Desde a Eleição de 2022 muito tem se falado sobre teto de gastos e arcabouço fiscal. Mas, afinal, o que é isso? Qual o impacto que esse tema tem na vida das pessoas comuns?
Você já deve ter ouvido falar em teto de gastos. Esse mecanismo foi duramente criticado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva tanto durante a campanha quanto depois de eleito. Trata-se de uma regra que foi criada em 2016 e implementada a partir de 2017.
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Na avaliação do presidente Lula, de políticos de esquerda em geral e de muitos economistas progressistas, o teto de gastos não permitiu que o país investisse como deveria nos últimos anos, o que gerou prejuízos para diversas áreas, como infraestrutura, moradia, educação e saúde. Além disso, perdeu a credibilidade porque criou um monte de exceções para driblar a norma e estourar o teto.
Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), no governo de Jair Bolsonaro houve cinco alterações das regras do teto, que somariam um impacto fiscal de R$ 213 bilhões em relação ao desenho original.
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Além de ser impraticável, o teto de gastos esvaziou os recursos para viabilizar a retomada, por exemplo, do Bolsa Família a partir deste ano. O orçamento da União de 2023 não previa recursos para manter o pagamento de R$ 600 por mês para os beneficiários do programa, mais R$ 150 por cada criança da família.
Por isso o governo Lula, depois de eleito e antes de tomar posse, apresentou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para que o pagamento destes valores fiquem fora do teto de gastos do orçamento, ou seja, ultrapasse o valor estipulado inicialmente.
O governo de transição então articulou e conseguiu aprovar a PEC 32/22, a PEC da Transição, sancionada no fim do ano passado, para permitir deixar o valor de R$ 145 bilhões do Orçamento de 2023 fora do teto de gastos. Esses recursos já estão sendo utilizados para bancar despesas do Bolsa Família, o Auxílio Gás e a Farmácia Popular, entre outras.
A PEC da Transição também determinou que o governo apresentasse, via projeto de lei complementar, até 31 de agosto deste ano, uma nova regra fiscal para substituir o teto de gastos. Ou seja, o tal do arcabouço fiscal.
Ainda não se sabe o teor dessa proposta do governo Lula. Mas ela vai servir para criar novos parâmetros fiscais que permitam estabilizar a dívida pública, equilibrar as contas do governo e aumentar investimento em áreas consideradas prioritárias
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, guarda a sete chaves o teor do novo arcabouço fiscal, que deve ser anunciado ainda esta semana. Mas antes de vir a público, a proposta passou pelo crivo da equipe econômica do governo e do próprio presidente Lula.
Com o sinal verde de Lula, Haddad tem feito um tour que começou pela Esplanada na semana passada, quando mostrou aos colegas ministros e ministras. Nesta segunda-feira (20) ele esteve no Congresso Nacional e apresentou as linhas gerais da proposta aos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco; e aos líderes do governo nas duas casas, o deputado José Guimarães e o senador Jaques Wagner.
"Nós expusemos as linhas gerais do arcabouço que vai ser anunciado pelo presidente da República, acho que a recepção tanto dos líderes quanto dos presidentes [da Câmara e do Congresso] foi muito boa, assim como foi dos ministros na sexta-feira (17), que conheceram o arcabouço na reunião com o presidente. Nós estamos confiantes que nós estamos indo para a fase final", afirmou Haddad.
Quando chegar à Câmara, a proposta será escrutinada pelos deputados e deputadas e depois, caso aprovada, seguirá para o Senado. O novo round será definir quem será o relator do texto em cada uma das duas Casas.
Na Câmara, a relatoria do projeto do novo arcabouço fiscal entrou na linha de disputa do PT. Segundo o deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR), líder da Federação Brasil da Esperança, formada pelos parlamentares do PT, PCdoB e PV, a apresentação dos nomes indicados foi feita diretamente ao presidente da Casa nesta segunda.
Na última sexta, a relatoria do projeto foi articulada por Lira com o líder do PP na Câmara, André Fufuca (MA). Mesmo alegando confiança na decisão do presidente da Casa, o PT demonstrou desconforto com a indicação direta da relatoria ao PP. Agora, o partido vai tentar reverter a decisão. A expectativa é de que Lira bata o martelo esta semana.
Caso aprovado e promulgado pelas duas casas do Legislativo, em um curto prazo, o principal efeito do novo arcabouço fiscal deverá ser nas expectativas dos agentes econômicos, o "Mercado", o que dará mais credibilidade ao Brasil.
Com "Mercado" calmo, pode ser que haja redução da taxa de juros e até da Selic, que é a taxa básica de juros da economia. Quanto maiores essas taxas, mais caro fica para o governo se endividar e também para as pessoas e empresas, o que inibe o crescimento econômico. Também pode aumentar a percepção de risco do país, ou seja, da ideia de que o país pode acabar não pagando a sua dívida pública.
No médio e longo prazo, caso o arcabouço seja aprovado, poderá ajudar no crescimento da economia, na disponibilidade de crédito e no controle da inflação. Além de possibilitar que o governo invista em políticas sociais, como o enfrentamento à fome, por exemplo.
Teto de gastos pune os mais pobres
Na prática, o teto de gastos impacta na vida de toda a população brasileira porque limita os investimentos em políticas que podem melhorar a vida do povo. Como por exemplo, deixar de investir no Sistema Único de Saúde (SUS).
O presidente Lula abordou o assunto nesta segunda-feira durante o relançamento do programa Mais Médicos, que passou a ser chamado de “Mais Médicos Para o Brasil". Ele defende que a saúde fique fora do teto de gastos.
“Como é que você pode colocar uma coisa como a saúde dentro do teto de gastos? Qual é o preço que você paga de não cuidar das pessoas na hora certa?”, ponderou.
Lula disse ainda que é preciso mudar a mentalidade das pessoas na administração pública e criticou quem diz que políticas públicas são gastos. “Toda vez [que] a gente vai discutir um avanço social aparece alguém da área econômica para dizer ‘mas esse é um gasto, a gente não pode gastar, não tem mais como gastar'”, criticou.
Para ele, o Brasil gastou muito mais do que deveria por negligenciar temas considerados um desperdício, como educação e combate ao racismo. O presidente também defendeu que haja subsídios para programas voltados aos mais pobres. Como argumento disse que o país suporta uma dívida de mais de R$ 1 trilhão e não teria motivos para não aguentar subsídios.