Inicialmente incluído na CLT pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), com regulamentação entre os artigos 75-A ao 75-F, o teletrabalho vem ganhando cada vez mais espaço no debate da população, dada as transformações das rotinas de trabalho após a pandemia do Covid-19. O teletrabalho ou o chamado home office é uma prática que vêm demonstrando que será uma realidade, mesmo após o fim da pandemia.
No dia 25 de março foi editada a Medida Provisória nº 1.108 que altera as regras do teletrabalho. Por ser uma MP, ela tem validade de 60 dias, podendo ser prorrogada pelo mesmo período. Durante a sua vigência, é preciso que seja votada na Câmara dos Deputados e no Senado Federal para ser convertida em lei.
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A MP nº 1.108 alterou significativamente a legislação original, inclusive passando a incluir a nomenclatura do trabalho remoto, até então ausente nos artigos 75-A ao 75-F da CLT.
Contudo, alguns pontos merecem uma atenção redobrada dos profissionais que estão nesta modalidade de trabalho.
O primeiro ponto é que passou a diferenciar três formas de modalidade de teletrabalho, sendo elas: por jornada, por produção ou por tarefa. O trabalhador que estiver em regime de jornada deverá ter um controle efetivo da hora de início, término e intervalos. Já os profissionais que estiverem na modalidade de teletrabalho por produção ou tarefa, serão isentos deste controle.
A legislação original da Reforma Trabalhista previa que o teletrabalho seria de forma permanente, não cabendo um modelo híbrido. A MP muda esta lógica e considera teletrabalho a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não. Ainda, no parágrafo 1º do artigo 75-A, passa a vigorar que o comparecimento, ainda que de modo habitual, não descaracteriza o regime de teletrabalho ou trabalho remoto.
Ainda tratando de controle de jornada, a MP determina que o tempo de uso de equipamentos tecnológicos utilizado para o teletrabalho pelo empregado, fora da jornada normal de trabalho, não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho.
Durante a pandemia do Covid muito se foi dito que o teletrabalho, na prática, aumentou as cargas de trabalho das pessoas e muitas vezes houve uma “confusão” sobre o encerramento da jornada e a necessidade de desconexão dos trabalhadores. O direito à desconexão não é uma novidade nos debates de legislação trabalhista, apesar de não regulamentado no Brasil, já há alguns países que reconhecem o direito dos profissionais de se desligaram do trabalho, como norma de saúde.
A MP apenas diz que o uso dos equipamentos, fora do horário contratual, não será considerado como efetivo trabalho. Porém, carece de um debate maior sobre os acionamentos pelas chefias dos funcionários, inclusive em instrumentos tecnológicos diversos, como o WhatsApp. Não se pode aceitar que a falta de acesso pelo trabalhador ao sistema principal da empresa seja a única forma de controle de jornada, pois é frequente o contato, como dito anteriormente, por meio de aplicativo de mensagens ou videoconferência. É recomendável que sejam adotadas políticas claras destes acionamentos e a forma de remuneração dos trabalhadores.
A MP também estabelece qual a regra aplicável ao contrato de trabalho, determinando que será a legislação local e as convenções e acordos coletivos da base territorial do estabelecimento de lotação do empregado. Ou seja, um trabalhador com base territorial em São Paulo que resida em Belo Horizonte terá os direitos da capital paulista nos feriados municipais, a título de exemplo. Ainda, a MP deixa explícito que, caso o contrato seja pactuado no Brasil e o trabalhador resida no exterior, será aplicável a legislação brasileira.
Nestas hipóteses, caso seja decisão do empregado em residir em outra localidade, será de responsabilidade dele as despesas resultantes do retorno ao trabalho presencial, ressalvada a possibilidade de pactuação entre as partes de alguma regra diferente.
Não se pode deixar de frisar que os riscos da atividade são do empregador, portanto, me parece que em uma eventual convocação de última hora para retorno ao presencial não atraia para a empresa a responsabilidade pela indenização das despesas do empregador. É sempre importante que o empregado deixe registrado qual a residência no seu empregado, para evitar que a empresa alegue desconhecimento.
Por fim, há a inclusão do artigo 75-F o qual dispõe que os empregadores deverão conferir prioridade aos empregados com deficiência e aos empregados e empregadas com filhos ou criança sob guarda judicial até quatro anos de idade na alocação em vagas para atividades que possam ser efetuadas por meio do teletrabalho ou trabalho remoto.
Neste último ponto da Medida Provisória, cabe uma atenção tanto dos trabalhadores quanto das entidades representativas para que esta regra de prioridade não vire uma prática discriminatória dos empregados deficientes e que as empresas deixem de adotar medidas inclusivas aos seus funcionários. Mais do que empregados com deficiência, o trabalho possui a função social de inclusão das pessoas na sociedade, e o teletrabalho não pode ser utilizado como ferramenta de distanciamento destes profissionais.
*Vitor Monaquezi Fernandes é sócio do Crivelli Advogados Associados