Greve dos petroleiros: “A Justiça tinha que aplaudir. E não reprimir”

Antes mesmo de a greve dos petroleiros ser iniciada, a Justiça do Trabalho declarou a paralisação como ilegal por considerá-la “política” e a intimidação das Forças Armadas já dá as caras

Foto: Federação Única dos Petroleiros
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Desde meia noite de quarta-feira (30), trabalhadores da Petrobras estão em greve. Convocada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), a paralisação que terá duração de 72 horas veio como uma maneira dos trabalhadores da estatal de chamar a atenção da população para a origem do caos econômico e social que teve como uma das consequências a greve dos caminhoneiros, que ainda perdura em algumas regiões do país, e pressionar o governo e o presidente da Petrobras, Pedro Parente, a mudar a política de preços de combustíveis da empresa, que hoje está atrelada, totalmente, ao mercado internacional. De acordo com os petroleiros, o caos econômico decorrente da alta dos preços dos combustíveis acontece devido ao tipo de gestão encampada por Pedro Parente, que sucateou os pátios de refino nacionais e priorizou a importação de derivados de petróleo, o que torna a política de preços da estatal mais dependente do mercado financeiro internacional. Com a greve, os petroleiros querem pressionar o governo a mudar essa atual política de preços que só beneficia as empresas estrangeiras em detrimento do mercado interno representado pelo consumidor brasileiro, que sofre com as constantes altas no preço da gasolina e do gás de cozinha. “Hoje há uma opção deliberada em reduzir a carga do refino. Com isso [a retomada da produção das refinarias a plena carga e o fim das importações de derivados] a gente teria uma importação residual no Brasil. Haveria mais flexibilidade de mexer no preço sem estar colado ao cenário internacional. (…) Ele [Pedro Parente] trata o Brasil como se não refinássemos petróleo. O que está faltando é considerar que temos um parque de refino nacional, e isso daria flexibilidade de mexer com o preço dos derivados”, explicou Rodrigo Leão, que é economista e um dos coordenadores do Grupo de Estudos Estratégicos e Propostas (GEEP) da FUP. O economista, inclusive, escreve periodicamente à Fórum e, em artigo publicado em janeiro deste ano, já detalhava como funciona essa “nova” política de conteúdo internacional da Petrobras e seus efeitos. A fala de Rodrigo se deu em uma mesa redonda promovida nesta quarta-feira (30) pela FUP com jornalistas da mídia alternativa. O objetivo do encontro era esclarecer à população os motivos da greve e de que forma seria possível, sim, a Petrobras regular o preço dos derivados de petróleo. No encontro, os trabalhadores foram além e chamaram a atenção para o cerco judicial e a repressão das Forças Armadas que já dá as caras como ameaça. Greve “política” A greve dos petroleiros mal havia começado quando uma liminar do Tribunal Superior do Trabalho (TST) declarou a paralisação ilegal e determinou uma multa de R$500 mil para cada dia de paralisação. O argumento da Justiça do trabalho para proibir a greve é que ela carregaria um teor “político” e que ameaçaria a produção da petrolífera. Na mesa redonda desta quarta-feira (30) com os jornalistas, os petroleiros esclareceram que não há sentido algum utilizar o argumento de “teor político” para proibir a greve, uma vez que toda greve é, por essência, política. Mais do que isso, os trabalhadores explicaram que a mobilização não foi encampada para atender a uma reivindicação individual ou da categoria ligada à salários ou condições de trabalho, mas que a greve denota uma luta em prol da soberania da Petrobras e do interesse coletivo, que é a redução do preço dos combustíveis. “É verdade, a greve é política. Mas as pessoas ficam demonizando a política como se ninguém fizesse política (…) Nossa pauta de reivindicações, confesso, é uma pauta ousada. Somos uma categoria preocupada com o futuro da empresa e os efeitos desta política nefasta sobre a população. A ministra [do Tribunal Superior do Trabalho] tinha que aplaudir a iniciativa dos petroleiros. Ela usa gasolina, usa gás de cozinha e também deve estar achando os preços abusivos”, disse José Maria Rangel, coordenador geral da FUP. “Não é a greve que é abusiva. É a política de preços do Pedro Parente, apadrinhado de Fernando Henrique Cardoso, que é abusiva. É esse tipo de política que manda no governo Michel Temer”, completou. Repressão: de volta a 1989? Mesmo com a liminar da Justiça do Trabalho, os petroleiros decidiram manter a greve a diversas instalações e refinarias da Petrobras amanheceram com os trabalhadores de braços cruzados. O governo de Michel Temer, então, se apressou em utilizar a Força Nacional e as Forças Armadas para reprimir e intimidar os trabalhadores, o que não adiantou. A greve continua e continuará até domingo, conforme deliberado entre a categoria quando a greve foi deflagrada. A presença do Exército nas ruas para intimidar trabalhadores, no entanto, é motivo de preocupação entre os petroleiros. Na mesa redonda desta quarta-feira (30), José Maria Rangel denunciou que em uma das instalações da Petrobras na Bahia, onde os trabalhadores estavam paralisados, havia sete blindados do Exército. “Trata-se de um movimento pacífico, que tem no seu DNA a preservação da Petrobras e garantir que o cidadão pague um preço justo pelo derivado de petróleo. Não é justo que se utilize as Forças Armadas para tentar reprimir o nosso movimento. Não é justo que o poder judiciário aplique uma multa tão pesada sem ao menos nos ouvir”, disse o coordenador da FUP. Para Rangel, o constante uso das Forças Armadas neste governo de Michel Temer remete o que aconteceu na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em 1988. Naquele ano, milhares de trabalhadores de Volta Redonda e da região Sul Fluminense, no Rio de Janeiro, decidiram, em assembleia geral, entrar em greve por tempo indeterminado e ocuparam a empresa, que na época era estatal. O governo, então, solicitou na Justiça um mandado de reintegração de posse e, então, o Exército, com forte aparato militar, entrou na usina e assassinou três operários. Centenas de outros trabalhadores ficaram feridos. “A presença deles [das Forças Armadas] nas instalações nos causa preocupação. Olha o que aconteceu na CSN em 1989. Estamos caminhando para lá”, alertou o petroleiro. Rangel, no entanto, não se engana. Apesar de preocupante, segundo ele, o uso das Forças Armadas por parte do governo já era esperado pelos petroleiros. “Não é novidade. Quem acompanha a trajetória deste governo sabe. Ele não tem legitimidade e, por não ter legitimidade, recorre às Forças Armadas”.