Escrito en
GLOBAL
el
As duas gigantes do setor têxtil e energético, respectivamente, foram agraciadas na cidade suíça por sua falta de responsabilidade ambiental e social
Por Ray Smith, da IPS/Envolverde
[caption id="attachment_40627" align="alignleft" width="352"] Liana Foxvog, à esquerda, e Kalpona Akter querem levar o "prêmio "de Davos à sede da Gap em São Francisco, nos EUA(Foto Ray Smith/IPS)[/caption]
A norte-americana Gap e a russa Gazprom, duas gigantes do setor têxtil e energético, respectivamente, foram agraciadas nesta cidade suíça com os temidos prêmios Public Eye (Olho Público) por sua falta de responsabilidade ambiental e social, enquanto a pouca distância acontecia o Fórum Econômico Mundial. O júri, composto por organizações não governamentais, elegeu a GPA, enquanto 95 mil pessoas votaram pela internet na Gazprom.
“Lamentavelmente, continua existindo a necessidade de campanhas como a nossa para exigir transparência das empresas”, advertiu Silvie Lang em nome dos dois organizadores, Declaração de Berna, promotora de uma relação mais equitativa entre Norte e Sul, e Greenpeace Suíça. “Estamos aqui para recordar, ao mundo empresarial e aos que se escondem atrás das portas fechadas em Davos, que as consequências sociais e ambientais de suas atividades de negócios não afetam apenas as pessoas e o meio ambiente, mas também a reputação de suas companhias”, explicou.
Para a Declaração de Berna, não é uma opção a participação no Fórum Econômico Mundial, que acontece há 44 anos consecutivos, desta vez entre os dias 22 e 25 deste mês. “Esse tipo de inclusão é muito menos eficaz do que a crítica de fora”, disse seu porta-voz, Oliver Classen, à IPS. “Davos é a vitrine mundial da política simbólica, onde os incendiários se disfarçam de bombeiros por alguns dias”, ressaltou.
Este ano, as ONGs internacionais propuseram 15 candidatos para os dois prêmios da vergonha. Entre eles estão Glencore Xstrata e Basf, como representantes da indústria da extração, produtores de praguicidas e a GAP, empresa de vestuário que ficou com o prêmio do júri. “Concedemos esta vergonha à GAP por suas monstruosas e pouco sinceras práticas comerciais, que são obstáculos para acordos juridicamente vinculantes para melhorar substancialmente as condições de trabalho” de seus empregados, afirmou o diretor-executivo do Greenpeace Internacional, Kumi Naidoo, em nome do Júri.
A Gap não estava presente para receber o prêmio. Em seu lugar o receberam Kalpona Akter, do Centro de Bangladesh de Solidariedade com os Trabalhadores, e Liana Foxvog, do Fórum Internacional para os Direitos Trabalhistas (ILRF). Akter, uma ativista de base implacável, foi no passado operária têxtil de roupa infantil. “Costurava roupas para as empresas milionárias e ganhava menos de US$ 10 por mês por 450 horas de trabalho”, afirmou. Atualmente, o salário mínimo em Bangladesh chega a US$ 68 mensais. “Pela inflação, não é muito mais do que eu costumava receber”, acrescentou.
Contudo, sua principal preocupação não são os baixos salários. “Quando os trabalhadores reclamam pelos riscos de segurança, não são ouvidos”, pontuou. Há três anos, 29 operários morreram em uma das fábricas fornecedoras da GAP em Bangladesh. Depois dessa tragédia, organizações sindicais e trabalhistas negociaram com a empresa transnacional para acabar com a mortandade em constante crescimento na indústria do vestuário. No total, 1.129 trabalhadores bengali morreram em incêndios em fábricas de roupas no ano passado.
Em um comunicado de imprensa a GAP afirma ser membro fundador da Aliança para a Segurança dos Trabalhadores de Bangladesh. “Esta organização é um compromisso sério, transparente e vinculante por parte de seus membros para realizar melhorias urgentes pela segurança dos trabalhadores em Bangladesh”, afirma a nota.
Para Fogvog, a Aliança é pouco mais que uma lavagem”. A ativista se comprometeu a levar o prêmio diretamente à sede da GAP na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos. “Não queremos que as empresas deixem nossos países. Queremos empregos”, destacou Akter. “Queremos empregos, mas devem ser postos de trabalho com dignidade. As corporações mundiais devem deixar de lucrar com esse sistema de mão dupla”, acrescentou.
Um terço das 280 mil pessoas que participaram da votação pela internet escolheu o gigante energético Gazprom para o prêmio popular. Não é de surpreender, já que a empresa recebeu muita atenção nos últimos meses. Em setembro, as forças de segurança russas detiveram 28 ativistas do Greenpeace e dois jornalistas durante um protesto contra a extração de petróleo em sua plataforma marítima Prirazlomnaya. No mês passado, a Gazprom se converteu na primeira companhia a extrair petróleo no Oceano Ártico.
Segundo o Greenpeace, Prirazlomnaya não é, em absoluto, uma unidade de perfuração de vanguarda. Preocupa os ativistas não estar à disposição do público um plano de resposta convincente diante de um eventual vazamento de petróleo em um dos ambientes mais extremos do mundo. A organização afirma que os métodos tradicionais de limpeza que a Gazprom usa simplesmente não funcionariam em condições geladas.
A IPS pediu à Gazprom para comentar o prêmio que ganhou por “conduta empresarial irresponsável à custa das pessoas e do meio ambiente”. O porta-voz da empresa, Sergey Kupriyanov, não deu detalhes quanto a uma possível reação, mas destacou que a companhia está plenamente comprometida com os padrões ambientais mais elevados. “Portanto, estamos muito surpresos pela decisão dos jurados dos prêmios Public Eye, que, ao que parece, está motivado por inquietudes alheias à ecologia”, declarou à IPS.
O porta-voz disse que a plataforma foi projetada especificamente para climas hostis. “As técnicas de perfuração aplicadas evitam a contaminação da água subterrânea e a mescla de resíduos da perfuração e da produção com água do mar”, explicou o porta-voz à IPS. “Os planos de prevenção e de resposta especialmente desenhados para vazamento de petróleo garantem que a tripulação da plataforma esteja bem equipada para as situações de emergência”, acrescentou.
Naidoo afirmou que sua organização considera realizar um chamado de boicote à Gazprom e sua sócia, Shell, que no ano passado recebeu outro prêmio da vergonha em Davos. “Nosso protesto pacífico no Ártico conscientizou muitos. Cerca de cinco milhões de pessoas assinaram nossa campanha do Ártico e o melhor está por vir”, indicou.
Utilizar os prêmios Public Eye para conscientizar ainda mais as pessoas pode ser mais fácil para as organizações que se ocupam da Gap, já que sua base de consumidores difere muito da referente à Gazprom. A roupa da Gap não é imprescindível para ninguém, mas muitos dependem do petróleo e do gás da empresa russa.
É impossível que as críticas à empresa energética não sejam ouvidas. “Mas, mesmo Gazprom, Rosneft e Chevron não são completamente imunes à pressão pública”, opinou Naidoo. E acrescentou que essas transnacionais ignoram que “as relações e a reputação são um capital tão importante para o sucesso quanto o capital convencional”.