CULTURA RUSSA

Putin perde a faixa preta mas Europa leva ippon

Nos telejornais os apresentadores vibravam com os gatos russos, agora banidos das competições internacionais e também de serem registrados nos livros de pedigrees, sob ordem da Federação Internacional de Felinos

Putin perde a faixa preta mas Europa leva ippon.Créditos: Mikhail Klimentyev/TASS
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Alô Janaína querida, espero que tudo esteja bem, apesar dessa guerra.  Guerra de informações. E você não vai acreditar, estive dormindo desde o dia 24 de fevereiro e sonhei que éramos bombardeados. Sim, por verdadeiras “blitzkrieg” de bobagens onde a Rússia era punida por toda chaga planetária. 

Olha as “besterências”, como diria nosso saudoso amigo e jornalista, Angelo Pires: Nos telejornais os apresentadores vibravam com os gatos russos, agora banidos das competições internacionais e também de serem registrados nos livros de pedigrees, sob ordem da Federação Internacional de Felinos. E lá das entranhas do meu estado onírico refletí: "Ah, esses russianos, toda a vida vendendo gato por lebre e ninguém tinha miado, digo, chiado até agora”?

 Continuando na televisão, noticiaristas exultavam uma Rússia banida de diversas atividades esportivas do planeta. Friamente foi expulsa da paraolimpíada dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim. Ôpa, de lá do meu sono REM, vem uma voz sussurrando: "Que mancada, diriam os engraçadinhos. Mas não tem graça ser arrastado de uma competição só porque o Comitê Olímpico Internacional escutou apenas os tiros dos canhões em detrimento do estampido das espoletas esportivas".

 E seguem os tele-apresentadores, disfarçando sua alegria, ao informar uma bateria de esportes mundiais onde os atletas russos levaram cartão vermelho. Copa do Mundo de futebol 2022, Fórmula 1, vôlei, tênis -do campeão Medvedev-, atletismo, badminton, curling, canoagem, esqui, patinação, triatlon e outros. E, de novo, das profundezas do meu inconsciente brotava: "Estão trocando as medalhas, os troféus, os louros da competição desportiva, por condecorações militares. Perderam a esportiva". 

Nas páginas dos moribundos jornais impressos leio que as áreas cultural e de entretenimento também foram metralhadas por insanidades. Jogaram sabão no palco do Bolshoi cancelando assim apresentações desta prestigiada instituição pelo mundo. E do meu devaneio do sono matutei: “Dançamos nós todos. Por arte de uns tolos perdemos o magnifico balé”. 

 Na sequência informam duas explosões de asnice. Uma, que recolheram a batuta régia do maestro Valery Gergiev, demitido do Carnegie Hall, de Nova York, do La Scala, de Milão, da Filarmônica de Munique, entre outros locais de concerto do planeta. E, outra, a maior soprano da atualidade, Anna Netrebko, foi proibida de regozijar a nossa alma, nos palcos do Metropolitan Opera House, da mesma Nova York. Imediatamente do meu estado de subconsciência ponderei: “Dose dupla de vigarismo contra eles. Seus patrões subiram de tom na baixaria, ao exigir do regente que botasse a boca no trombone e da cantora que desafinasse contra o Chefe do Executivo da Rússia”.

 Seguindo pelas linhas no papel, fico sabendo que os punks roqueiros da banda gringa, Green Day, cancelaram sua apresentação em Moscou. “Pois é”, ‘ainda me matutando,’ são mesmo uns farsantes. Se fossem realmente punks, aí sim, iriam tocar, xingar e cuspir ao vivo na cara dos russos”. E na chamada sétima arte a ação ficou fora de foco. Organizadores dos Festivais de Cannes, na França, do Porto, em Portugal, de Glasgow, na Escócia, queimaram o filme da terra de Eisenstein. E até aqui em Sumpaulo, o Cine Sesc, tradicional promotora de qualificada cinematografia para toda população, suspendeu uma mostra do cinema soviético e russo. Daí, caindo da cama, a memória me revelou um caso do genial Stanislaw Ponte Preta, no seu FEBEAPÁ (Festival de Besteira que Assola o País). Aliás, se fosse hoje, facilmente teria o nome de FEBEAPÁA – Festival de Besteira que Assola os Países Americanizados. Ele contou no seu "Tsar subversivo”, escrito lá pelo ano de 1966, como sefosse agora:- O célebre filme de Serguei Eisenstein — Ivan, o terrível –, que seria exibido pela primeira vez em Belém do Pará, durante um festival de cinema russo, teve sua exibição proibida pelo secretário de Educação. Segundo o distinto, a ordem veio “de escalões superiores (?), preocupados com o credo vermelho do festival”. Portanto, nessa altura, deixava de ser festival cinematográfico e virava festival de besteira, porque a Revolução Russa ocorreu em 1917, enquanto o biografado Ivan (ou Ivã, se preferem) morreu em 1584. Entre sua época e a época do comunismo, vai uma diferença de trezentos e trinta e três anos e seria muito difícil Ivan estar metido nisso, por mais terrível que ele fosse. Deslocando para internet um pesado canhoneio de tolices tenta me despertar. Veja só, o ramo literário também não ficou para trás na falta de educação letrada. Cancelaram um curso sobre Dostoiévski, na universidade de Milão-Bicoca, na Itália, por causa da nacionalidade do admirável escritor. 

E das entranhas do meu catatonismo ainda consigo ler algo razoável de Paolo Nori, professor da mesma Bicoca, inconformado e sagaz contra tamanha bobagem: “Hoje, ser um russo vivo é motivo de culpa na Itália, e morto, também". Sem trégua, do mundo cibernético surgem mais outras indigestas bestices. O estrogonofe foi banido do cardápio pelo mestre cuca do restaurante paulistano, Bar da Dona Onça. Mas depois de críticas e protestos a cozinheira chefe reestabeleceu ao cardápio o inocente prato russiano. Seu argumento inicial foi, ao tentar estragar o estrogonofe, “um ato político”, porém, a seu contragosto, foi revertido no ato de apetite e fiel paladar dos fregueses.

Nesse mesmo engasgo sou informado que o hotel potiguar, Praia BonitaResort, parou de vender vodca a seus hóspedes, anunciando um “boicote internacional à Rússia após invasão à Ucrânia”. E, subindo mais ao norte, contam que nos EUA suspenderam totalmente a venda da bebida das taigas e tundras pelo mesmo motivo do hotel brasileiro. Como estou embriagado de sono, arrisco dizer que em breve uma ressaca acometerá o patrimônio líquido dos bebedores e distribuidores do destilado cossaco. Como diz a própria representante do Conselho de Destilados dos EUA (nem sabia que existia um conselho desse), Lisa Hawkins, a importação de vodca russa representou apenas 1,3% do volume total deste comércio. E não sendo um gênio da economia alcoólica é possível de prever um preço exorbitante a pagar pela escassez de uma dose original dessa “aguinha” que passarinho não bebe. 

 Uma revoada de tiros contra a censura à imprensa na Rússia é manchete geral nos veículos livres, independentes e defensores da liberdade de expressão do mundo. Eles caem de pau, sem dó, contra o maldito mandachuva russo e sua equipe de malfeitores da humanidade que perseguem e calam a imprensa em seu próprio país. Agora, esfregando os meus olhos desatinados, fico sem entender e me faço uma pergunta: “Mas cadê desses mesmos lutadores não se expressarem nada quando suspenderam os canais Sputinik e Russia Today da União Europeia, dos EUA e também daqui? Sem contar da agência Tass, excluída da Aliança Europeia de Agência de Notícias. Silêncio ensurdecedor”.

E agora, finalmente já desperto, preguiçosamente respiro aliviado por tudo isso ter sido um sonho e tanto. Ufa! Como? Eu não sonhei, Janaina? O que? Um restinho de salada russa e garrafas vazias de vodca comprovam que estive acordado todo o tempo ? Caramba, como esses caras sabem envenenar os inimigos!

 Desta vez, ainda tonto de tanta parvoíce, escuto no rádio de um entusiasmado locutor que a Federação Internacional e a União Européia de Judô, mais o Comitê Olímpico Internacional retiraram a faixa preta doatleta Vladimir Putin. E, mais, o destituíram como presidente de honra e embaixador dessas entidades todas. Hum, agora plenamente de pé, especulei: “Ué, se Putin levou um golpe dos seus, até então, bajuladores, por que é que os seus adversários, o Zé Lelésnky e seus financiadores tomaram um ippon? E ainda chamam essa luta de ‘Caminho da Suavidade’. Não é possível tanta animação do radialista. Ou, ele e seus editores, não leram o esclarecedor artigo Russia's judo kick to the western financial gut , do analista geopolítico, Pepe Escobar,explicando claramente que as sanções contra a Rússia atingirão toda a Europa; ou acreditam que não exista golpe de efeito bumerangue nesse combate”.

 Urgente: Me avisa e alerta a querida Janaina: Mc Donalds, Coca-Cola e Starbuck´s decidiram fazer boicote. Quem vive sem esses produtos tão essenciais?

 Pergunto aflito: “Mái gódi”, agora ferrou de vez, eles entraram numa montanha russa sem freios, morrerão de fome e sede. Somente salada russa com vodca para viver?

 Ela responde: Ainda bem que podemos contar com os EUA para salvar o mundo. Ufa!

 Como li pichado num muro: “ Deus salve a América. Deles próprios”. 


 

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