O Comitê das Organizações das Nações Unidas (ONU) sobre Desaparecimentos Forçados avaliou pela primeira vez, na semana passada, o caso do Brasil. Entre as recomendações, o órgão sugere o fim da Lei da Anistia para permitir que casos da ditadura militar (1964-1985) sejam investigados e punidos.
Durante a sessão, membros do organismo ficaram chocados com a atitude que chegou a ser qualificada de "arrogante" por parte de certos membros da delegação brasileira, de acordo com informações da coluna de Jamil Chade.
As conclusões e recomendações da entidade deixam claro que o Brasil não cumpre o direito internacional. Ao longo do texto divulgado nesta quarta-feira (29), o Comitê repete de forma insistente que "lamenta" a postura adotada pelo governo, cobra mudanças profundas e critica a reação das autoridades em Brasília.
O Comitê alerta que "também está preocupado com alegações de que o progresso na investigação de casos de desaparecimentos forçados é limitado, contribuindo assim para a impunidade de tais crimes", alerta. Além disso, também indica que está "preocupado com as informações recebidas sobre desaparecimentos forçados alegadamente perpetrados em tempos recentes, principalmente contra pessoas de ascendência africana e pessoas que vivem em favelas ou nas periferias das grandes cidades".
Uma das principais conclusões, no entanto, ainda se refere à incapacidade de o governo de lidar com os crimes do passado.
"O Comitê também está preocupado com as denúncias de desaparecimentos forçados que alegadamente começaram antes da entrada em vigor da Convenção para o Estado parte em dezembro de 2010, em particular entre 1964 e 1985, e que estão em andamento uma vez que as pessoas desaparecidas não foram localizadas", apontou.
"Com relação aos desaparecimentos forçados alegadamente perpetrados de 1964 a 1985, o Comitê saúda a criação da Comissão Nacional da Verdade e da Comissão Especial sobre Mortes e Desaparecimentos Políticos e seu importante trabalho. Entretanto, está preocupado com os relatórios relativos à falta de responsabilização por tais desaparecimentos forçados, principalmente devido à aplicação da Lei de Anistia nº 6.683/79, e lamenta não receber informações suficientes sobre os progressos alcançados até o momento na busca e, em caso de morte, identificação das pessoas desaparecidas durante aquele período", diz.
Entre as recomendações, o Comitê pede que o Brasil "adote as medidas necessárias para garantir os direitos à justiça, à verdade e à reparação de todas as vítimas de desaparecimentos forçados, independentemente de quando o desaparecimento tenha começado".
Eis as principais recomendações ao Brasil:
(a) Garanta que todos os casos de desaparecimento forçado sejam investigados prontamente, de forma completa e imparcial, mesmo que não tenha havido uma queixa criminal formal; e que os supostos infratores sejam processados e, se considerados culpados, punidos de acordo com a gravidade de seus atos;
(b) remover quaisquer impedimentos legais às investigações sobre os desaparecimentos forçados perpetrados durante o regime militar que ainda não cessaram, em particular no que diz respeito à aplicação da Lei de Anistia;
(c) Redobrar seus esforços para combater a discriminação contra certos grupos vulneráveis visados como um meio de evitar seu desaparecimento e assegurar o pleno acesso a seu direito à justiça;
(d) Incentivar e facilitar a documentação e apresentação de queixas pelos atores da sociedade civil, assim como a participação de parentes nas investigações; e assegurar que os parentes sejam regularmente informados sobre o progresso e os resultados das investigações;
(e) Acelerar seus esforços para localizar e, em caso de morte, identificar todas as pessoas sujeitas a desaparecimento forçado cujos destinos ainda não tenham sido esclarecidos.
A este respeito, o Comitê encoraja o Estado parte a assegurar que os esforços que empreende na busca de pessoas desaparecidas, incluindo a Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas, estejam alinhados com seus princípios orientadores para a busca de pessoas desaparecidas;
(f) Assegurar a coordenação e cooperação efetiva entre todos os órgãos envolvidos nas investigações e buscas; que eles tenham os recursos financeiros, técnicos e humanos necessários para desempenhar suas funções de forma rápida e eficaz; e que tenham efetivo e oportuno para qualquer lugar de detenção ou qualquer outro lugar onde haja motivos razoáveis para acreditar que a pessoa desaparecida possa estar presente, bem como para toda a documentação e outras informações relevantes que possam estar na posse de agências do Estado, incluindo as forças armadas;
(g) Garantir que todas as vítimas recebam uma reparação adequada que seja sensível às suas necessidades específicas.
Com infrmações da coluna de Jamil Chade