De LISBOA | A França explodiu num rompante de civilidade neste domingo, 7 de julho de 2024. Às portas de serem governados pela extrema direita, que crescia como nunca antes visto e vitoriosa no primeiro turno das eleições legislativas, foi a esquerda quem peitou e botou abaixo as pretensões neofascistas de Marine Le Pen, Jordan Bardella e seus violentos correligionários do Rassemblement National (RN). O sonho da horda extremista virou o pesadelo do terceiro lugar, numa disputa que deu uma vitória retumbante à Nouvelle Front Populaire (NFP), que aglutinou importantes partidos como o La France Insoumise, o Parti Socialiste, os Les Écologistes e o Parti Communiste Français, em que pese o fato de não terem conseguido a maioria absoluta de 289 cadeiras para formarem um governo automaticamente.
Não foi como na Marseillaise, em que os franceses foram instados a pegar em armas “contra a tirania”, mas o chamado foi parecido: “Aux urnes, citoyens!”. E foi justamente lá, nas urnas, que os cidadãos compareceram e deram 182 assentos para a NFP, além de 168 para o Ensemble, o partido governista de centro de Macron. O RN, para quem a vitória era favas contadas, veio só lá atrás, na terceira posição, elegendo 143 parlamentares. Os números são oficiais e emitidos pelo Ministério do Interior, conforme reporta o jornal Le Monde, cuja última atualização aponta para 1h48 do horário local (20h48 em Brasília). Para seguirmos no belo hino nacional francês, foi a materialização do verso “Le jour de gloire est arrivé!”.
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Choroso e bem diferente do rapazote arrogante de uma semana atrás, Jordan Bardella se pronunciou aos jornalistas e jogou a culpa pela derrota no presidente francês e no primeiro-ministro do país, demonizando ainda a esquerda democrática ao fazer uso do mofado espantalho que a extrema direita opera tão bem em seus discursos políticos que almejam uma dissonância cognitiva generalizada.
“Infelizmente, a aliança da desonra e os arranjos eleitorais perigosos negociados por Emmanuel Macron e Gabriel Attal com as formações de extrema-esquerda impedem os franceses de uma política de recuperação nacional”, resmungou o menino que pensou há poucos dias que governaria uma das nações mais ricas e poderosas do planeta.
Macron, que não viu as coisas saírem como ele imaginava ao dissolver a Assembleia Nacional após o susto do resultado das eleições europeias, há um mês, no entanto, respirou mais aliviado com a derrota da extrema direita, mas por ora rejeitou as aspirações da coalização de esquerda liderada por Jean-Luc Mélenchon, sob o argumento de que “os franceses devem ter cautela” e que “o bloco de centro [seu partido] está vivo e com boa saúde”.
A resposta veio após o próprio Mélenchon se pronunciar de forma inflamada e exigir do presidente da República a convocação da NFP para governar a nação. “As lições do voto não deixam dúvidas: a derrota do presidente da República e da sua coligação está claramente confirmada. O presidente deve admitir esta derrota sem a contornar, seja de que maneira for. O primeiro-ministro deve ir embora. O presidente tem o dever de chamar a Nouvelle Front Populaire a governar”, cobrou Mélenchon, inclusive jogando na cara de Macron e da opinião pública que seu grupo “alcançou um resultado que se dizia impossível”.
Olivier Faure, o líder do Parti Socialiste, foi na mesma direção de Mélenchon e se manifestou pela chamada imediata da coalização de esquerda para entrar no governo. “Esta noite, a França disse não à chegada do Rassemblement National ao poder. A Nouvelle Front Populaire deve assumir o comando desta nova página da nossa história”, falou aos jornalistas e companheiros da legenda.