A recente instauração de processos disciplinares contra nós no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados expõe um grave cenário de violência política de gênero. Somos seis mulheres feministas de esquerda: Célia Xakriabá (PSOL/MG), Erika Kokay (PT/DF), Fernanda Melchionna (PSOL/RS), Juliana Cardoso (PT/SP), Sâmia Bomfim (PSOL/SP) e Talíria Petrone (PSOL/RJ). O Partido Liberal (PL), do ex-presidente Bolsonaro, quer cassar nossos mandatos porque protestamos contrariamente à aprovação do Projeto de Lei 490/2007, o Marco Temporal, que limita o reconhecimento dos territórios indígenas. Os bolsonaristas querem nos intimidar e cercear o exercício da atividade parlamentar. Estamos diante de um ataque à própria democracia.
A rapidez com que as ações foram remetidas ao Conselho de Ética revela a seletividade no tratamento dos casos. Enquanto as representações contra nós foram aceitas em tempo recorde, os pedidos de análise da conduta de bolsonaristas envolvidos nos atentados criminosos de 8 de janeiro seguem engavetados pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP). Lira defendeu publicamente a aplicação de penas, ignorando as etapas dos processos e o fato de que ele mesmo não é integrante do Conselho de Ética. A representação original, feita pelo PL, sequer individualizava os casos, o que é ilegal e revela um intuito persecutório.
Lamentavelmente, a violência política de gênero está espraiada pelo Brasil. Além da Câmara dos Deputados, em Câmaras Municipais e Assembleias Legislativas multiplicam-se casos de ameaças, xingamentos e tentativas de intimidação de mulheres eleitas. Recentemente, o Ministério Público Federal encaminhou à Procuradoria Geral da República representação para investigar as interrupções machistas contra a deputada Sâmia Bomfim na CPI do MST.
O patriarcado e as oligarquias políticas não aceitam o protagonismo feminino. Mas não nos intimidam.
Em 2021, aprovamos a Lei 14192/21, que estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher. A Vice Procuradoria Geral Eleitoral do MPF, por meio do Grupo de Trabalho de Violência Política de Gênero, já identificou mais de 120 casos de violência política de gênero no Brasil. O enfrentamento desse cenário é uma obrigação da Câmara dos Deputados, das instituições do Estado e de todos os cidadãos.
Lutamos para que o machismo e a misoginia sejam banidos dos espaços de poder e da sociedade. A luta das mulheres e o feminismo estão se fortalecendo. Estamos na linha de frente da luta pelos direitos, pela democracia e contra a extrema-direita. Denunciamos a tentativa de cassação dos nossos mandatos e não mediremos esforços na mobilização contra esse ataque sem precedentes.
Temos orgulho de ter votado contra o Marco Temporal e de construir mandatos combativos e feministas, que incomodam os bolsonaristas e machistas. Em 2022, recebemos juntas quase 1 milhão de votos. Sabemos que não estamos sozinhas e não daremos um passo atrás.
*Célia Xakriabá (PSOL/MG), Erika Kokay (PT/DF), Fernanda Melchionna (PSOL/RS), Juliana Cardoso (PT/SP), Sâmia Bomfim (PSOL/SP) e Talíria Petrone (PSOL/RJ)
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