Palavras, atitudes e os perdigotos de Satanás – Por Pedro Fávaro Jr.

O tema central de hoje é a proposta de construção de uma sociedade mais justa e fraterna, pacífica e solidária. E o protagonista escolhido é o papa Francisco. O antagonista, claro, é o de sempre, Sua Excelência.

Bolsonaro tosse durante encontro com apoiadores no Alvorada (Reprodução)
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Por Pedro Fávaro Jr.*

O tema central de hoje é a proposta de construção de uma sociedade mais justa e fraterna, pacífica e solidária. E o protagonista escolhido é o papa Francisco. O antagonista, claro, é o de sempre, Sua Excelência que nos enche de motivos para tanto. O Papa pediu, nesta quarta-feira (26/1), que os pais não condenem seus filhos pela orientação sexual. A declaração ocorreu durante uma audiência geral com fiéis, no Vaticano, enquanto o pontífice falava sobre os desafios da paternidade. Essa não é a primeira vez que o Papa Francisco fala abertamente sobre a comunidade LGBTQIA+. No ano passado, ele defendeu que os homossexuais devem ter direito à união civil.

No discurso, divulgado na íntegra pelo site do Vaticano o Papa é direto: “Penso neste momento em tantas pessoas que estão esmagadas pelo peso da vida e já não conseguem ter esperança nem rezar... E penso também nos pais diante dos problemas dos filhos... Pais que veem orientações sexuais diferentes nos filhos; como gerir isto e acompanhar os filhos e não se esconder numa atitude condenatória?”, o Pontífice enumera muitos outros problemas dos pais e pede que recorram à fé e ao exemplo de São José, o pai terrestre de Jesus. “Pensemos em como ajudar estes pais. A eles digo: não vos assusteis. Sim, há o sofrimento. Muito. Mas pensai como José resolveu os problemas e pedi a José que vos ajude. Nunca condeneis um filho”.

O papa escolheu o nome Francisco, pela primeira vez e confessou ter sido por sugestão do cardeal dom Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo, para encarnar em si mesmo a necessidade de reformar a Igreja no despojamento, na transparência e na solidariedade humana encarnadas, que passam pelo acolhimento e serviço ao diferente, pelo diálogo com todos, pelo impulso de amor que leva a agir em favor do outro, em defesa do injustiçado, por pensamentos, palavras e atos.

Há muitas diferenças entre uma vida no equilíbrio, na busca pela verdade e solidariedade, no empenho pela paz e solidariedade e uma vida interessada em difundir o ódio e a indiferença, interessada em contentar a horda de racistas, homofóbicos, misóginos na construção de uma sociedade demoníaca, violenta, que exclui os pobres, esmaga as mulheres e mata o diferente - uma sociedade eugenista, fascista, nazista, miliciana, alicerçada num moralismo hipócrita, num cristianismo proselitista e opressor, que se diz evangélico mas é fundamentalista e não busca senão poder e riqueza para a sua elite edirmacediana.

Aqui é necessário recordar que os perdigotos de Satanás que aspergem essa horda mal sã, têm saído tanto da boca da ultradireita da bancada evangélica como da boca de Sua Excelência, por essa mesma multidão filisteia rebatizado no Jordão. Diferente do discurso de Francisco, podemos recordar aqui o que pensa e expressou não poucas vezes, publicamente o Excelentíssimo sobre os diferentes. “Não vou dar uma de hipócrita aqui: prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo”. Isso e as outras opiniões abaixo excedem o direito de ser livre para se expressar e configuram crime. Mas Sua Excelência então era vacinado com imunidade parlamentar. As frases foram ditas em sua maioria num evento na Hebraica do Rio de Janeiro e constam de denúncia feita então pela Procuradoria Geral da República (PGR) à época. Há muitas aberrações no pronunciamento que colocariam qualquer um dos leitores na cadeia. “Não vou combater nem discriminar, mas, seu vir dois homens se beijando na rua, vou bater”, incitando à violência. “Nós, o povo, a sociedade brasileira não gostamos de homossexual”, tomando para si uma opinião que de fato não representa a sociedade brasileira.

Numa entrevista à TV Câmara, a Excelência ainda deputado afirmou “O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro e muda o comportamento dele. Tá certo? Já ouvi de alguns aqui, olha, ainda bem que levei umas palmadas, meu pai me ensinou a ser homem”, outra afirmação ridícula.

Sobre as mulheres externou no seu tempo de campanha: “Eu tenho cinco filhos. Foram quatro homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio uma mulher... E mais, em entrevista ao Zero Hora: “Entre um homem e uma mulher jovem, o que o empresário pensa? ‘Poxa, essa mulher tá com aliança no dedo, daqui a pouco engravida, seis meses de licença-maternidade…’ Bonito pra c…, pra c…! Quem que vai pagar a conta? O empregador. No final, ele abate no INSS, mas quebrou o ritmo de trabalho. Quando ela voltar, vai ter mais um mês de férias, ou seja, ela trabalhou cinco meses em um ano” ... Sem comentário.

O Excelentíssimo também expressa um certo ódio aos indígenas - e a palavra indígena quer dizer aquele que é natural da terra - não aquele que comprou ou invadiu a terra. E afirma: “A área mais rica do mundo está exatamente demarcada como terra indígena, uma área maior que a região do Sudeste é demarcada como terra indígena. Tive em Roraima. Uma das acusações que recebo é xenófobo…. E eu sou contra estrangeiros aqui dentro”, para justificar o que hoje virou um ataque indiscriminado às reservas indígenas e o desprezo ativo ao meio-ambiente.

No mesmo falatório da Hebraica, a Excelência segue: “Isso aqui é só reserva indígena, tá faltando quilombolas, que é outra brincadeira. Eu fui em um quilombola em El Dourado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais. Mais de um bilhão de reais por ano gastado com eles”.

Para encerrar, antes que suba o vômito, a descrição de um perrengue com Preta Gil. “Preta, não vou discutir promiscuidade com quer que seja. Eu não corro esse risco, e meus filhos foram muito bem-educados e não viveram em um ambiente como, lamentavelmente, é o teu”, disse numa resposta à cantora sobre o que faria se seu filho se apaixonasse por uma mulher negra. Em sua defesa, o Excelentíssimo alegou que não havia entendido direito a pergunta, que pensou que se referisse a gays e não a negros, segundo o site Money Report que noticiou a encrenca.

Enfim, as diferenças nos pronunciamentos do Sumo Pontífice e dos perdigotos de Sua Excelência são abissais, como abissais são as diferenças de atitudes em relação à Saúde Pública, Vacinação, Pandemia, combate ao tráfico de drogas, Segurança e a pré-carestia em que o Brasil está colocado neste janeiro de 2022, com a gasolina a R$ 7 o litro, o gás de cozinha a R$ 102 e o dólar a R$ 5, 40. Todavia, o povo brasileiro, espremido por tanta mentira, começa a dar sinais uma consciência melhor a respeito desse quadro. Pesquisa PoderData divulgada na sexta-feira (21/1) mostra que 39% dos evangélicos brasileiros consideram ruim ou péssimo o trabalho do presidente Jair Bolsonaro. Entre os católicos, a rejeição vai a 60%. Assim seja e cresça a rejeição ao Excelentíssimo, amém!

Pedro Fávaro Jr. é jornalista, escritor e diácono permanente da Igreja católica

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.