DIREITO AO REPARO

Ele ensina a consertar iPhone na internet e está sendo ameaçado de processo pela Apple

Caso reaviva debate que opõe o ‘direito ao reparo’ à prática da obsolescência programada; Empresa ofereceu credenciamento de assistência técnica autorizada mas empresário não aceitou

Wilmer Becerra faz consertos de eletrônicos e ensina usuários de Iphone a repararem seus aparelhos na internet.Créditos: Reprodução/Wiltech
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Wilmer Becerra é um engenheiro colombiano que trabalha no conserto de eletrônicos faz muitos anos. Em 2018 ampliou o negócio para as redes sociais, oferecendo vídeos com tutoriais para reparos em iPhones, iPads e iMacs. Ao longo de cinco anos acumulou mais de 5,2 milhões de seguidores no Tik Tok, 6,5 milhões no Facebook e 251 mil no Instagram, além de ter aberto uma rede internacional de assistência técnica de eletrônicos, a Wiltech, que está presente em 9 países.

Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guatemala, México, Peru e Panamá são os países que contam com a presença da Wiltech. Segundo Becerra, a empresa ainda não veio ao Brasil por questão de idioma.

Mas a história do engenheiro, que poderia ser um exemplo de sucesso do empreendedorismo, aparentemente não ganhou a simpatia de uma das maiores empresas do Vale do Silício. No último mês de julho, Wilmer Becerra foi notificado extrajudicialmente pela Apple, que pede que ele não exiba mais o logo da empresa, a famosa maçã mordida, em seus vídeos de grande audiência.

É claro que o problema não é a exposição da marca, como o próprio engenheiro aponta em vídeo publicado nas suas redes.

“Me questionaram sobre as peças que uso para fazer os consertos de iPhones. Busco elas em lojas autorizadas nos Estados Unidos porque lá o presidente Joe Biden sancionou o direito ao reparo e as grandes empresas como a Apple têm de entregar manual dos aparelhos e fabricar peças sobressalentes”, declarou.

Em sua defesa, entregue em agosto, Becerra invoca exatamente o direito ao reparo, norma jurídica presente em alguns países, que busca equilibrar os direitos de propriedade e de livre concorrência à preservação ambiental. A ideia é que haja um mercado de reparos de eletrônicos semelhante ao presente na indústria automotiva.

Na União Europeia, por exemplo, fabricantes de celulares e computadores devem produzir peças de reposição por pelo menos dez anos. A medida é ecologicamente correta ao proporcionar o prolongamento da vida útil dos aparelhos, que poluem desde a extração da matéria-prima para sua produção e ao longo da vida útil. O problema é que vai de encontro aos interesses das grandes empresas que preferem trabalhar com a lógica da obsolescência programada, que obriga os consumidores a gastarem mais com a compra de novos aparelhos após o breve tempo de vida útil do produto acabar.

A ameaça de processo pela Apple, absurda por si mesma, e aliada ao debate em torno da obsolescência programada e a mitigação de impactos ambientais, atraiu a imprensa internacional. Após repercutir em meios da Colômbia, Peru, Argentina e Espanha, a Apple se pronunciou publicamente, afirmando que não processaria o colombiano uma vez que seu logo não apareça nos vídeos. Também convidou a empresa do engenheiro a atuar como uma assistência técnica autorizada.

Entrevistado pela Folha, Wilmer Becerra disse que não pretende aceitar a proposta. Ele aponta que seu público não é o mesmo que busca as assistências técnicas autorizadas. Além disso, é um defensor do direito ao reparo e as condições para atuar como um autorizado vão de encontro a esse ideal.

Ele explica que se estiver atuando como autorizado, não seria permitido reparar peças danificadas de aparelhos da Apple, mas substituí-las, o que encareceria e engessaria seu trabalho. A maioria dos seus clientes, pontua, ou já estão sem garantia de fábrica ou não resolveram seus problemas nas assistências técnicas oficiais.