A capacidade técnica e dos profissionais da Globo são inquestionáveis.
Mas a posição política da emissora é, sim, completamente questionável.
Ontem, William Bonner divulgava vídeo anunciando que estava de partida para Canoas/RS de onde iria ancorar o Jornal Nacional.
À noite, o JN inicia e William Bonner aparece de camiseta e num local de onde era possível ver as águas do RS.
Faz uma longa cobertura sobre a tragédia gaúcha.
Abre espaço para Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, falar. Não questiona o mandatário gaúcho sobre suas omissões quanto a ações de prevenção. Outras pessoas aparecem dando depoimentos.
As ações do governo federal no combate ao desastre somam R$ 1,5 bilhão. Além disso, serão liberados cerca de R$ 1 bilhão em emendas parlamentares. O presidente Lula foi ao Rio Grande do Sul já em duas oportunidades nesta tragédia. Na segunda vez, articulou com outros poderes e levou o presidente da Câmara, Arthur Lira, do senado Rodrigo Pacheco, e o ministro Edson Fachin representando o STF. Mas isso não foi destaque no Jornal Nacional. Falaram sobre o governo federal de forma an passant.
Sobre as ações de solidariedade do MST que distribui, diariamente, a partir de sua cozinha solidaria, milhares de quentinhas, nenhuma palavra. Mas a dócil Central Única das Favelas, está toda hora no JN.
Por fim, é sabido por todos que as mudanças climáticas que ocorrem no mundo e no RS não são manifestações espontâneas da natureza. Não são acidentais. São resultantes da ação humana. É a exploração desenfreada dos solos urbano (especulação imobiliária) e rural (agronegócio) que desencadeia manifestações assim da natureza.
Mas como a Globo vai responsabilizar o agronegócio se, no campo privado, é seu maior patrocinador?
Por fim, a ida de Bonner a Canoas visou recolocar a Globo nos trilhos da cobertura jornalística. No sábado, dia do show de Madonna no Rio de Janeiro, já com o Rio Grande do Sul debaixo d´água, o JN foi apresentado por Hélter Duarte e Ana Paula Araújo que finalizaram aquela edição com risos, devido a uma reportagem sobre o show de Madonna. Internamente, a emissora reconheceu a necessidade de encerrar o JN de forma mais sóbria.
No domingo, mais Madonna do que RS. No Fantástico, apresentado por Maju Coutinho e Poliana Abritta, apenas 25 minutos foram dedicados às enchentes no Rio Grande do Sul, enquanto as pautas relacionadas à artista pop ocuparam 33 minutos no ar.
Pronto! Bonner no RS, nada das ações de Lula e MST, não questionamento a Eduardo Leite, obsequioso silêncio quanto a responsabilidade do agronegócio, tom de voz e semblante sério! Tudo normal de novo na Globo.
*Oscar de Barros é editor do site Pensar Piauí.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.