Recep Tayyip Erdogan, do Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), de direita, foi reeleito como presidente da Turquia em um segundo turno acirrado no último domingo (28). De acordo com dados oficiais, Erdogan obteve 52,14% dos votos, derrotando seu adversário, Kemal Kilicdaroglu, do Partido Republicano do Povo (CHP), de centro-esquerda, que recebeu 47,86% dos votos.
Erdogan governa o país desde 2002, inicialmente como primeiro-ministro (2003-2014) e depois como presidente (desde agosto de 2014). Sua reeleição em 2023 consolida sua liderança que já dura 20 anos, superando a presidência de 15 anos de Mustafa Kemal Ataturk, fundador da República da Turquia depois da 1ª Guerra Mundial e a dissolução do Império Otomano.
Aos 40 anos, Erdogan despontou como um político promissor quando foi eleito prefeito de Istambul em 1994. Em 2001, fundou o AKP e iniciou uma nova era para a Turquia. No entanto, o governo de Erdogan é marcado por questões complexas e controversas na economia, política interna e externa, devido à sua prolongada permanência no poder.
Do ponto de vista econômico, Erdogan é creditado em grande parte pelo crescimento do PIB do país e pelo aumento da renda média da população entre 1993 e 2010, que teria levado até 40% da população a alcançar o status de "classe média" de acordo com o Banco Mundial.
No entanto, ele também é responsabilizado pelo declínio do chamado "milagre econômico" em 2013, com recessão, estagnação, alta inflação, desvalorização da moeda, alto desemprego, informalidade e o empobrecimento da população em um dos países mais desiguais do mundo. O índice GINI de desigualdade da Turquia é o quarto mais alto entre os países da OCDE, de acordo com dados de 2021 do TURKSTAT.
Além das questões econômicas, a Turquia enfrenta diariamente problemas políticos internos e externos, como conflitos com/entre vizinhos, conflitos étnicos e religiosos, terrorismo e debates sobre o tipo de Estado e regime desejados, se secular/laico ou religioso, democrático ou autoritário, bem como sobre suas alianças internacionais controversas (OTAN, UE, Rússia, Árabes).
O legado de Erdogan é destacado por sua liderança carismática e pontos polêmicos. Para setores conservadores, em especial os religiosos, ele é visto como alguém que respeita as tradições e a família turca, questionando as estruturas laicas/seculares estabelecidas por Ataturk e os direitos de grupos LGBTQIA + ou identitários favoráveis às minorias. Por outro lado, seus opositores veem Erdogan como uma ameaça à democracia, à diversidade do povo, à independência dos poderes, à corrupção e aos direitos humanos em vários aspectos. O Estado turco é classificado como um "Regime Híbrido" cheio de aspectos autoritários na classificação do Índice Democrático da revista The Economist.
Nos últimos anos, a Turquia se envolveu em conflitos armados devido à guerra civil na Síria e os conflitos com a população curda separatista. Além disso, houve uma tentativa controversa de golpe de Estado em 2016 contra Erdogan, promovida por setores dissidentes do exército e um referendo constitucional em 2017 promovido pelo presidente(tido como um autogolpe de Estado por muitos) que mudou a constituição, ampliou os poderes e medidas autoritárias do agora presidente sobre seus opositores.
Erdogan, que poderá permanecer no cargo até 2029, já indicou e indicará ministros para a Suprema Corte e expressou a intenção de reintroduzir a pena de morte no país em 2017, o que desagradou os europeus e causou um recuo às perspectivas de adesão da Turquia à União Europeia.
Observadores internacionais e a oposição têm criticado o ambiente em que as eleições ocorreram, alegando repressão, abuso do aparato governamental, uso intenso de grupos de mídia e redes sociais, além de fraudes em várias sessões eleitorais.
Kemal Kilicdaroglu, candidato derrotado e líder de centro-esquerda do Partido Republicano do Povo (CHP), afirmou que "a luta continua" e que o resultado foi o mais injusto dos últimos anos, deixando o país profundamente dividido. É relevante dizer ainda que Erdogan foi derrotado nas principais cidades do país, incluindo Istambul, Ankara, Antalya, Izmir e Diyarbakir. Por sua vez, Erdogan, em seu discurso de vitória, apesar de apelar à unidade nacional, acusou seu rival de apoiar políticas relacionadas à minoria curda e à comunidade LGBTQIA + (contrárias à família turca e a integridade da nação).
A reeleição de Recep Tayyip Erdogan como presidente da Turquia consolida sua liderança de duas décadas, superando o tempo de Mustafa Kemal Ataturk. No entanto, o sucesso de seu legado não é garantido. A “estabilidade” da polarização prolongada reforça as incertezas como uma “panela de pressão”, mostrando as feridas abertas de um povo dividido.