz o MPF.
Os trabalhadores eram recebidos em Bangkok, Tailândia, e posteriormente levados para Mianmar, muitas vezes sem conhecimento prévio do destino final. A viagem por terra envolvia trocas frequentes de veículos e motoristas, além do cruzamento ilegal da fronteira entre os países.
Trabalho forçado, tortura e até mortes
O MPF relata que, em Mianmar, os trabalhadores eram submetidos a condições degradantes e constantes ameaças. Alojados na própria base operacional da quadrilha, um complexo com alta segurança, as vítimas tinham poucas chances de fuga.
"Aqueles que tentassem escapar ou denunciar o esquema eram levados a um setor onde ficavam presos, eram torturados ou até mesmo mortos", detalha o Ministério Público.
As jornadas de trabalho chegavam a 14 horas, durante a noite e quase sem intervalos. As vítimas tinham metas obrigatórias a cumprir, e o não cumprimento resultava em multas que reduziam seus salários. Além disso, sanções arbitrárias e a obrigatoriedade de comprar produtos de higiene e alimentação superfaturados frequentemente deixavam os trabalhadores sem pagamento ou endividados, aumentando o controle dos criminosos sobre eles.
Brasileiros vítimas da organização tiveram seus celulares confiscados após tentarem contato com a representação diplomática brasileira. O resgate dos trabalhadores só foi possível após a intervenção do governo brasileiro e as investigações subsequentes.
*Com informações da Procuradoria da República em São Paulo