Armas nucleares: 70 anos de hipocrisia

História do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) revela: por jamais cumprirem cláusulas que preveem seu desarmamento, cinco grandes potências atômicas estimulam projetos como o da Coreia do Norte

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História do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) revela: por jamais cumprirem cláusulas que preveem seu desarmamento, cinco grandes potências atômicas estimulam projetos como o da Coreia do Norte Por Georges la Guelte, no Outras Palavras / Tradução de Wanda Caldeira Brant Quanto maior o número de países que dispõem de armas nucleares, maior o risco de que elas sejam deliberadamente utilizadas não para dissuadir, mas para aniquilar, ou que um conflito seja desencadeado por engano, ou que um país bombardeie preventivamente as instalações de seus adversários, ou ainda que armas ou matérias físseis caiam nas mãos de grupos criminosos. A proliferação nuclear é, portanto, um dos perigos mais graves para o futuro da humanidade. No entanto, não foi essa preocupação que inspirou as primeiras medidas tomadas para evitá-la. Desde o lançamento de seu programa nuclear militar, em 1942, os Estados Unidos proibiram a divulgação de qualquer informação concernente à energia atômica, para evitar que a Alemanha nazista fosse a primeira a possuir a bomba. Após 1945, essa restrição foi mantida para atrasar os trabalhos dos soviéticos. Em 1954, depois que a União Soviética experimentou seu primeiro engenho termonuclear, o segredo foi abandonado em benefício de uma política denominada “Átomos para a paz”: os países que desejavam desenvolver seus trabalhos na área nuclear poderiam obter ajuda dos Estados Unidos, com a condição de se comprometerem a utilizá-la para fins pacíficos, ao mesmo tempo que continuariam livres para desenvolver um programa militar se pudessem realizá-lo sozinhos. Vários países beneficiaram-se dessa ausência de regulamentação internacional geral para satisfazer suas ambições militares. Foi assim que, em 1960, sete dos oitos países que atualmente dispõem de um arsenal tinham adquirido os elementos indispensáveis à sua realização1. Foi sobretudo a crise dos mísseis em Cuba, em 1962, que levou ao estabelecimento de uma política global de não-proliferação: Washington e Moscou constataram, então, que se uma outra potência que dispusesse de armas nucleares entrasse em confronto com elas, talvez não tivessem possibilidade de controlar o desenvolvimento da crise. Originalmente, portanto, o principal objetivo do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) era para que as duas superpotências mantivessem seu controle sobre os países de seu campo. Concluído em 1º de julho de 1968, o TNP divide o mundo em dois: de um lado, os “Estados dotados de armas”, que fizeram explodir algum engenho antes de 1º de janeiro de 1967, aos quais foi demandado não ajudar outro país a adquiri-los2 ; do outro, todos os outros Estados, que deviam se comprometer a não tentar obtê-las e a colocar todas as suas instalações nucleares sob o controle da Agência Internacional para a Energia Atômica (AIEA), encarregada de garantir que respeitem suas obrigações. Um “atentado à soberania” Com suas falhas e suas lacunas, o Tratado de Não-Proliferação contém os elementos necessários para impedir a disseminação das armas e, se tivesse sido integralmente aplicado, somente cinco países ainda possuiriam um arsenal nuclear. Seu êxito exigiria sua universalidade, ou seja, que todos os Estados aderissem a ele, que existisse um mecanismo de controle perfeitamente eficaz e que, em caso de violação, medidas enérgicas fossem tomadas para acabar com a infração e dissuadir os outros Estados de imitarem o delinqüente. Inicialmente, o Tratado foi considerado por diversos países um atentado inaceitável à sua soberania: a Alemanha, o Japão, a Itália, que foram seus primeiros alvos, no começo recusaram-se a se submeter a ele. Se entrou em vigor em 19703, foi graças à assinatura de países como Irlanda, Dinamarca, Suécia e México, que com ele viam um meio de reduzir os riscos de um suicídio coletivo; Estados politicamente muito próximos dos Estados Unidos ou da União Soviética; e também países que nem pensavam ter, algum dia, os meios para fabricarem bombas. Entre os primeiros signatários, encontram-se o Iraque, o Irã e a Síria. Entre os primeiros signatários do TNP, estão o Iraque, o Irã e a Síria Em meados da década de 1970, com o aumento dos movimentos antinucleares inicialmente nos Estados Unidos e, sobretudo, com a primeira explosão na Índia em 1974, houve uma mudança importante. A opinião pública se alarmou com os riscos que a segurança no mundo corria com a disseminação, e um grande número de Estados considerou que sua segurança ficaria mais garantida se seus vizinhos não dispusessem de armas. Graças às pressões exercidas pelos Estados Unidos e ao mesmo tempo pela União Soviética, esse movimento permitiu um rápido aumento do número de signatários, aos quais se juntaram os grandes países industrializados – Alemanha, Japão, Itália, Suíça, Holanda. No final de 1979, o número de países que aderiu ultrapassava uma centena. A onda de adesões continuou nos anos seguintes e, apesar da fragmentação da União Soviética, foi ampliada com o fim da guerra fria. Em 1995, os países signatários que decidiram manter o Tratado em vigor por tempo indeterminado já eram 178. No entanto, por diversos motivos, as grandes potências fizeram o esforço necessário para convencer Índia, Israel e Paquistão a se juntarem a elas. Como sempre tinham se recusado a aderir ao Tratado, esses três países puderam construir seus arsenais sem faltar com suas obrigações. Atualmente, isso não seria mais possível: o tratado conta com 189 países que a ele aderiram4, ou seja, quase todos os Estados, e nenhum país poderia mais fabricar uma arma explosiva sem violar seus compromissos internacionais. Brasil, Argentina, África do Sul Entre esses 189 países, encontram-se a Argentina e o Brasil que, nos anos 1970 e 1980, tinham lançado programas de pesquisa cujo objetivo era nitidamente militar. Como na época eles não tinham assinado o Tratado de Não-Proliferação, seus trabalhos não entravam em contradição com suas obrigações internacionais. A Argentina e o Brasil abandonaram seus projetos militares no final dos anos 1990 e aderiram ao TNP, a Argentina em 1995 e o Brasil em 1998. Renunciaram a seus projetos não porque sua segurança externa estivesse então mais garantida do que no passado, mas porque um regime democrático substituiu as ditaduras militares no poder. O mesmo aconteceu na África do Sul, que fabricou uma meia dúzia de armas nos anos 1970 e 1980, sem ter cometido infração e sem que a AIEA pudesse intervir. Pretória desmantelou suas armas exatamente no momento em que abandonou o regime do apartheid e aderiu ao TNP em 1991. Em meados da década de 1990, os Estados Unidos quis completar o TNP com um Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares (Treaty of Complete Prohibition of the Nuclear Tests) e uma convenção proibindo a produção de urânio enriquecido e de plutônio de qualidade militar. Os dois acordos visavam unicamente a Índia e o Paquistão, mas os americanos pensavam que esses dois países iam aderir facilmente a um tratado universal. Na verdade, os dois acordos não têm o menor sentido para os outros países: 184 Estados assumiram o compromisso de não adquirir armas; no que diz respeito à promessa de não explodir as armas que não tinham fabricado não representava um progresso muito significativo! Os cinco países dotados de armas interromperam suas experiências, e a França, que desmantelou o polígono do Pacífico, não poderia mais retomá-las. Quanto aos interessados, a Índia e o Paquistão, que tinham explodido suas armas em 1998, continuaram a produção de matérias físseis militares e se recusaram a aderir ao Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares e à convenção. É preciso acrescentar que a impossibilidade de realizar experiências jamais impediu um país de adquirir armas: Israel jamais fez alguma desses testes, mas todos os especialistas reconhecem seu arsenal militar; oficialmente, a África do Sul jamais fez experiências e, no entanto, detinha uma meia dúzia de armas; a existência de vários engenhos no Paquistão era incontestável antes mesmo de 1998. Em suma, esse projeto de tratado que os Estados Unidos se recusam a ratificar não tem outro interesse a não ser a afeição simbólica que lhe concede a opinião pública. As dificuldades da AIEA Foi a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) que ficou encarregada de controlar o respeito às obrigações contraídas pelos países. Teve de fazê-lo, desde o início, dentro de condições muito complicadas. Os inspetores podiam ir apenas aos países membros do Tratado que tinham assinado com a AIEA e ratificado um acordo particular que especificava seus direitos e seus deveres. É por essa razão, por exemplo, que não puderam entrar na Coréia do Norte antes do mês de abril de 1992, embora a existência do reator e da instalação de retratamento em que foi produzido o plutônio norte-coreano fossem conhecidas pelo menos desde 1990. Em seguida, o acesso dos inspetores às diferentes instalações foi limitado por inúmeras disposições administrativas: por exemplo, deviam inicialmente solicitar um visto cuja obtenção podia ser mais, ou menos, longa. Além disso, eram autorizados a fiscalizar uma usina somente durante um tempo minuciosamente calculado de acordo com a natureza das atividades e a quantidade de urânio ou de plutônio que nela se encontravam. Todas as regras às quais os inspetores deveriam se submeter foram definidas em 1971, não por funcionários da Agência que poderiam especificar o que precisavam para realizar sua missão, mas pelos representantes dos governos e, sobretudo, os dos países que, na época, eram os mais avançados na área nuclear. Tomaram muito cuidado para limitar o máximo possível as obrigações que os controles ocasionariam por si só e, sobretudo, a seus industriais. O mecanismo de controle foi assim criado com base no postulado de que programa nuclear não podia ser conduzido clandestinamente, sendo a única fraude concebível o desvio, para usos militares, do urânio ou do plutônio que teriam de continuar no setor civil. Portanto, os inspetores tinham acesso somente às instalações declaradas por cada Estado, e sua tarefa consistia em garantir que todas as matérias físseis que ali fossem introduzidas fossem bem utilizadas para fins pacíficos. Não tinham de fiscalizar se existiam instalações no país que não lhes tivessem sido declaradas. Essas limitações não eram totalmente absurdas, se levarmos em conta algumas técnicas da época. Elas exigiam, sobretudo para a produção de urânio enriquecido, usinas de dimensões enormes, com formas características, que absorviam quantidades consideráveis de energia e cuja construção e o funcionamento seriam inevitavelmente detectados. É preciso acrescentar que, no início dos anos 1970, somente os países industrializados avançados podiam pensar em atividades nucleares importantes. Ora, tratava-se de países democráticos, onde as informações circulam livremente e em que a decisão de se dotar de um arsenal não podia continuar clandestina. Com os limites que lhe foram assim impostos, o sistema de controle funcionou de maneira adequada, uma vez que desde 1945 nenhuma arma nuclear explosiva foi fabricada em uma instalação sob a vigilância da AIEA. Não que os controles sejam infalíveis, mas até o presente foram muito eficazes para que os fraudadores prefiram não correr o risco de serem surpreendidos pelos inspetores. No entanto, logo após a guerra do Golfo, em 1990-1991, foram descobertas instalações, no Iraque, que teriam permitido ao país, poucos anos depois, dispor de um verdadeiro arsenal. Saddam Hussein tinha dados provas de que, pelo menos em um país submetido a um regime ditatorial feroz, atividades nucleares clandestinas são totalmente possíveis. Para isso, os iraquianos haviam utilizado o método de enriquecimento do urânio por centrifugação, uma técnica adotada na Europa em meados da década de 1970, que permite instalações muito menores, podendo ser escondidas em construções de aparência banal, consumindo muito menos energia e que os serviços de informações secretas têm poucas chances de detectar, salvo quando dispõem de informantes no local. Protocolo Adicional não é garantia Para tentar adaptar os mecanismos de controle a esse novo tipo de fraude, a AIEA adotou, em 1997, um Protocolo Adicional5, que dá aos inspetores poderes de investigação sensivelmente mais extensos, mas que também deve ser assinado e ratificado por cada Estado antes de lhe ser Para tentar adaptar os mecanismos de controle a esse novo tipo de fraude, a AIEA adotou, em 1997, um Protocolo Adicional5 , que dá aos inspetores poderes de investigação sensivelmente mais extensos, mas que também deve ser assinado e ratificado por cada Estado antes de lhe ser aplicável6 . Os meios assim acrescidos dados à Agência já permitiram resultados consideráveis7 , e poderão dar aos inspetores os meios de detectar a existência de atividades mantidas secretas em um país. No entanto, não se trata de uma panacéia e, salvo se têm muita chance, é pouco provável que os inspetores descubram o lugar em que uma instalação clandestina foi construída, a não ser que lhes tenha sido apontado por um serviço de informações secretas. aplicável6 . Os meios assim acrescidos dados à Agência já permitiram resultados consideráveis7 , e poderão dar aos inspetores os meios de detectar a existência de atividades mantidas secretas em um país. No entanto, não se trata de uma panacéia e, salvo se têm muita chance, é pouco provável que os inspetores descubram o lugar em que uma instalação clandestina foi construída, a não ser que lhes tenha sido apontado por um serviço de informações secretas. Uma organização internacional como a AIEA não é uma oficina de espionagem, não dispõe de meio algum para obter informações secretas e deve respeitar os acordos assinados com o país controlado. A localização precisa de uma usina continua a ser de responsabilidade dos serviços de informações, cabe a eles dar à Agência os elementos de que ela precisa. Nenhum dos cinco Estados dotados de armas assinou esse protocolo adicional: se os inspetores chegassem à conclusão de que existem nos Estados Unidos ou na França, por exemplo, em lugares aliás perfeitamente conhecidos, instalações nucleares militares, não seria uma descoberta muito impressionante. No entanto, a França assinou simbolicamente uma versão adocicada para tratar com prudência a suscetibilidade dos outros membros da União Européia, muito sensíveis à diferença de tratamento entre as duas categorias de Estados. Da mesma maneira, nenhum tratado proíbe a um desses cinco países fabricar novos tipos de armas: certamente, seria contrário ao espírito do artigo VI do TNP sobre o desarmamento nuclear. Isso não é inteiramente contrário ao texto do Tratado que, muito hipocritamente, faz uma certa ligação entre desarmamento nuclear e desarmamento geral e completo. Desde cerca de quarenta anos até hoje, os cinco países dotados de armas, que são também os principais exportadores de armas convencionais, evitam incitar um desarmamento geral e invocam a ausência de progresso sobre essa questão para ignorar cinicamente os acordos de desarmamento nuclear que fizeram. Novas armas em Washington Os Estados Unidos falam regularmente em fabricar novas armas nucleares. Trata-se de uma obsessão para os fabricantes de armas que, há décadas, buscam todos os argumentos possíveis para desenvolverem suas atividades. Esses projetos não têm o menor alcance operacional real, mas concentraram a atenção da opinião pública e ocultaram completamente transformações infinitamente importantes previstas pela Nuclear Posture Review (Revisão da Postura Nuclear) de janeiro de 2002. Particularmente, as armas nucleares não constituem mais uma categoria separada do arsenal norte-americano, são integradas no conjunto das armas ofensivas que o presidente pode, conseqüentemente, utilizar de acordo com sua vontade da mesma maneira que qualquer outra arma, de acordo com a natureza da missão a realizar. O mesmo documento prevê o recrutamento de uma nova geração de especialistas em armas para substituir aquela que vai se aposentar, a substituição dos mísseis intercontinentais em 2020, dos submarinos em 2030 e dos bombardeios em 2040. Ou seja, o armamento nuclear norte-americano é concebido para um tempo indefinido ou, pelo menos, até o fim do século. Se a AIEA constata que um Estado não respeitou suas obrigações, ela encaminha o caso para o Conselho de Segurança da ONU, único habilitado a tomar as medidas necessárias para acabar com a infração. A ONU tratou duas vezes de uma violação dos tratados de não-proliferação, e os ensinamentos que podemos tirar dessas experiências foram mitigados. No caso do Iraque, cujas atividades clandestinas só foram descobertas após a guerra do Golfo, em 1991, quando o país foi militarmente vencido e obrigado a aceitar as condições impostas pelo Conselho de Segurança, a AIEA pôde destruir todas as instalações construídas de maneira ilícita. A República Popular Democrática da Coréia (RPDC; Coréia do Norte) também deu provas, em 1992, de ter violado os acordos que assumiu ao assinar o Tratado. Ela muito rapidamente declarou que considerava qualquer sanção um ato de guerra, e a China se apressou em declarar que a crise deveria ser resolvida por meio de negociações. A atitude de Pequim e o medo de uma guerra que, na península, corria o risco de fazer um considerável número de vítimas na Coréia do Sul, levaram em 1994 a um acordo assinado entre Pyongyang e Washington, segundo o qual a Coréia do Sul deveria construir no Norte dois enormes reatores produtores de eletricidade em troca de uma suspensão das atividades norte-coreanas. Esse acordo foi mantido até que os Estados Unidos decidiram acabar com ele no final de 2002; os norte-coreanos retiraram-se, então, do Tratado de Não-Proliferação, expulsaram os inspetores da Agência, separaram a quantidade de plutônio necessária à fabricação de uma meia dúzia de armas e afirmaram poucos meses depois que, a partir de então, dispunham de armas nucleares. Nenhuma dessas decisões suscitou a menor reação do Conselho de Segurança e de outros países, se excetuarmos as ameaças terríveis e sem efeito proferidas pelo presidente dos Estados Unidos. Desde então, e de acordo com as resoluções da China, negociações reuniram as duas Coréias, os Estados Unidos, a China, o Japão e a Rússia8 . No final de uma declaração comum assinada em 19 de setembro de 2005, a RPDC prometeu abandonar seus programas nucleares e os cinco países citados anteriormente, em troca, prometeram fornecer uma ajuda energética e garantias relativas à segurança. Mudando de opinião, Pyongyang questionou todavia esse acordo no dia seguinte, exigindo ter reconhecido seu direito de utilização pacífica da energia nuclear antes de moderar sua posição em seguida. Da mesma maneira, em uma resolução adotada por consenso entre 139 Estados membros, no dia 30 de setembro, a AIEA aclamou o anúncio pela RPDC relativo a sua intenção de renunciar à arma nuclear. No que diz respeito ao Irã, onde nenhuma infração pôde ser constatada, se contentarmos como a AIEA tem o dever de fazê-lo, de uma interpretação literal do Tratado. Mas se as discussões em curso com a Alemanha, a França e a Grã-Bretanha não tiverem êxito, os Estados membros poderão encaminhar a questão para o Conselho de Segurança, baseando-se não em uma interpretação jurídica do texto, mas em um julgamento político. O papel dos neoconservadores A política de Não-Proliferação foi profundamente enfraquecida desde a Conferência de 1995, no momento em que o objetivo parecia quase atingido. A necessidade de interromper a disseminação de armas foi atacada nos Estados Unidos pelos neoconservadores que contestavam que seu país mantivesse qualquer obrigação internacional; em seguida, por outros para quem a não-proliferação pertencia à lógica da guerra fria e não tem mais razão de ser desde que ela acabou. Para estes, a resposta às ameaças de disseminação das armas reside na fabricação de defesas antimísseis, que todos os países deveriam comprar dos Estados Unidos. Outros, talvez mais numerosos ou mais influentes, consideram que a proliferação nuclear não é condenável se for feita por países aliados aos Estados Unidos. O Tratado de Não-Proliferação também é objeto das mais vivas críticas. Há muito tempo vozes se elevam contra um sistema que permite que cinco países possuam as armas mais poderosas e proibam ao outros adquiri-las. Freqüentemente considerada inevitável durante a guerra fria, essa desigualdade de tratamento é muito menos suportada desde o desmantelamento da União Soviética. Ainda mais porque o Tratado contém também disposições que prevêem um desarmamento nuclear que os cinco países dotados de armas ignoram com a maior hipocrisia. Conservando, hoje, arsenais tão importantes quanto em meados dos anos 1970, símbolos de sua potência e de seu prestígio, os cinco países só podem incitar os outros a imitá-los. Essa falta de ligação com a idéia de não-proliferação manifestou-se de maneira marcante durante a Conferência para análise do Tratado em junho de 2005: em vez de expressar uma reprovação unânime em relação aos fraudadores, os Estados participantes se dividiram sem conseguir chegar a um acordo sobre qualquer questão, refletindo um mundo dividido, desencantado, desorientado. No entanto, esse regime criticado, mas ao qual nenhuma solução de substituição jamais pôde ser proposta, continua em vigor, e talvez a saída das crises norte-coreana e iraniana decidam seu futuro. Se a Coréia do Norte e o Irã renunciarem às suas ambições militares, assim como um bom número de países fez antes deles, os países que ficarem tentados a imitá-los sem dúvida hesitarão em se lançar em um projeto oneroso e condenado ao fracasso. Se, ao contrário, eles alcançarem seus objetivos, é possível que vários outros países decidam produzir suas próprias armas.