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Rascunho da tentativa de liberalizar produtos industriais na Organização Mundial do Comércio já tem opositores
Por Gustavo Capdevila, da IPS
O rascunho de um acordo para uma liberalização mais profunda do comércio de produtos industriais tropeçou na Organização Mundial do Comércio (OMC) em fortes objeções de muitos países-membros, ao contrário da recepção favorável que teve nesta mesma semana um documento semelhante sobre agricultura. O texto apresentado pelo canadense Don Stephenson, presidente do comitê de negociação sobre acesso a mercados de produtos não-agrícolas (Nama, sigla em inglês), “têm defeitos fundamentais”, afirmou o delegado sul-africano Faizel Ismail.
Essas imperfeições do rascunho têm de ser corrigidas para assegurar um resultadojusto, equilibrado e voltado para o desenvolvimento da Rodada de Doha, insistiu Ismail, que coordena o grupo de países chamado Nama 11. Além disso, observou que suas preocupações são compartilhadas pelo Grupo Africano, Países Menos Avançados e pelo Grupo ACP, que reúne ex-colônias européias na África, no Caribe e na região do Pacifico. A Argentina, também integrante do Nama 11, disse que o documento de Stephenson deixa de lado as posições de muitos participantes. Por esse motivo, a proposta não servirá de veículo para facilitar as negociações na fase que começará em setembro, alertou Alberto Dumont, chefe da missão argentina.
O veterano especialista emcomercio Chakravarthi Raghavan, hoje editor emérito do Suns, uma publicação diária da Rede do Terceiro Mundo, afirmou que nunca havia presenciado uma resposta semelhante em seus 29 anos de acompanhamento do GATT e da OMC. A referencia foi diante da reação negativa de grande parte dos países em desenvolvimento. “Jamais tive ocasião de ver o texto de um presidente receber tal condenação e repúdio de um número de países em desenvolvimento que somam mais da metade dos membros da OMC”, disse Raghavan à IPS.
A OMC, que em 1995 sucedeu o GATT (Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio) na administração do sistema multilateral, está enroscada em um ciclo de negociações para aprofundar a abertura comercial lançada em novembro de 2001 na capital do Qatar. Neste processo, a agricultura constitui o eixo da negociação. Uma proposta preliminar de acordo de modalidade para este tema, apresentada pelo neozelandês Crawford Falconer, presidente do comitê da especialidade, obteve uma aprovação tácita para avançar na negociação a partir do dia 3 de setembro.
Por outro lado, Stephenson considera que entre os membros da OMC existe ânimo de seguir negociando sobre o Nama, ou produtos industriais como também é conhecido este item. Mas, o diplomata canadense reprovou os países porque repetem seus argumentos. “Se não se moverem, não haverá acordos”, avisou. “De todo modo, depois de ouvir críticas severas e também aprovação ao seu texto, passam instruções contraditórias. Andei até encontrar um semáforo no amarelo, o que significa que devo seguir com precaução”, admitiu.
O presidente do comitê de Nama se referia às advertências de alguns países, como a declaração de Dumont, que adiantou que as modalidades propostas no documento prejudicariam seriamente as possibilidades de crescimento industrial de muitos países em desenvolvimento, entre eles a Argentina. As posições de Buenos Aires, como também do Brasil e da África do Sul, refletiram a oposição à redução acentuada das tarifas que protegem os produtos industriais, com propõe o documento de Stephenson. Porém, a União Européia e os Estados Unidos interpretam que essas reduções são insuficientes. Peter Allgeier, chefe da missão norte-americana junto à OMC, disse que o texto não tem suficiente ambição de liberalização do setor.
Em particular, Allgeier se referiu ao caso de aproximadamente 30 países em desenvolvimento mais avançados entre os que figuram os membros do Nama ‘’, para os quais reclamou níveis de tarifas inferiores aos fixados pelo documento de Stephenson. Outro grupo de nações, entre as quais várias da América Latina, como Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Peru e México, disseram estar satisfeitos com o documento. Estas nações latino-americanas apresentaram uma proposta, de ponto médio, como a definiram, pois consideravam que as posições extremas, tanto ofensivas quanto defensivas, “não nos levariam a um acordo”, disse a delegação costarriquenha.
Allgeier considerou “interessante” que a maioria dos integrantes do chamado “ponto médio” tem acordos de livre comércio com outros países, ou com os Estados Unidos e a União Européia, ou, ainda, estão prestes a concretizá-los. Creio que há nisso uma lição. Os países que já liberalizaram seus mercados em relação aos grandes atores mais competitivos no mundo ainda acreditam que é benéfico avançar mais na liberalização, deduziu o negociador norte-americano.
Porém, Ismail recordou aos demais membros da OMC que o sistema comercial ignorou durante mais de 50 anos as necessidades dos países em desenvolvimento. Por essa razão, o mandato de Doha estabelece que os interesses dessas nações devem ser atendidos desta vez. “Não podemos esquecer facilmente a promessa de fazer do ciclo de Doha uma rodada de desenvolvimento”, insistiu.
Envolverde/ IPS