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Por todo o continente asiático, trabalhadores estão sendo forçados a sair de suas terras para abrir espaço às plantações, mineradoras ou até mesmo construção imobiliária. Eles estão resistindo – mas empregadores e a policia estão usando táticas antigas para reprimi-los
Por Josiah Mortimer, em New Internationalist | Tradução: Vinicius Gomes
Há uma guerra acontecendo na Ásia – e é uma que, ao contrário do Isis no Iraque ou do caos na Síria, não está chegando às manchetes dos jornais. Segundo Sanjiv Pandita, direto do Centro de Monitoramento de Recursos da Ásia, em Hong Kong, é uma guerra que está acontecendo por todo o continente contra os trabalhadores.
O geógrafo David Harvey deu o termo a esse processo como “acumulação por desapropriação”. Por todo o continente asiático, os trabalhadores estão sendo forçados a sair de suas terras para abrir espaço às plantações, mineradoras ou até mesmo construção imobiliária. Eles estão resistindo – mas empregadores e a policia estão usando táticas antigas para reprimi-los.
A recente onda de ataques contra cidadãos foi impulsionada pela expansão de políticas neoliberais na Ásia, incluindo as controversas “zonas de processamento para exportação”, que carecem de qualquer padrão trabalhista ou ambiental. Nessas áreas, “tudo é uma commoditie”, segundo Pandita, particularmente na China.
E os números são impressionantes: 300 milhões de pessoas – quase que a população inteira dos EUA – estão no momento em dispersão pela Ásia, forçadas a sair das áreas rurais para as cidades. Essa escala é “sem precedentes em qualquer era da história do mundo industrial”, diz Pandita. Claro, alguns terminam por trabalhar em fábricas cujos nomes se tornaram infames, tais quais a fabricante de sapato Yue Yuen, onde 80 mil trabalhadores recentemente entraram em greve; ou a Foxconn, onde o seu iPhone provavelmente foi fabricado. Todavia, muitos trabalhadores não acabam ali.
Trabalhadores vulneráveis, trabalho perigoso
A maioria irá se encontrar em trabalhos ainda mais desregulamentados da economia informal – catando lixo, trabalhando em construções e prostituição. Trabalhos informais como esses “empregam” quase que um quarto do total da população asiática: 1 bilhão de pessoas. Isso corresponde a 70% de todos os empregos vulneráveis do mundo e são também, geralmente, trabalhos perigosos. Mais de um milhão de pessoas morrem todos os anos na região, por morte relacionada ao trabalho.
Esses trabalhadores não são apenas desapropriados de suas terras e recursos – forçados a sair por transnacionais com a ajuda das autoridades locais – mas também de seus direitos. E como, geralmente, não existem empregadores identificáveis, seja por conta da cadeia de suprimento ser tão longa ou por serem “autônomos”, se organizar para lutar por melhores condições é muito difícil. Mas pode ser feito.
Após o colapso no ano passado da fábrica de vestuário Rana Plaza, em Bangladesh, o último ano testemunhou algumas das maiores greves na história da Ásia. Novamente, os números são estarrecedores: 100 milhões de trabalhadores na Índia entraram em greve – em um único dia. Milhões cruzaram os braços em Hong Kong, Indonésia e Bangladesh, neste último conquistando um aumento salarial de 50% no setor têxtil. No Camboja, uma greve generalizada similar ocorreu em dezembro, mas foi confrontada com uma violenta repressão. Na Coreia do Sul, a maioria dos trabalhadores informais tomaram ações radicais – especialmente os pedreiros.
Dentro dessas batalhas, a questão de unidade entre trabalho “formal” e “informal” tem que ser debatida. “Nós temos que acreditar que todos os trabalhadores são apenas um – não importa o que eles estejam fazendo”, diz Pandita. A questão é como unir todos eles. Novas maneiras de organização já estão acontecendo – o desafio, com ou sem empregadores ocultos, é como e onde realizar a “barganha”. Ao invés disso, a negociação deve ser política.
Até mesmo onde trabalhadores informais estão se organizando, geralmente ela acontece de maneira separada. Pessoas que trabalham em casa, profissionais sexuais e vendedores de rua estão se organizando, mas não como uma unidade.
Em tais situações, a questão de liderança também emerge e, de certa maneira, problemática. Os movimentos frequentemente captam organizadores externos e de classe média que tomam o controle da liderança. Ainda assim, diz Pandita, “os agentes de transformação têm que ser os próprios trabalhadores. Nós temos que ser apenas catalisadores”. Talvez a atual situação seja apenas uma fase temporária enquanto lideranças populares se desenvolvem.
Da parte dos trabalhadores no Ocidente, a solidariedade deve ser genuína – “não pode ser baseada em dó”. Os movimentos contra a acumulação por desapropriação estão crescendo e, o desafio para aqueles no hemisfério norte é oferecer solidariedade sem cooptá-los. Entretanto, ao menos uma coisa é certa – com a qualidade de vida no Ocidente sendo destruída pela austeridade, todos agora são trabalhadores.