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55 anos da "sexta-feira sangrenta", quando a ditadura matou 28 jovens no Rio – Por Everton Gomes

Naqueles tempos de presidentes, governadores e prefeitos biônicos, até as formas mais elementares de participação política foram silenciadas

Everton Gomes, cientista político e secretário municipal de Trabalho e Renda do Rio de Janeiro.Créditos: Governo do Rio de Janeiro
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Há exatos 55 anos, em 21 de junho de 1968, a repressão a um protesto estudantil no Rio de Janeiro resultou em 28 mortes de inocentes, segundo levantamento do Centro de Documentação de História Contemporânea da Fundação Getúlio Vargas. Foram mais de mil prisões, em um dos momentos de maior brutalidade da ditadura militar, e uma antessala do endurecimento do regime que viria no final daquele mesmo ano, com a entrada em vigor do AI-5.

Estudantes presos no campo do Botafogo, na véspera da Sexta-Feira Sangrenta (Memorial da Democracia)

Os jovens que se manifestavam contra o arbítrio protestavam contra a prisão ilegal do líder estudantil Jean Marc von der Weid, por participar de uma passeata, e também contra a repressão a uma plenária ocorrida na véspera, no Teatro de Arena da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRJ, onde a pauta dos jovens, em reunião com o reitor e o Conselho Universitário da Federal era o “subversivo” tema do futuro do ensino superior em nosso país. Em tempos de ditadura, com o descaramento de um regime que, a cada dia, mostrava as suas garras, debater os temas de interesse do país e de nossa sociedade era proibido. Apenas cabia a obediência a um governo plutocrático, comandado por interesses internacionais e verdadeiramente subversivo, pois se dedicava a modificar a construção democrática da cidadania no Brasil inaugurada em 1930 e materializada nas Reformas de Base propostas pelo presidente João Goulart, verdadeira razão de ser da mobilização das elites econômicas brasileiras em prol da instauração de um regime de exceção.

A democracia é um valor soberano. Não há cidadania plena sem instituições democráticas, sujeitas à escolha manifesta da coletividade expressa por intermédio do voto. Naqueles tempos de presidentes, governadores e prefeitos biônicos, até as formas mais elementares de participação política foram silenciadas. Liberdades individuais, solapadas. E direitos sociais, ameaçados. Quem viveu a época se recorda da epidemia de meningite dos anos 1970, empurrada para baixo do tapete pela ditadura, com milhares de crianças mortas. Qualquer semelhança com omissões diante de epidemias contemporâneas não é mera coincidência.

Sem deixar de lado a necessidade de responsabilizar perante a opinião pública os remanescentes dos anos de arbítrio, impunemente com as mãos sujas de sangue há meio século, é preciso confrontar aqueles a quem Leonel Brizola, meu líder e inspirador, classificava como “filhotes da ditadura”. Os que ensejaram subverter as gloriosas fardas do Exército Brasileiro, da Marinha do Brasil e da Força Aérea Brasileira, desejando transformar tais instituições em “puxadinhos” eleitoreiros, ainda estão no cenário político nacional, à espreita de uma oportunidade para prejudicar nossa soberania, nossa democracia e nossos direitos cidadãos. Fica uma lição permanente: confrontar os inimigos da democracia, com o mesmo vigor dos nossos antepassados. Democracia se constrói a cada dia para gerarmos trabalho e renda para nossas famílias. Minha homenagem aos que tombaram, vítimas da repressão, naquele 21 de junho de 1968.

*Everton Gomes é cientista político e secretário municipal de Trabalho e Renda do Rio de Janeiro

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.