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Em entrevista ao Guardian, ele acusa as políticas de austeridade de terem destroçado a Grécia e aberto caminho à ascensão dos neonazis
Por Esquerda.net
Pode dizer-se que o seu partido Syriza apareceu do nada e subiu dos 4% para os 30%, sendo hoje o partido melhor colocado nas sondagens gregas. É a primeira vez desde os anos 70 que um partido à esquerda da social democracia é candidato ao poder. Como explica este sucesso?
Acho que foi uma evolução natural, tendo em conta a crise na Grécia e os ajustes bárbaros que foram escolhidos. Isto provocou uma fratura social e teve como consequência a desintegração do sistema político. Essa situação cortou os laços de representação política entre os partidos políticos tradicionais e os grupos sociais que representavam. Em especial os laços entre a social democracia e as classes médias no que respeita aos seus direitos, às suas aspirações e aos seus interesses. Por isso acaba por ser natural que a esquerda tenha ocupado esse espaço que ficou vazio na Grécia.
Ao mesmo tempo, assistimos ao aumento da ameaça da extrema-direita e ao discurso do governo que joga contra vocês os temas da imigração e segurança. Acha que há uma ameaça à democracia grega, mesmo tendo em conta que têm a troika a ditar as políticas econômicas?
Penso que a única forma de enfrentar esse fenômeno é uma vez mais dar confiança ao povo da Grécia para acreditar que através das suas lutas e do caminho da democracia será capaz de dar resposta a este ataque bárbaro que está sofrendo. A única forma de combater a propagação da extrema-direita é parar este programa de austeridade bárbara. Foi ele que causou a ascensão dos neonazis por toda a Grécia. O povo grego não tem nenhuma tendência para seguir esse tipo de ideologias. Pelo contrário, o povo esmagou o fascismo antes e depois da Segunda Guerra Mundial.
Sabemos que o programa de austeridade não está funcionando, a dívida aumenta e a crise aprofunda-se. O Syriza opõe-se à saída do euro e quer renegociar o memorando da troika. Mas qual será o vosso poder negocial se o resto da Europa se opuser a essa renegociação?
A Grécia, como qualquer outro país da zona euro, tem um trunfo forte. Qual é ele? É que se algum dos 17 países da zona euro quiser sair, no dia seguinte o euro será insustentável. Nessa situação, seria a Alemanha que teria de regressar ao marco. Esse trunfo forte ainda não foi usado por nenhum governo grego. Até agora, todos os governos da Grécia têm aceitado sem negociar todas estas medidas cruéis da austeridade.
Mas concebe um cenário em que o Syriza governe e decida sair da zona euro?
Ouça, na zona euro não há senhorios e inquilinos. Se a senhora Merkel não consegue compreender isso, bom, então terá de ser convencida que as coisas são mesmo assim e de uma maneira que infelizmente não será muito delicada. Contudo, na política como na economia, muitas vezes somos mesmo obrigados a não ser delicados. Quando nesta altura temos um milhão e meio de desempregados na Grécia e há 700 mil famílias sem ninguém ganhando o sustento da casa, quando somos confrontados com uma crise humanitária sem precedentes, não podemos ser assim tão delicados com aqueles que causaram esta crise.
O programa radical do Syriza está em oposição ao modelo neoliberal e à Otan, mas os seus críticos dizem que se chegarem ao governo terão de se ajoelhar face à realidade dos poderes instituídos e até já começaram a limar algumas das vossas propostas nos últimos tempos. Como responde a essas críticas?
Essa é uma discussão muito longa que também está em curso na Grécia, a de saber se o Syriza se está se aproximando daquilo a que alguns chamam "realismo". Mas à luz da realidade brutal que se passa hoje na Grécia e na Europa, não há nada mais realista do que exigir a mudança dessa realidade. Nos tempos que correm, o único realismo é derrubar esta injustiça social, derrubar estas desigualdades, derrubar este modelo do capitalismo de casino, que busca o lucro e devora a carne das sociedades europeias. Eu acredito que o Syriza é a centelha que ilumina o caminho que temos pela frente.
Nós estamos no fim da cauda do capitalismo neoliberal que existe na Europa. Esta crise não é uma mera coincidência. É uma crise estrutural do capitalismo e do seu modelo neoliberal. O Syriza - e uma Europa do Sul após a vitória de um governo de esquerda na Grécia - são capazes de construir um exemplo para toda a Europa. A Europa teve sempre um papel importante no decorrer dos acontecimentos mundiais. E nós acreditamos que numa altura em que vemos estes acontecimentos tão bárbaros, são necessárias soluções radicais. Se chegarmos ao poder e não tentarmos mudar tudo isso, então não teremos hipóteses de permanecer no poder.
Ver vídeo da entrevista.