Apesar de o tempo gasto com afazeres domésticos no Brasil variar segundo fatores como ocupação, renda e tamanho da família, mulheres dispendem muito mais tempo em casa do que os homens.
Por Redação
Ainda que tenha se integrado ao mercado de trabalho formal, a mulher continua sendo a principal responsável pelo trabalho doméstico no Brasil. É o que demonstra estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), hoje (23), a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Segundo o comunicado, “trata-se de uma configuração presente na maior parte dos países e que reproduz e reforça as desigualdades existentes entre mulheres e homens, uma vez que tem repercussões diretas e indiretas sobre as possibilidades e formas de inserção nas outras esferas da vida social e econômica”.
Apesar de o tempo gasto com atividades domésticas variar segundo fatores como ocupação, nível de renda, tamanho da família, as mulheres dispendem muito mais tempo em afazeres domésticos do que os homens. As mulheres responderam ocupar, em média, 26,6 horas semanais realizando afazeres domésticos em 2009; já os homens destinavam um tempo bem menor, 10,5 horas. Os recortes de cor/raça, grande região e urbano/rural não aparecem, numa primeira análise, como importantes nesta diferenciação.
“Pode-se concluir que, de fato, são atividades muito fortemente atribuídas às mulheres. Assim, não importa se a mulher tem uma alta renda, se é considerada chefe de família, se está ocupada; ela sempre gastará mais tempo com afazeres domésticos que os homens nas mesmas posições. E – o que é ainda mais revelador – ela gastará mais tempo com afazeres domésticos do que os homens na posição 'oposta”, revela o estudo. A pesquisa mostra, por exemplo, que mulheres e homens que estão fora do mercado formal de trabalho gastam mais tempo com atividades em casa do que os ocupados. Mesmo assim, as mulheres ocupadas consomem quase 10 horas a mais de trabalho em casa do que os homens desocupados.
Quanto ao nível de renda, a pesquisa aponta que mulheres que recebem 8 salários mínimos ou mais gastam cerca de metade do tempo daquelas que ganham até 1 salário mínimo, mas ainda trabalham mais em casa do que os homens nesta faixa de renda menor.
Desde pequenas
Os dados também apontam que os diferenciais no uso do tempo se estabelecem desde a infância. Crianças e adolescentes de 10 a 15 anos de idade gastam, em média, 20 horas por semana com afazeres domésticos, mas a diferença entre gêneros nessa faixa já gritante: enquanto os meninos despendem 10 horas semanais, as meninas gastam 25 horas. Entre os meninos nessa faixa etária, 49% afirmaram realizar afazeres domésticos, sendo que 88% das meninas desenvolviam esse trabalho. “Trata-se, portanto, mais uma vez, das tradicionais convenções de gênero, que desde muito cedo vão se reproduzindo na socialização das crianças, gerando impactos na forma como meninos e meninas se percebem, se colocam na sociedade e gastam seu tempo”, aponta o comunicado do Ipea.
A forma como o tempo é usado de acordo com o gênero representa um importante limite para a inserção feminina no mercado de trabalho. “Se o dia tem 24 horas para todas as pessoas, torna-se muito difícil para as mulheres ampliarem a contento sua jornada de trabalho remunerada se continuarem se dedicando ao trabalho não remunerado como hoje o fazem”, diz o comunicado. Para reverter esse quadro, é necessário que o poder público atente para a questão e combata a desigualdade de gênero existente dentro das famílias e que se reproduz como desigualdade estruturante da sociedade brasileira. “A experiência internacional mostra que, para que haja avanços na redução da desigualdade, é preciso a implementação de políticas de fato voltadas para a autonomia das mulheres e para o incentivo à participação masculina no trabalho doméstico. Essas políticas devem envolver as empresas e as famílias, além dos serviços públicos”, conclui o documento.