Uma notícia chocou o mundo essa semana. O Zoológico do Bronx, em Nova Iorque (EUA), finalmente reconheceu que, há mais de cem anos, sequestrou e trancafiou um garoto africano na jaula dos macacos, e o exibiu ao público como se fosse um animal selvagem.
A história foi acobertada durante anos. Versões desencontradas foram ventiladas na mídia, até que o fato se tornou uma mera lenda urbana.
114 anos depois a verdade veio à tona.
Os Estados Unidos se veem forçados a fazerem uma revisão sobre a sua história, o capítulo que envolve os negros ainda é muito nebuloso, e há feridas abertas que continuam a sangrar.
A polícia segue matando e a Justiça comanda um calculado encarceramento em massa da população negra daquela país. Tirar a liberdade e negar direitos é uma forma de tratar o negro como um não cidadão, uma não-pessoa, um sub-humano.
E era isso o que representava o jovem Ota Benga, dentro daquela jaula, há mais de um século.
A ideia de associar o negro a um macaco é antiga e nasce com uma teoria eurocêntrica racista e desumana, a eugenia.
Os eugenistas trabalhavam com uma teoria pseudo científica de que os negros eram uma raça inferior, e fizeram proselitismo da ideia mundo afora.
O caso mais conhecido é o da sul-africana Sarah Baartman que, na primeira década do século XIX, era exibida ao público como uma aberração exótica, devido ao tamanho de suas nádegas e genitais.
Ficou conhecida como a Vênus Hotentote, porém, não era um objeto de arte, não era uma escultura, era exposta como uma criatura animalizada. Hotentote era como os europeus chamavam os khoikoi, povo ao qual Sarah pertencia.
Nem mesmo morta ela deixou de servir ao deleite do racismo científico. O cirurgião Georges Cuvier dissecou seu corpo e chegou à conclusão de que Baart tinha características semelhantes às do macaco.
Seus restos mortais foram exibidos no Museu Nacional Francês, em Paris, por 160 anos.
Na Europa, a partir do 1935 começaram a ser instalados os chamados “zoológicos humanos” – ou “exposições etnográficas”-, onde pessoas negras, indígenas e esquimós eram exibidas em cercadinhos, tal qual animais, e as pessoas brancas passavam a observá-las, tal qual se faz em um zoológico.
A história de Ota Benga, o congolês animalizado nos Estados Unidos, não é um caso isolado, mas era um caso escondido.
Em 1906 o jornal The New York Times falou sobre o assunto. A chamada da matéria dizia que um "selvagem divide jaula com os símios do zoológico do Bronx".
Nunca mais se falou do caso na grande mídia.
Foi Cristian Samper, presidente da Sociedade para Conservação da Vida Selvagem (WCS em inglês) quem fez o tardio, mas necessário, pedido de desculpas aos negros, em particular, e à sociedade estadunidense de uma forma geral.
E esse pedido de desculpas veio no momento em que a sociedade estadunidense se vê obrigada a falar sobre seu passado racista, para melhor compreender seu presente racista e evitar que o racismo se perpetue no futuro.
Samper justificou sua decisão afirmando é preciso "refletir sobre a própria história da WCS e sobre a continuidade do racismo" na instituição.
Ainda prometeu dar total transparência ao caso que foi acobertado por tantos anos.
A primeira exibição de Ota Benga, numa jaula, foi no dia 8 de setembro de 1906 e atraiu grande multidão de curiosos.
O garoto tinha 13 anos de idade. Só foi libertado por conta de uma revolta de sacerdotes cristãos. Ota foi liberto e levado para viver em um orfanato em Howard, em Nova Iorque, coordenado por um reverendo negro.
Deprimido, Benga se matou uma década depois.