Cristina Kirchner está a poucos dias de conhecer o desfecho do processo judicial, marcado para o próximo dia 6 de dezembro e em andamento desde 2019, no qual o Ministério Público da Argentina pediu 12 anos de prisão e sua inabilitação perpétua para concorrer a cargos públicos. Pela terceira e última vez, a vice-presidente apresentou nova defesa diante dos juízes, junto a outros 12 réus.
Suas primeiras palavras, via Zoom, foram: “Quando falei de ‘lawfare’ fui muito generosa, este tribunal é um pelotão de fuzilamento”.
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Independentemente do resultado, Fernández de Kirchner, ao que tudo indica, continuará ocupando lugar de centralidade na política argentina. E, por outro lado, também permanece a incógnita, se Cristina será ou não candidata a presidente em 2023, como tem clamado a militância nas ruas.
Ao criticar os promotores de justiça Diego Luciani e Sergio Mola, que acusam a ex-mandatária de supostos crimes de associação ilícita e fraude contra a administração pública, Cristina usou como exemplo os dois grandes meios, “Clarín” e “La Nación”, que sempre foram declaradamente anti-kirchneristas.
"Eles se dedicaram a insultar, difamar e agir, não de acordo com a lei, mas como um editorial do Clarín ou do La Nación”. Continuou: "Eles realmente merecem ser os jornalistas estrelas desses meios de comunicação, porque foi inacreditável o desapego aos fatos e às questões a fundo", ironizou. Em outro momento, saiu com suas costumeiras frases de efeito: “As opiniões são livres, mas os fatos são sagrados”.
Depois da declaração frente aos juízes, Cristina divulgou em suas redes sociais uma lista do que considera ser as “20 mentiras” cometidas pelos promotores. Segundo o Ministério Público local, Fernández de Kirchner teria favorecido o empresário Lázaro Báez, que também é réu no mesmo processo, em licitações públicas de “cartas marcadas”. Ela argumenta que não há provas sobre as 51 obras que foram entregues a Báez, durante o seu governo e o de seu marido, Néstor Kirchner, falecido em 2010. Afirmou que o orçamento de tais obras não foi feito diretamente por eles, e que foi algo que passou por diferentes órgãos públicos.
O jornal “LetraP”, editado pelo jornalista argentino Marcelo Falak, destacou a "mentira 12", quando a vice-presidente diz ser falsa a acusação de que houve aumento do montante orçamentário destinado a Báez: "Durante 2015, o poder Executivo reduziu consideravelmente a quantia desse orçamento, atribuído pelo Congresso à província de Santa Cruz, para a realização de obras rodoviárias". O processo investiga o desvio de verbas em obras públicas em Santa Cruz, entre 2003 e 2015.
Segundo matéria do jornal “DiarioAR”, Fernández de Kirchner teria mudado o tom enérgico com que se dirigiu aos juízes do tribunal em suas outras duas intervenções durante o julgamento, em 2019 e em agosto deste ano.
Eleições de 2023
Ainda que ocupada com sua situação judicial diante dos tribunais, e independentemente do veredicto marcado para o dia 6 dezembro, Cristina é quem hoje dirige de fato, junto com o ministro de Economia, Sergio Massa, as decisões do governo do presidente Alberto Fernández.
Mesmo considerando também a situação indefinida de sua própria candidatura, é a ex-mandatária quem ditará os nomes daqueles que entram ou não na lista de candidatos das internas partidárias do oficialismo, que se apresentam para as eleições primárias do próximo ano. Também chamadas de PASO (Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), a Argentina realiza as eleições primárias desde 2009. O processo eleitoral define quais partidos e candidatos participarão das eleições do ano corrente.
Além dos novos anúncios de congelamento de preços para conter uma inflação de 100%, do novo “dólar soja 2”, mais atrativo aos exportadores do setor de oleaginosas, para impulsionar a liquidação da safra, a agenda política nacional tem girado em torno a discutir as idas e voltas dos partidos e suas possíveis escolhas de candidatos para 2023.
A relação entre o presidente Alberto Fernández e a vice Cristina Kirchner continua reduzida a questões protocolares. Ambos ainda mantêm a agenda oficial, mas é sabido que quase não dialogam. Talvez, apenas o fundamental para manter publicamente a aliança que se formou, em 2018, constituída pelas intenções políticas estratégicas da vice.
*Maíra Vasconcelos é jornalista e poeta. Publica textos sobre política latino-americana no jornal GGN, desde 2014, e anteriormente no Blog do Nassif.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum