Nutricionista promete cura do autismo com "terapia quântica" e causa revolta nas redes sociais

"Não existe nenhuma evidência científica séria dizendo que autismo pode ser revertido através de alimentação", afirma Andréa Werner, ativista pelos direitos das pessoas com deficiência

Reprodução/Twitter
Escrito en DIREITOS el

Ganhou repercussão nas redes sociais nesta segunda-feira (13) um vídeo de uma nutricionista que promete curar autismo, doenças crônicas e doenças autoimunes através da chamada "Nutrição Quântica". O método não possui respaldo dos conselhos especializados e é criticado por ativistas.

Kamila Melo, nutricionista com atuação em Fortaleza (CE) e Mossoró (RN) e com mais de 35 mil seguidores em uma de suas contas no Instagram, produziu um vídeo contando sua trajetória e prometendo curar "indo na raiz do problema.

"Em 2019 eu conheci a nutrição quântica que trabalha com terapias, que trabalha com o tratamento do causador do problema, a gente não cura sintomas, a gente vai buscar a cura verdadeiramente do paciente e com isso eu consigo hoje curar pessoas com depressão, autismo, com doenças crônicas, com doenças autoimunes. Com essa nutrição quântica eu procuro mesmo a cura", diz no vídeo.

Andréa Werner, jornalista, ativista pelos direitos das pessoas com deficiência e criadora do blog Lagarta Vira Pupa, foi uma das que rechaçou a declaração da nutricionista nas redes sociais. "Não existe nenhuma evidência científica séria dizendo que autismo pode ser revertido através de alimentação, muito menos qualquer coisa 'quântica'", disse à Fórum.

Equívocos

À Fórum, a nutricionista afirmou que deletou o vídeo após perceber "equívocos na fala"."A intenção era falar nos sintomas e não no autismo e outras doenças em si, como descrito no livro 'Curando os Sintomas Conhecidos como Autismo', de Kerri Rivera", declarou em nota.

"Sou mãe, trabalhadora, passível de erro como qualquer ser humano. Esse foi um deles, por isso mesmo, como disse, o vídeo foi apagado", disse. Questionada sobre o método de Terapia Quântica, Melo não respondeu.

Terapia Quântica

A "Terapia Quântica em nutrição clínica", segundo parecer técnico publicado pelo o Conselho Regional de Nutrição da 7ª região (AC, AM, AP, PA, RO e RR) em maio de 2019, contraria o "Referência Nacional de Procedimentos Nutricionais do Sistema CFN/CRN" e a Lei Federal nº 8.234/91 que regulamenta a profissão do nutricionista.

A Fórum entrou em contato com o Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) e o Conselho Regional de Nutricionistas da 6ª Região - AL, CE, MA, PB, PE, PI e RN -, onde Melo está registrada, questionando a Terapia Quântica e as declarações feitas no vídeo. A assessoria do CFN afirmou que irá repassar o questionamento para Unidade Técnica, mas adiantou que a nutrição quântica "não é uma especialidade da Nutrição".

Cura para o autismo?

Werner afirma que essa não é a primeira vez que nutricionistas afirmam ter a "cura para o autismo". "Existe uma nutricionista muito famosa, e que cobra uns 800 a consulta, que fala coisas relativas a 'reverter autismo com alimentação' e também demonstra apoiar o MMS [em português, Solução Mineral Mestre]", afirmou.

O MMS, dióxido de cloro, é proibido no Brasil desde 2018 conforme resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas segue sendo pregado contra a condição do autismo.

A Anvisa aforma que "o produto, na verdade, é uma substância utilizada na formulação de produtos de limpeza, como alvejantes e tratamento de água. O dióxido de cloro não tem aprovação como medicamento em nenhum lugar do mundo. A sua ingestão traz riscos imediatos e a longo prazo para os pacientes, principalmente às crianças".

Segundo a Werner, a substância é um alvejante que faz as crianças expelirem muco e revestimento intestinal e acaba passando a falsa ideia de que o autismo é provocado por vermes. "Pais dão MMS (dióxido de cloro diluído) para os filhos autistas via enema, pelo ânus. Afinal, alvejante tem gosto ruim. Pais acham que são vermes, 'os verdadeiros causadores do autismo' segundo os charlatães que vendem o MMS", diz.

O livro de Kerri Rivera citado na nota de Kamila Melo, inclusive, é apontado como um dos responsáveis por disseminar a substância e já foi alvo de um vídeo de Werner, no ano passado (assista no final da matéria). Esse livro já foi alvo de campanha que pedia a sua remoção das livrarias por estimular o MMS.

Assista ao vídeo que causou polêmica:

https://twitter.com/bibibailas/status/1282538122165669888

Assista ao vídeo de Werner sobre o MMS:

https://www.youtube.com/watch?v=LBuwGpOVjHc&feature=youtu.be

Confira a nota de Karolina Melo na íntegra:

"Sobre o vídeo postado no Twitter por uma pessoa que não conseguiu esse vídeo de mim, gostaria de esclarecer algumas coisas:

01 - Esse vídeo foi deletado do meu Instagram logo após a publicação exatamente por ter percebido que ele continha equívocos na minha fala.

02 - A intenção era falar nos sintomas e não no autismo e outras doenças em si, como descrito no livro "Curando os Sintomas Conhecidos como Autismo", de Kerri Rivera.

03- Sou mãe, trabalhadora, passível de erro como qualquer ser humano. Esse foi um deles, por isso mesmo, como disse, o vídeo foi apagado.

04 - Peço desculpas a todos e a qualquer um que se sinta atingido pelo conteúdo, mas, repito, ele não está mais disponível e não tem minha autorização e aval para ser veiculado em lugar algum.

Mais uma vez, peço desculpas a todos."