DEBATE

Israel comete genocídio e Lula tem direito de denunciá-lo. Entenda o porquê

Fala de Lula cria pressão política e é única no campo internacional

Lula e os cidadãos brasileiros repatriados de GazaCréditos: Ricardo Stuckert/PR
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29 mil mortos. 12 mil crianças assassinadas. 8 mil mulheres sem vida. 68 mil feridos. 7 mil desaparecidos. 360 mil casas destruídas ou danificadas. 392 escolas destruídas. 123 ambulâncias atacadas. 267 locais de adoração religiosa destruídos. Quase 2 milhões de deslocados internamente.

Estes são os números da ação militar de Israel em Gaza, consideravelmente mais assustadores do que a fala do presidente Lula no domingo (18) durante a Cúpula da União Africana em Adis Abbeba, na Etiópia.

Lula disse: “O que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu. Quando Hitler resolveu matar os judeus”.

Foi duramente criticado por Israel, que se assanhou e decidiu convocar o embaixador brasileiro em Tel Aviv. O que Israel teme, é justamente, que uma liderança mundial do tamanho de Lula denuncie os seus crimes.

"Nenhuma liderança no patamar dele, como um presidente do Brasil, se posicionou dessa forma", explica o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e especialista em Oriente Médio Renatho Costa, à Fórum.

"Lula quis chamar a atenção e fez essa frase que acabou tendo essa repercussão", completa Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da PUC-SP.

É genocídio?

Os dois especialistas ouvidos pela Fórum concordam que o que ocorre em Gaza é um genocídio. Já a comparação específica com o que ocorreu durante o Holocausto é ponto de debate.

"Em termos de modelo, de forma como que acontece, de fenômeno, se nós formos tratar o crime como um conceito de genocídio, de fato, ele é muito semelhante", afirma Costa.

"Segundo o artigo 2 da Convenção Internacional sobre genocídio, reconhecida pelo Brasil, por Israel e por boa parte dos países do mundo, 'entende-se por genocídio qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção de destruir no todo ou em parte um grupo nacional, étnico, racial ou religioso' por aí vai. Nesse sentido, você pode comparar. Preceito jurídico reconhecido internacionalmente", diz Nasser.  Para ele, o genocídio de Gaza se assemelha mais a genocídios coloniais - como o realizado contra os indígenas nos EUA - do que com o Holocausto. "Eu, particularmente, não faço essa comparação. Não faço por ser processos políticos e históricos diferentes."

Já para Costa, é possível traçar paralelos. "Na época da Segunda Guerra Mundial, você tinha um grupo, um chefe de Estado que estabeleceu que determinado grupo tinha que ser exterminado e isso foi colocado em prática por meio de campos de extermínio. E isso agora também vem acontecendo da mesma forma. Um determinado governante, no caso o primeiro-ministro Netanyahu e toda a sua cúpula, decidiu que tem que exterminar um povo", compara.

Além das denúncias na Corte Internacional de Justiça, Israel já começa a acumular acusações em Haia, também sendo denunciado por violações contra os direitos humanos pela Human Rights Watch, Anistia Internacional, Crescente Vermelho e pela própria ONU.

"A fala do presidente Lula também tem um componente político. Ele não está tratando a questão acadêmica", afirma Nasser. "Ela é uma fala realista. Não é a fala de um militante engajado na causa palestina. É a fala de um analista político, de uma pessoa que entende o que está acontecendo em Gaza como quase todos no mundo entendem, só que devido à estrutura de poder dentro do sistema internacional, a grande maioria se cala", completa Costa.