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Brasileira é inocentada em El Salvador após um ano de prisão domiciliar – Por Marco Piva

Vanda Pignato, a petista que se tornou primeira-dama do país, era acusada de lavagem de dinheiro público

Vanda Pignato.Créditos: Divulgação
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A alegria tomou conta da brasileira Vanda Pignato na sala do Primeiro Tribunal de Sentença de San Salvador, a capital salvadorenha, assim que o juiz José Salvador Sánchez Membreño a inocentou da acusação de lavagem de dinheiro no caso conhecido como “Saqueo Público”. A mesma sorte não tiveram outros seis acusados que receberam penas entre 8 e 13 anos de prisão. Todos os réus pertenceram ao primeiro escalão do gabinete do ex-presidente Maurício Funes (2009-2014) e foram acusados de desviar um total de 351 milhões de dólares dos recursos públicos.

A situação de Vanda Pignato se arrastava há doze meses. Apesar da decisão do juiz estar pronta desde 30 de novembro de 2023, manobras da promotoria adiaram por oito vezes o anúncio da sentença, prorrogando o sofrimento emocional dessa brasileira que se naturalizou salvadorenha.

Apesar de ser absolvida pelo crime de lavagem de dinheiro e ativos, cuja pena solicitada pela promotoria era de 19 anos, Vanda foi condenada a três anos de prisão sob acusação de ter comprado um veículo que ela nunca possuiu. Até hoje ela não tem automóvel próprio. No caso dessa condenação, sua pena foi convertida em prestação de trabalho público pelo mesmo período. Seu advogado vai recorrer da sentença.

História incomum

Militante do Partido dos Trabalhadores no Brasil, Vanda participou dos movimentos de solidariedade à América Central na década de 1980. Logo após a vitória dos sandinistas na Nicarágua, em 19 de julho de 1979, os grupos revolucionários de El Salvador e da Guatemala ganharam fôlego e apoio político. Foi nesse contexto que ela se aproximou da Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional (FMLN) e acabou tomando a decisão de se mudar para El Salvador.

Naquele país, Vanda se casou com o jornalista Maurício Funes, um quadro da FMLN que concorreu e venceu a eleição presidencial em 2009. Assim, ela se tornou a primeira-dama do país. Por sua origem brasileira, enfrentou inicialmente alguns obstáculos para desenvolver um trabalho de conscientização das mulheres que sofriam violência doméstica. No entanto, sua capacidade de organização e resistência para enfrentar uma sociedade extremamente machista trouxeram resultado e seu nome passou, inclusive, a ser cogitado para uma carreira política.

Mas, nem tudo correu como se esperava num país marcado por um histórico de violação dos direitos humanos, particularmente contra os setores da população mais vulneráveis como as mulheres, os camponeses e os indígenas. A extrema direita sempre foi muito forte no país, controlando o empresariado, a imprensa e as forças militares, que promoveram inúmeros massacres no campo.

O mandato de Maurício Funes terminou bem avaliado, mas, por motivações políticas, um promotor lançou uma série de acusações de corrupção contra o seu gabinete, o que acabou atingindo Vanda Pignato. Enquanto Funes se refugiou na Nicarágua para evitar a prisão, ela ficou em El Salvador e enfrentou todo o processo judicial ao mesmo tempo que fazia tratamento contra um câncer.

Não é à toa que, ao final da histórica sessão de 8 de novembro, ela desabafou: “Estou muito feliz porque foi uma longa jornada de quase oito anos que a minha vida ficou interrompida. Hoje, ficou claro que não houve delito e agora posso regressar a minha vida normal”.

*Marco Piva é jornalista e apresentador do programa Brasil Latino na Rádio USP. Dirige os canais de YouTube O Planeta Azul e China Global News. Foi correspondente da Rádio Eldorado e da Rádio França Internacional na América Central.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.