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Marta Suplicy, reconciliação e democracia partidária – Por Mateus Muradas

Neste início de 2024, Lula, nesta costura do retorno de Marta Suplicy ao PT, busca exatamente isso, a reconciliação. Contudo, está faltando arrependimento

Créditos: Gervásio Baptista/ Agência Brasil
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Passado o calor inicial do retorno de Marta ao PT e sua suposta indicação a vice, é necessário refletir seriamente sobre isso. A reconciliação é uma decisão que se toma com o coração, é aquilo que renova e faz renascer a harmonia pelo bem comum. Em várias religiões e culturas se reconciliar, é algo nobre. Diferente do esquecimento, do apagamento e do "deixa pra lá", reconciliar-se exige um dos atos mais potentes de humildade, que é o arrependimento. Na política não é diferente!

Neste início de 2024, Lula, nesta costura do retorno de Marta Suplicy ao PT, busca exatamente isso, a reconciliação. Contudo, está faltando arrependimento, para realmente sacramentar este ato. Seria este movimento, apenas um arranjo com fins eleitorais, ou algo realmente significativo? Reconciliação exige arrependimento de ambas as partes.

Não é segredo para ninguém, que Marta Suplicy, se desfiliou do PT em 2015, apoiando a Lava Jato, saudando Janaína Paschoal, votando no impeachment de Dilma e depois se aliando a Doria, Covas e Ricardo Nunes. A pergunta é, ela se arrepende, deste período? Em sua carta de desfiliação do PT, em 28 de abril de 2015, citou os escândalos de corrupção e o fato de ter sido escanteada.

Naquele momento a onda antipetista era enorme, e Marta estava machucada por ter sido seguidamente escanteada pelo partido e pelo governo. A saída de Marta, não representou apenas uma traição, foi além, pois representava o afastamento do próprio PT de diversos setores da sociedade, especialmente as classes médias. A falta de diálogo do PT, com movimentos sociais durante o governo Dilma, também era algo a se notar desta época. O resto a história já conta, manifestações massivas, impeachment de Dilma, prisão de Lula, Temer, Moro, Bolsonaro, pandemia, pandemônio e por fim, o desastroso 8 de janeiro de 2023. Há um trecho em especial na carta de desfiliação de Marta que merece ser evocado nos tempos atuais, que é o seguinte:

"...Ao tentar empenhar-me numa linha de providências, fui isolada e estigmatizada pela direção do partido. Percebi que o Partido dos Trabalhadores não possui mais abertura nem espaço para o diálogo com suas bases e seus filiados dando mostras reiteradas de que não está interessado, ou não tem condições, de resgatar o programa para o qual foi criado, nem tampouco recompor os princípios perdidos..."

Esse grito de Marta em sua saída, ecoa até os dias de hoje. O Partido dos Trabalhadores por ser um partido enorme, e ter a maior liderança da esquerda mundial, ainda tem dificuldades de construir seu diálogo interno. Pela magnitude de Lula, uma costura como essa com Marta, abafa o debate interno, diminui o papel da militância e dos movimentos sociais na construção política e eleitoral.

É fato, que a executiva municipal do PT, liderada por Laércio Ribeiro presidente municipal do PT, o diretório municipal, os zonais e setoriais, tem feito um trabalho relevante, de formação, debate e construção programática do partido, isso não pode parar, com o retorno de Marta. Temos que avançar! O debate sobre vice de Boulos, tem sido rico, diversos pré-candidatos colocaram seus nomes, e havia um clamor pela indicação de uma mulher para vice. No Congresso partidário de 2023, foi decidido que seriam feitas prévias para indicação. Como fica isso com o retorno de Marta Suplicy?

Para que este retorno de Marta, não seja, só um mero arranjo eleitoral, goela abaixo da militância, é fundamental, que este retorno, seja assimilado pelo partido, a partir de Eleições Prévias amplas. Para ter coerência, é necessário resgatar este próprio clamor de Marta Suplicy de 2015, para que o PT, seja um partido radicalmente democrático, escute suas bases e respeite sua militância.

Nas últimas eleições municipais, houve uma eleição interna indireta no PT, para escolha de Jilmar Tatto, que abafou o debate interno. Desculpas de que houve uma pandemia e isso impediria a democracia interna, não convenceram parte da militância, que equivocadamente, deixou de apoiar a indicação final do Partido. Não podemos novamente, cometer este equívoco!

              

O arrependimento de Marta estaria representado num amplo debate interno do partido, uma avaliação profunda e sincera sobre nosso futuro político. Idem para o próprio PT, radicalizar sua democracia interna é a tarefa central de renovação do PT hoje. Realizar eleições prévias amplas para escolha de vice-prefeita, sinaliza para militância, e para toda sociedade que o PT é o partido da DEMOCRACIA e não dos acordos, não da política de gabinetes. Foi a falta de democracia interna, a falta de respeito com a militância que enfraqueceram o partido, e levaram as tentativas de golpe. Porque repetir os erros, de acordos de cúpula, de minar e diminuir o debate interno com os militantes?

Que Marta venha a ser escolhida, num debate interno, mas que seja uma construção politizadora. Essa tal “real politik”, esse tal pragmatismo absoluto, embrionou Michel Temer, Sergio Moro, Cunha e o próprio Bolsonaro. Não aprendemos nada com tudo isso? Vamos mais uma vez chocar os ovos da serpente, ou estamos dispostos a avançar? Marta sinaliza que sim, quer limpar sua própria história, corrigir essa macula dos últimos anos. Não é uma chance, de também sinalizar para toda sociedade, essa reconciliação? Prévias e democracia interna, é o caminho!

É necessário se arrepender, só assim teremos uma verdadeira reconciliação, do contrário, caminhamos rápido de volta ao precipício do pragmatismo, que embrionou o Bolsonarismo. Caminho sem retorno! É necessário radicalizar a democracia, com prévias amplas, e debatidas em todos os territórios da cidade, a reconstrução não pode parar, a luta não pode parar. Essa é a resposta que o Partido dos Trabalhadores precisa dar para o país, neste retorno de Marta:

Democracia, democracia e democracia!

* Mateus Muradas é poeta, integrante do Fórum Social da Zona Leste e conselheiro municipal de políticas urbanas.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.