O Exército de Myanmar (antiga Birmânia) declarou, nesta segunda-feira (1º), estado de emergência e assumiu o controle do país durante ano. O golpe ocorre após a prisão da chefe do governo, Aung San Suu Kyi. Os golpistas prometem organizar novas eleições no prazo de um ano.
Por meio de uma declaração feita na televisão e pelas redes sociais, os militares acusaram a comissão eleitoral do país de não ter investigado as "enormes irregularidades" que acusam ter existido nas eleições legislativas de novembro.
O partido da chefe de Estado, Aung San Suu Kyi, venceu o último pleito por ampla maioria. Insatisfeitos com os resultados e com a acusação de que houve corrupção no pleito, os militares invocaram poderes que lhes são atribuídos pela Constituição, redigida pelo Exército, que lhes permite assumir o controle do país em caso de emergência nacional.
O vice-presidente Myint Swe, nomeado para o cargo pelos militares, reserva prevista na Constituição, assumiu a presidência de Myanmar. O chefe das Forças Armadas, Ming Aung Hlaing, será responsável por fiscalizar as autoridades, indicou o canal de TV militar Myawaddy News.
O golpe de Estado realizado pelos militares já vinha sendo denunciado pelas lideranças da Liga Nacional para a Democracia (LND). Myo Nynt, porta-voz da LND, confirmou a prisão de Aung San Suu Kyi e, horas antes, alertou para o risco de golpe.
"Fomos informados que ela está detida em Naypyidaw (capital do país), supomos que o Exército está em via de organizar um golpe de Estado", disse Myo Nyunt.
As detenções seguidas do golpe Estado acontece no dia em que o parlamento eleito nas últimas eleições se preparava para dar início aos trabalhos.
A Comissão Eleitoral de Myanmar negou que tenha existido qualquer tipo de fraude eleitoral nas eleições de novembro. A LND conquistou 83% dos 476 assentos parlamentares, o que deixou os militares insatisfeitos.
Cabe lembrar que o país viveu uma ditadura militar entre 1962 e 2011, ou seja, faz dez anos que o país adotou o regime democrático.
Japão, França e Reino Unido condenam golpe no Myanmar
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson condenou o golpe de Estado e pediu a libertação das lideranças políticas do país. "Eu condeno o golpe de Estado na Birmânia e a prisão ilegal de civis, entre os quais Aung San Suu Kyi", escreveu Johnson no Twitter.
O porta-voz do governo da França, Gabriel Attal, apelou para que o voto dos birmaneses seja respeitado. "Realizaram-se eleições e Aung San Suu Kyi foi eleita. Nessas condições nós apelamos para que o resultado do voto dos birmaneses seja respeitado", declarou Attal.
O Japão também emitiu comunicado e afirmou que a democracia deve ser restabelecida no país "sem derramamento de sangue".
O presidente da União Europeia, por meio das redes sociais, afirmou que condena "firmemente o golpe de Estado na Birmânia e apelo aos militares no sentido da libertação de todos que estão ilegalmente detidos em todo o país. O resultado das eleições deve ser respeitado e o processo democrático deve ser restabelecido", afirmou o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel.
Prisão e Nobel da Paz
Aung San Suu Kyi ficou presa por 15 anos por se opor a ditadura e Myanmar, por conta disso, passou de uma figura nacional em Myanmar para se tornar uma figura internacional em defesa da democracia, o que a levou a ganhar o Prêmio Nobel da Paz.
Não é a primeira vez que Kyi obtém uma vitória esmagadora em Myanmar. Durante a eleição geral de 1990, a LND, partido que é liderado por Kyi, obteve 59% dos votos, porém, um dia antes de assumir a liderança do país, os militares deram um golpe de Estado e a colocaram sob prisão domiciliar, na qual ficou 15 anos.
Em 2015 liderou o seu partido em uma nova vitória, mas, como era casada com um estrangeiro, não podia concorrer à presidência, dessa maneira foi criado o cargo de Conselheiro de Estado.
Se por um lado Aung San Suu Kyi é considerada um ícone da luta pela paz, por outro pesam sobre ela acusações diante do massacre do Rohinga, minoria islâmica.
Todavia, mesmo com o fim da junta militar em 2015, a Constituição ainda deixou muitos poderes aos militares, inclusive uma limitação de poder do chefe de Estado sobre as Forças Armadas.
Apesar das acusações de nada fazer diante do massacre dos Rohinga, Kyi permanece muito popular no país, o que se comprovou nas últimas eleições, quando o seu partido conquistou mais de 80% das cadeiras do parlamento birmanês.