Alguns grupos praticam terror. Porém, mais perigosos surfam na crise, no medo do “outro” e no discurso anti-estrangeiros dos políticos
Por Pavol Stracansky (Publicado por Outras Palavras. Tradução: Antonio Martins)
Poucos dias depois de um ataque a bomba contra um hotel da capital da República Checa, aparentemente com caráter racista, analistas e ativistas alertaram sobre as campanhas terroristas de organizações neonazis, que recebem apoio de movimentos de extrema direita de outros países.
Organizações extremistas de países como a Alemanha, Itália e Rússia oferecem aos movimentos checos orientação ideológica e operacional, além de oferecer apoio em ações de violência racial e estratégias para reunir apoio de setores sociais.
“É um fato constatado que os partidos de ultra-direita checos e alemães têm acordos de cooperação”, disse à IPS a conhecida ativista Gwendolyn Albert. “Os checos agora parecem seguir a tática alemã de contar com uma presença relativamente importante, contar com partidos políticos registrados e organizar manifestações de que participam os que estão comprometidos ideologicamente com a violência racista, com intenção de perpretar algum ato violento”, acrescentou.
“O impacto dos vínculos ultranacionalistas e fascistas russos também é visível, porque os manifestantes de ultra-direita demonstram ter uma organização paramilitar que enfrenta a polícia”, apontou Albert que trabalha para a organização de educação e direitos humanos Romea Roma, vinculada ao povo cigano.
O alerta foi feito no início de março, quando o ministério do Interior da República Checa divulgou um informe sobre a extrema direita no país. O documento assinala que é provável um aumento do número de ataques racistas nos próximos anos, em parte devido à influência de organizações de extrema direita estrangeiras, que usam o violência e o terrorismo – em especial, as russas.
Os grupos neonazis russos (na foto) estiveram envolvidos em campanhas terroristas, como ataques e assassinatos de juízes que haviam condenado extremistas e ativistas de extrema-direita.
Algumas testemunhas arroladas em julgamentos similares na República Checa afirmam que sofrem ameaças e intimidações. No início de março, foi preciso adiar o desfecho de um processo contra um suspeito de praticar ataque racista, por conta de ameaça de bomba.
Organizações neonazis alemãs também têm antecedentes de terrorismo. Há pouco, revelou-se que uma célula alemã chamada “Socialista Nacionalista Clandestina” foi responsável pelo assassinato de nove imigrantes e um policial nos últimos seis anos, assim como de roubos a bancos e atentados a bomba. Além disso, ex-neonazis alemães declararam que há forte cooperação entre grupos de extrema direita de seu país e da República Checa, e que os campos de treinamento de tiro para neonazis de toda a Europa pertencem a organizações alemãs e estão em território checo.
O autor do informe do ministério do Interior, Miroslav Mares, assegurou que as quadrilhas de ultra-direita têm cada vez mais armas. Conseguem armamento infiltrando-se na polícia e em empresas de segurança privada, o que lhes permite ter licença de porte de armas e, em alguns casos, receber treinamento em situações de combate.
Um exemplo de como foram longe estes grupos, em matéria de armar-se, foi o fato, noticiado pela mídia, de terem se identificado, em uma manifestação de grupos de extrema direita, participantes armados com explosivos de uso exclusivo do exército.
O temor a um aumento da violência racista deu-se em meio a problemas raciais, ocorridos em zonas socialmente desfavorecidas do país. No ano passado, houve protestos maciços e episódios violentos no distrito de Sluknov, no norte da República Checa, após uma onda de ataques e crime que a população local atribuiu aos ciganos.
Alguns analistas que se dedicam ao estudo do racismo, veem, por trás do aumento das tensões, as crescentes dificuldades econômicas. Ele detectaram um aumento de sentimentos negativos contra os imigrantes e as minorias, desde o começo da crise financeira. O próprio informe do ministério do Interior mencionou o agravamento da situação econômica e o aumento da exclusão social como fatores do aumento provável dos ataques racistas.
Mas o sociólogo Mares garante que o terreno fértil para a violência contra minorias foi adubado por algumas figuras políticas destacadas. “Vemos um aumento do racismo ‘comum’. Nas zonas socialmente conflitivas, observa-se a participação da população local em manifestações contra os ciganos, e constata-se que os neonazis são o motor das atividades e preconceitos contra eles”. Mares prossegue: “Agora, ouvem-se declarações racistas de dirigentes políticos que não são de partidos extremistas. Algumas agremiações tradicionais utilizam uma retórica contra os ciganos que poderia estimular mais atividades violentas dos neonazis”.
A extrema direita age para capitalizar o sentimento anti-minoria. Na última década, a maior parte dos grupos ligados a esta corrente, na República Checa, fez um esforço por distanciar sua imagem dos skinheads e converter-se em alternativa política viável. O Partido Justiça Social dos Trabalhadores é a expressão política da extrema direita. Apoia-se especificamente em preconceitos contra a população cigana.
Segundo os estudiosos do fenômeno, as táticas dos extremistas para conseguir seguidores incluem a promoção de sua repulsa não só aos ciganos, mas aos imigrantes em geral, bem como a temas polêmicos para certos grupos sociais, como o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Para algumas organizações internacionais contra o racismo, a situação só melhorará se os dirigentes políticos tomarem a iniciativa de combater o fenômeno, e se forem aprovadas normas legais para dissuadi-lo. Georgina Siklossy, porta-voz da Rede Europeia contra o Racismo, com sede em Bruxelas, afirmou à IPS: “Os políticos têm a principal e mais importante responsabilidade: não se utilizar de discursos de ódio, que podem incitar ataques racistas e contribuir para um sentimento contra setores minoritários”.
Os programas de prevenção nas escolas são essenciais para mudar a situação, completa Mares, o autor do informe oficial. Mas a comunidade cigana está pessimista. Nos últimos anos, ela foi vítima de uma série de ataques incendiários. Um deles, em 2009, deixou uma criança de dois anos incapacitada para sempre. Nos últimos seis meses, 23 atentados racistas deixaram três pessoas mortas.
Emil Vorac, diretor de uma organização não-governamental cigana, trabalha na cidade da As, onde houve, no início de março, um ataque a bomba contra um hotel em que vivam membros desta comunidade. Ele pensa que tais atos eram previsíveis. “Não me surpreenderam, porque parece que o racismo e a xenofobia aumentam, e a situação piora. Esta é minha experiência, após trabalhar em diversas comissões na região. Seus próprios membros atuam como xenófobos, em muitos casos”.