Por Jair Pedro Ferreira *
Antagônico ao que propõe o atual governo — que manobra para destruir o Estado de bem-estar social, as políticas públicas e as estatais — o desenho republicano de um novo cenário para o setor de previdência complementar é reflexo de um projeto de soberania e autonomia nacional, traduzido em gestão paritária em todas as instâncias de decisão dos fundos de pensão. Por atuarem como fontes de poupança interna de longo prazo, entidades como a Fundação dos Economiários Federais (Funcef), vinculada aos empregados da Caixa Econômica Federal, são imprescindíveis para o Brasil apostar em um caminho de desenvolvimento econômico e social.
Os sucessivos ataques governamentais aos fundos de pensão visam facilitar a transferência, para a gestão de bancos e seguradoras, de mais de R$ 1 trilhão em ativos acumulados pelas 369 entidades fechadas de previdência complementar do país, valor correspondente a mais de 18% do PIB brasileiro, segundo informações da Associação Brasileira das Entidades de Previdência Fechada (Abrapp). Este patrimônio pertence aos participantes, assistidos e dependentes, verdadeiros donos dos recursos dos fundos patrocinados por empresas estatais e entes públicos.
O golpe contra a presença dos participantes na governança das entidades fechadas de previdência complementar configura-se retrocesso e impede a representação democrática na Funcef, por exemplo, impondo obstáculos à participação de trabalhadores em seus processos de gestão, garantida pelas Leis Complementares 108 e 109, de 2001. Essa legislação representa avanço no processo de democratização da gestão dos fundos de pensão.
Por trás dessa tentativa de acabar com a paridade na gestão dos fundos de pensão, fica evidente a preocupação do atual governo de impedir que diretores e conselheiros eleitos, comprometidos com os participantes, tornem transparente a administração do seu patrimônio. É fundamental, portanto, defender a governança participativa nos fundos de pensão, conquista histórica que assegura sempre mais transparência.
No caso da Funcef, em particular, não dá para compactuar com manobras que comprometam a gestão democrática e ameaçam a existência da própria Caixa como banco social e 100% público. Uma das tarefas que se impõe aos participantes e assistidos de fundos de pensão é a da proteção dos direitos adquiridos e o cumprimento dos contratos, com revisão do marco regulatório e construção de um novo modelo com visão previdenciária de cunho civilizatório. Esse caminho, baseado na possibilidade de investimentos de longo prazo na economia real, tende a contribuir para um projeto de reconstrução do país, de modo a reafirmar a solidariedade como matriz organizativa da previdência, combinando a de conteúdo público com a complementar.
No âmbito institucional, uma das mais recentes ameaças responde pelo Projeto de Lei Complementar (PLP) 268/2016, que modifica o modelo de gestão dos fundos de pensão ao reduzir a participação dos trabalhadores nas instâncias de decisão dessas entidades. Com isso os participantes, que antes eram representados de forma paritária, passam a ter apenas um terço da representação nas diretorias e nos conselhos deliberativos e fiscais. É preciso, portanto, organizar a nossa resistência contra esses entulhos autoritários.
Hoje — diante de um cenário marcado pela destruição da economia, das instituições públicas e da soberania nacional —, o debate sobre os rumos da previdência complementar no Brasil passa pela defesa incondicional da democracia e dos direitos dos trabalhadores. Esse compromisso, em relação à Funcef, terceiro maior fundo de pensão do país, é com os participantes e não com a patrocinadora.
A Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão e de Beneficiários de Planos de Saúde de Autogestão (Anapar) sempre defendeu a transparência e democratização das instâncias de poder das entidades, sem o voto de qualidade. Esse posicionamento baseia-se na avaliação de que o patrimônio acumulado nos planos de benefício pertence aos participantes e aos assistidos, cabendo-lhes contribuírem na sua condução administrativa.
Democracia e transparência, face aos desafios estruturais em curso para o país, são componentes fundamentais para assegurar um futuro promissor aos fundos de pensão. Decisivo ainda é reforçar o diálogo com a sociedade e mostrar a importância dessas entidades para o dia a dia da população. Não há espaço para retrocessos, pois, definitivamente, o Brasil precisa de um sistema previdenciário público e complementar articulados para que o trabalhador disponha de uma aposentadoria digna, inclusiva, saudável e sustentável.
*Jair Pedro Ferreira é diretor de Formação da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae).
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.