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A triste verdade sobre as eleições para o Congresso norte-americano é que os interesses dos cidadãos comuns não são páreo para o poder das corporações e o casamento de conveniência entre Wall Street e os conservadores religiosos impede o avanço de muitas pautas progressistas no país
Por David Niose, em Alternet | Tradução: Vinicius Gomes
Os EUA seguem para as chamadas eleições de meio-mandato e uma das poucas certezas a respeito é que mudanças progressistas não estão no horizonte. As vitórias republicanas no Congresso são virtualmente certas e a principal questão é apenas saber o quão ruim o estrago será.
Uma queda para a direita seria menos preocupante se tivesse sido precedida por uma queda para a esquerda, mas apenas os norte-americanos mais iludidos acreditam que o país passou por uma onda liberal (esquerda) nos anos recentes. Apesar de fazer campanha e ter slogans sobre esperança e mudança seis anos atrás, Barack Obama rapidamente cercou-se de conselheiros da Goldman Sachs e, até mesmo se sua retórica fosse sincera, ele nada fez para desafiar a natureza fundamental nos EUA. Todos sabem que Wall Street comanda e controla o sistema e nem mesmo os mais entusiastas partidários de Obama acreditam que sua administração mudou isso.
Ao passo que nos aproximamos da última fase da presidência de Obama, provavelmente a realidade mais decepcionante é que até os parâmetros do debate não mudaram: um partido oferece um conservadorismo extremo que geralmente é acompanhado por malucos anti-intelectuais, enquanto o outro partido oferece uma agenda de centro-direita que aceita as verdades e os paradigmas corporativos. O fato é que todo o espectro político corteja os interesses corporativos, e mesmo quando um debate aparentemente vigoroso está ocorrendo, ele fala sobre como a plutocracia se tornou mestre na arte do controle.
Seja lá o que aconteça nessa eleição, ninguém seriamente acredita que os interesses das corporações transnacionais diminuirão, ou que os sindicatos trabalhistas voltem a florescer, ou que uma reforma séria sobre financiamento de campanha ocorra, ou que qualquer iniciativa pública significativa irá atacar as raízes da crescente disparidade de riqueza no país. De fato, mesmo que os democratas se saiam melhor do que o esperado, todos podem estar certos de que não haverá nenhuma redução nos gastos militares e apenas os otimistas sonhadores imaginam que essas eleições serão um passo à frente na resolução da crise do sistema educacional ou dos níveis epidêmicos da sociedade carcerária.
Para ser justo, os EUA ocasionalmente veem algum progresso social genuíno em algumas áreas (direitos dos homossexuais sendo o exemplo recente óbvio), mas qualquer asserção de progressismo moderno nos EUA enxergaria que as falhas são muito mais numerosas que os sucessos. A classe trabalhadora vive no limite, ou na pobreza ou pior – com empregos degradantes e mal pagos que não oferecem qualquer segurança, geralmente providos através de agências de empregos. Em muitas comunidades negras, uma linha “escola-para-prisão” tornou-se uma clara e definitiva realidade social. Em um sinal claro da dominância corporativa, a desregulação e a privatização tornaram-se a norma por todo o sistema. E graças a ativistas sociais conservadores, os direitos de reprodução têm ficado sob estado de sítio na maior parte do país – e não apenas no que se refere ao aborto, mas também o acesso a métodos de controle de natalidade se tornou terreno de controvérsia. Sendo assim, infelizmente, poucos esperam que as eleições de meio-mandato em 2014 possam mudar qualquer uma dessas coisas.
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Se existe qualquer razão para esperança em meio às ruínas da política norte-americana e políticas públicas, ela reside no fato de que a raiz do problema se tornou mais aparente, com todas as evidências apontando para o principal culpado: o excessivo poder corporativo. Por conta da crise financeira de 2008 e da óbvia disfunção do sistema político norte-americano, o diagnóstico fica fácil. Se os cidadãos comuns estão sem poder, é apenas porque o poder reside em outro lugar – e esse “outro lugar” é o setor corporativo.
Os norte-americanos gostam da retórica da democracia, mas a triste verdade é que os humanos comuns não são páreo para as “pessoas” corporativas na batalha pelo poder. As corporações não apenas são muito mais ricas, mas também têm muito mais vantagens na briga: elas possuem um foco único que é o lucro e, diferentemente de humanos normais, não possuem preocupações morais, problemas de família, interesses por outros, ou até mesmo sobre a saúde e a mortalidade. Se as corporações são realmente pessoas – e a Suprema Corte diz que são – elas são, de muitas maneiras, super-humanos, excedendo os humanos reais tanto em recursos como em vigilância.
Então esses humanos reais podem apenas aspirar por objetivos progressistas – lugar por sustentabilidade ambiental, justiça econômica e social, direitos trabalhistas, direitos de consumidores, pequenos negócios e uma política externa menos militarista – mas nós devemos entender que praticamente todos esses esforços estão destinados a não terem sucesso se ameaçaram seriamente o poder corporativo. Obviamente, algum progresso pode ser alcançado quando acontece de ele ser consistente (ou, de certa maneira, menos conflituoso), com os interesses corporativos. Mas é necessário perceber que muitas, se não a maioria, das pautas progressistas são simplesmente inaceitáveis para as corporações e indústrias que gerem a plutocracia.
Realmente, até mesmo algumas questões que nem realmente importam para a “América corporativa” – tais como o direito de escolha das mulheres – tornaram-se um assunto controverso, pois os interesses corporativos construíram alianças com os setores conservadores por ganhos políticos. Aqueles que comandam o Conselho Comercial Legislativo (ALEC, sigla em inglês) e a Câmara do Comércio – dois centros de poder com enorme influência política – não poderiam se importar menos sobre os direitos de um feto de dez semanas de idade, mas eles aprenderam décadas atrás que os conservadores irão apoiar vigorosamente seus interesses se políticos pró-corporativos adotarem posições contra liberdade de escolha. Assim sendo, surge o estranho casamento de Wall Street com a “Direita Religiosa” no partido republicano moderno.
Foto de Capa: Reprodução