A nova polêmica política no Uruguai tem a ver com uma campanha discursiva do governo de Luis Lacalle Pou, o presidente que assumiu em março, trazendo a direita de volta ao poder no país depois de 15 anos. Assim como fez Jair Bolsonaro no Brasil, o novo mandatário do país cisplatino acusou os governos anteriores, e especialmente o do icônico Pepe Mujica (2010-2015), de manter relações internacionais baseadas em “afinidades ideológicas”.
A nova narrativa do governo de Lacalle Pou enfatiza os acordos realizados no período com países como Venezuela, Bolívia, Cuba e até mesmo o Brasil da época de Lula da Silva e Dilma Rousseff (nesse caso, e também seguindo o relato da direita brasileira, destacando que Lula seria “um corrupto condenado pela Justiça brasileira”).
Mujica não deixou essa acusação passar batida, e comentou durante uma edição do programa de rádio “Hablando al Sur”, da emissora M24, no qual costuma participar semanalmente. O ex-presidente uruguaio rebate a crítica com outra denúncia, a de que é o governo que atua de forma ideologizada. “Porque separa os governos de esquerda com quem reforçamos nossa relação, e omite vários países com governos de direita com os quais também fizemos o mesmo. Não me f…”, emendando com um palavrão.
Entre os “amigos de direita” recordados pelo ex-presidente, que foram contemporâneos do seu mandato, estão nomes como Barack Obama (Estados Unidos), Juan Manuel Santos (Colômbia), Mariano Rajoy (Espanha), Sebastián Piñera (Chile) e Enrique Peña Nieto (México).
“Eles inventaram uma história e começaram a repeti-la como mentecaptos, aproveitando que têm grandes meios de comunicação que ajudam a difundir isso, que tendem a cortar o bacalhau sempre para o mesmo lado. Eles martelam e martelam com a mesma ladainha, até que as pessoas acabam acreditando”, reclamou Mujica.
O ex-presidente e ex-guerrilheiro tupamaro também alegou que, apesar das críticas, a atual administração segue uma linha de política exterior que foi inaugurada no seu governo. “Fui o presidente que mais fez encontros internacionais com outros colegas, de direita e de esquerda, e agora eles fazem o mesmo, mas contam isso como se tivessem inventado a roda”, comentou.
Outro argumento usado pelo atual governo é o de que o Uruguai, durante os governos da Frente Ampla (além do mandato de Mujica, teve dois períodos com Tabaré Vázquez, entre 2005 e 2010, e entre 2015 e 2020) teria se aproximado “mais da China que dos Estados Unidos”. Segundo o ex-presidente, “nosso objetivo foi preservar o diálogo e o comércio bilateral com a mesma prioridade para os dois casos, e o atual governo, se tiver juízo, fará o mesmo”.