Ontem, véspera do 8 de março, nos despedimos de Gleisi Hoffman da Presidência do PT. A primeira mulher, nos nossos 45 anos de história, a ocupar a Presidência do Partido das Trabalhadoras e dos Trabalhadores o fez de forma marcante, decisiva e corajosa. Quero usar a data de hoje, dia de luta das mulheres para homenageá-la.
Após o golpe contra a Presidenta Dilma vivíamos um dos momentos mais difíceis da nossa história marcado por perseguição, law fare e injustiça. Dilma não havia cometido crime de responsabilidade, mas foi vítima de um golpe fruto de uma articulação legislativa, política e jurídica diante de uma combinação de uma série de interesses - nenhum deles coletivo ou sobre nosso país.
Na conjuntura internacional combinava-se uma ascensão neofascista, o interesse do capital financeiro sobre o pré-sal do Brasil e a desconfiança com a organização crescente dos BRICS. Na conjuntura nacional, a Lava Jato, que covardemente e com mentiras, agora já comprovadas, perseguia o PT e Lula, atuava livremente com amplo apoio da grande mídia e do capital financeiro.
É importante ressaltar que tantos ataques ao Governo Dilma também foram marcados por misoginia e machismo, inclusive de parte da esquerda. Percebam que a maior parte dos países da América Latina tem em sua história ocorrência de golpes militares e políticos, mas no caso de Dilma, uma narrativa quase naturalizada era que o golpe não ocorreu fruto do contexto geopolítico, mas porque suas características pessoais não eram de uma boa articuladora política.
É diante desse duríssimo contexto de perseguições que Gleisi assumiu a Presidência do PT. Estávamos diante do que chamo de uma encruzilhada histórica. Como resistir? Como enfrentar a prisão injusta de Lula, nosso maior líder que liderava as pesquisas para a Presidência da República? Gleisi não titubeou: com luta.
O que hoje parece natural e defendido por todos, naquele contexto não era, lembro-me bem. Nos bastidores e corredores falava-se em “tentar acordos” e “diminuir o enfrentamento público”. É justamente diante de tantas incertezas que forjam-se os grandes (nesse caso a grande) líderes. Gleisi conduziu nosso partido, no momento mais difícil da nossa história, com coragem e convicção ideológica. Quem esperava silêncio, abandono e medo assistiu o contrário acontecer. Montou-se uma vigília dos movimentos sociais acampados em Curitiba que dava “bom dia”, “boa tarde” e “boa noite” ao Presidente Lula, porque ele não estava sozinho. Milhares de Comitês Lula Livre foram construídos em todo Brasil. Lula recebia líderes da política, religiosos e artistas mostrando sua grandeza para o mundo.
Cabe aqui um relato pessoal de quem assistiu de perto a forma de Gleisi conduzir a Presidência do PT: sabendo ouvir, tendo paciência para lidar com os grandes e os pequenos problemas, presente nas lutas cotidianas, caminhando ao lado dos movimentos sociais, valorizando as mulheres e a juventude e fortalecendo o que temos de mais importante e precioso: a força da nossa militância.
Não tenho dúvidas que a soltura e a eleição de Lula nascem dessa condução assertiva e corajosa de Gleisi e ela é, portanto, parte fundamental da derrota de Bolsonaro e do neofascismo no Brasil.
Agora, estamos diante de mais uma encruzilhada histórica. Faltam menos de dois anos para as eleições nacionais e novamente Gleisi será figura fundamental para a história do Brasil. Ela será a responsável pela articulação política de um governo que precisa avançar cada vez mais e inaugurar um novo período: de mais entregas, mais identidade com o programa eleito nas urnas e mais unidade política.
Como é comum na trajetória das mulheres na política, ser questionada por suas ações e capacidade é quase cotidiano. “Como uma mulher tão aguerrida poderá comandar um Ministério que exige jogo de cintura?”, eles dizem. Nós dizemos que quem foi capaz de comandar o maior partido de esquerda da América Latina no momento mais difícil da nossa história até a Presidência da República, não deveria ter sua capacidade política questionada. Dizemos também que características como identidade programática e lealdade devem ser cada vez mais valorizadas na política. Ou se esqueceram que um marco do processo de golpe contra Dilma foi a entrega da articulação política para Michel Temer?
Que Gleisi cale os críticos e duvidosos como fez ao longo de sua trajetória mostrando que, mais uma vez, as mulheres de habilidade política tem força, tem capacidade e podem ser as pessoas certas para espaços decisivos sempre. E eu não tenho dúvida que mais uma vez, ela o fará.
*Camila Moreno é membro da Direção Executiva Nacional do PT
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum