A Revisão da Vida Toda é, acima de tudo, uma tentativa de reparação. Ela permite que aposentados e pensionistas do INSS utilizem todas as contribuições feitas ao longo da vida, inclusive aquelas anteriores a julho de 1994, no cálculo de seus benefícios. Parece justo, não? Afinal, por que ignorar anos — às vezes décadas — de trabalho duro, de salários honestamente recebidos, de esforço contribuído mês a mês ao sistema previdenciário?
Em dezembro de 2022, o Supremo Tribunal Federal reconheceu esse direito. Foi uma vitória histórica. Por 6 votos a 5, a Corte decidiu que o segurado tem o direito de escolher a regra mais vantajosa. Não era uma benesse, era justiça. Mas, agora, esse direito está por um fio.
Na próxima quinta-feira (10 de abril), o STF julgará, em plenário presencial, os embargos dos embargos de declaração — uma manobra jurídica que, na prática, pode reabrir o mérito de uma decisão que já foi transitada em julgado. E o risco é claro: mudar o que já foi decidido, rasgar a confiança no Judiciário e, pior, retirar direitos de quem já os conquistou legitimamente.
O argumento do governo para essa virada é, além de cruel, mentiroso. Estimou-se inicialmente um impacto financeiro de 480 bilhões de reais com a Revisão da Vida Toda — uma cifra inflada e irresponsável, que serviu apenas para alimentar o pânico e justificar o retrocesso. A realidade, revelada com dados técnicos, é outra: o custo real da RVT é de apenas 3,1 bilhões de reais em 10 anos. Sim, três bilhões, não quatrocentos e oitenta.
Diante disso, qualquer tentativa de mudar o entendimento do STF sem modulação dos efeitos é um atentado à segurança jurídica. A modulação é o mínimo. O mínimo! Ela garante que quem já teve seu direito reconhecido continue protegido. Que as decisões judiciais não sejam apenas promessas frágeis ao sabor de ventos políticos. Que a palavra da Justiça valha mais do que o oportunismo.
O STF não pode permitir que aposentados sejam vítimas de mais esse golpe. São homens e mulheres que trabalharam, contribuíram e sustentaram este país. Muitos já partiram esperando por essa reparação. Outros ainda vivem a esperança de um alívio no fim da vida. Esperança essa que agora está ameaçada por um cálculo errado e por uma conta que não fecha — moralmente, juridicamente, humanamente.
A Revisão da Vida Toda não é apenas uma tese jurídica. É a luta de uma geração por respeito. Que o Supremo esteja à altura dessa responsabilidade.
*Fernando Castilho é professor e escritor.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.