Defensor da livre concorrência quando o assunto é privatização da Eletrobras e Petrobras, o ministro da Economia Paulo Guedes levou para o capitalismo neoliberal a jabuticaba, termo usado principalmente por políticos para se referir a coisas que - como a fruta típica da Mata Atlântica - só acontecem no Brasil.
Ao apelar a supermercadistas que congelem os preços até 2023 diante de uma inflação que acumula alta acima de dois dígitos nos últimos 12 meses, Guedes trabalha de forma desesperada para tentar reverter a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro (PL) em outubro, contrariando o próprio discurso vazio na economia.
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"Diante da derrota eleitoral iminente e o fracasso do receituário neoliberal em organizar as finanças públicas, estabilizar os preços e recuperar o dinamismo econômico com mais empregos e salários, o desespero do ministro Guedes o faz abandonar a ideologia da livre competição e concorrência de preços, apegada ao racionalismo econômico, para apelar aos empresários do comércio reduzir as margens de lucro, não repassado para os preços finais, os aumentos de custos. Ilusão pura no capitalismo brasileiro", disse o economista Marcio Pochmann, da Universidade Estadual de Campinas, à Fórum.
Segundo ele, é o próprio governo quem contribui efetivamente com a alta dos preços, que resultam numa explosão de custos que chega à população em itens básicos, como nos alimentos da cesta básica.
"A inflação está vinculada a própria opção do governo Bolsonaro, de aceitar equiparação de preços internos aos externos, sobretudo de commodities, como petróleo e outras. Além disso, a elevação dos juros eleva o custo do dinheiro e contrai estoques, tornando os preços finais sensíveis a qualquer variação de custos. Guedes colhe o que plantou, fundada em ideologia, não em realidade", diz Pochmann.
Para Maura Montella, professora de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o apelo de Guedes foi, na verdade, uma medida desesperada porque o governo perdeu o controle dos preços e da inflação.
"Eles não podem pedir para os supermercados segurarem a margem de lucro, prometendo compensá-los no ano que vem. Eles não sabem se serão eleitos no ano que vem", afirma.
Para ela, a realidade se impôs diante do processo eleitoral e fez com que Bolsonaro entendesse a máxima de James Carville, economista e marqueteiro da campanha de Bill Clinton em 1992, que diante do avanço de Bush pai cunhou a frase que ficou conhecido no mundo todo sobre o que define o processo eleitoral: "É a economia, estúpido".
"A economia não só derruba presidente, como elege presidente. Foi assim com o FHC, por exemplo. O Collor deixou o governo com uma inflação muito alta. O Itamar Franco entrou e a inflação continuou alta, mas o FHC, então ministro da Fazenda, montou uma forte equipe e juntos implementaram o Plano Real. Nas eleições seguintes, em 1994, o FHC ganhou logo no primeiro turno.
Hoje, os candidatos já perceberam que o que vence eleição não é "arminha", não é motociata, nem briguinha com o Supremo; o que vence eleição é preço baixo e comida no prato", disse ela, em uma versão brasileira e bolsonarista da declaração de Carville.