A ex-deputada Maria Corina Machado denunciou que não conseguiu acesso à plataforma digital do Conselho Nacional Eleitoral para registrar a candidatura da professora e filósofa Corina Yoris nas eleições da Venezuela, marcadas para 28 de julho.
No X, acusou o governo de Nicolás Maduro de manipular a Justiça eleitoral, com o intuito de escolher adversários.
Em função disso, o Itamaraty chegou a emitir uma nota:
Esgotado o prazo de registro de candidaturas para as eleições presidenciais venezuelanas, na noite de ontem, 25/3, o governo brasileiro acompanha com expectativa e preocupação o desenrolar do processo eleitoral naquele país. Com base nas informações disponíveis, observa que a candidata indicada pela Plataforma Unitaria, força política de oposição, e sobre a qual não pairavam decisões judiciais, foi impedida de registrar-se, o que não é compatível com os acordos de Barbados. O impedimento não foi, até o momento, objeto de qualquer explicação oficial.
A nota brasileira deixou de considerar que, ao fim e ao cabo, a Plataforma Unitária registrou um candidato, que pode ser substituído até dez dias antes das eleições.
O CNE, que é o poder eleitoral independente da Venezuela, não se manifestou oficialmente, contribuindo para a desconfiança.
12 CANDIDATOS DE OPOSIÇÃO
De acordo com a explicação do oficialismo, Maria Corina Machado não cumpriu a legislação eleitoral venezuelana, razão pela qual não conseguiu fazer o registro daquela que apontou como sucessora.
Pelo artigo 47 da Lei Orgânica de Processos Eleitorais, podem se inscrever "organizações com fins políticos, grupos de eleitores e eleitoras, cidadãos e cidadãs por iniciativa própria e as comunidades ou organizações indígenas".
De acordo com a explicação oficialista, Maria Corina Machado, que dirige o Vamos Venezuela, não dispunha de certificado digital válido para inscrever sua candidata como ligada ao partido, ou seja, por "organização com fim político" -- mesmo assim, teria feito um 'show' para as redes sociais.
Ainda de acordo com o oficialismo, ela poderia ter optado por inscrever Corina Yoris pelo artigo 53, de "postulação por iniciativa própria", desde que apresentasse assinaturas de eleitores equivalentes a 5% do eleitorado -- o que não fez.
A fonte oficialista -- que deu a versão do governo através de um áudio que circulou nas redes sociais -- argumenta que dois partidos que dispunham de certificados válidos fizeram suas inscrições normalmente: pelo partido Um Novo Tempo, com apoio da Força Vicinal, inscreveu-se o governador Manuel Rosales, do estado de Zulia; pela PUD, do qual faz parte Maria Corina Machado, inscreveu-se o diplomata Edmundo Urrutia.
No X, o PUD explicou:
Decidimos registrar provisoriamente o presidente do Conselho de Administração do Partido da Unidade Democrática, o cidadão Edmundo González Urrutia, para preservar o exercício dos direitos políticos que correspondem à nossa organização política até conseguirmos registrar nossa candidatura unitária.
Fake news disseminadas por aliados de Maduro ajudaram a turvar o episódio: uma deputada bolivariana chegou a dizer que Corina Yoris tinha dupla cidadania, uruguaia e venezuelana, o que a impediria de concorrer -- o que é falso.
Depois de se inscrever como candidato, Maduro denunciou que dois homens armados foram presos a 20 metros de distância dele e sugeriu que eram ligados ao Vamos Venezuela.
O presidente disse que se tratava de um partido "terrorista".
Sob investigação, um grupo de assessores de Maria Corina buscou refúgio na embaixada da Argentina em Caracas.
IMPEDIMENTO DE MARIA CORINA
Maria Corina Machado foi impedida de concorrer às eleições deste ano por decisão do Tribunal Superior de Justiça da Venezuela.
Trecho da sentença afirmou:
A cidadã María Corina Machado Parisca está inabilitada para exercer funções públicas por um período de quinze (15) anos, de acordo com a Resolução número 01-00-000285, de data 16 de setembro de 2021, emanada pela Controladoria Geral da República, em investigação iniciada em maio de 2014 e onde foram tomadas medidas cautelares.
No processo, ela foi acusada de infringir a Constituição ao acumular o mandato de deputada com o de "representante alternativa da delegação da República do Panamá na Organização dos Estados Americanos (OEA) a partir de 20 de março de 2014, perdendo assim a investidura de deputada da Assembleia Nacional".
Nesta condição, Corina articulou apoio internacional ao autoproclamado presidente Juan Guaidó, inclusive sanções econômicas internacionais contra a Venezuela.
Na sentença ela é acusada de responsabilidade pelo congelamento das reservas de ouro da Venezuela no Reino Unido, pelo bloqueio de U$ 4 bilhões de contas do país no Exterior e pela entrega da subsidiária da petrolífera PDVSA, a Citgo, avaliada em U$ 34 bilhões, à empresa canadense Crystallex, por apenas U$ 1,5 bilhão.
Maria Corina Machado recebeu solidariedade de vários parlamentares bolsonaristas nas últimas horas, inclusive de Carla Zambelli e do autoproclamado padre Kelmon, que hoje dirige o Foro do Brasil, organização que se opõe ao Foro de São Paulo.
Apoiadores de Maduro dizem que ela tomou sozinha a decisão de indicar Corina Yoris, o que teria estremecido relações na aliança oposicionista.
Pelo menos um fato indica nesta direção: depois que Manuel Rosales, o governador de Zulia, conseguiu sua inscrição, Maria Corina disse que não cogita apoiá-lo como candidato de unidade.
Mesmo não concorrendo, Maria Corina Machado tem grande potencial de transferir votos e tumultuar o processo eleitoral com denúncias de alcance internacional, uma vez que atua muito próxima de Washington e tem grande acesso às corporações da mídia.