Por Elídio Marques *
A "polarização" no debate político das últimas horas parece ter se deslocado para o tema... Alckmin. O que eu vi basicamente foi:
- Boulos deu uma entrevista divulgada como "Lula sim, Alckmin não" posicionando o PSOL e, de forma geral, a esquerda que apoiará o Lula (há um manifesto no PT de semanas antes, assinado por figuras sonantes da história daquele partido, mas que representam uma minoria hoje no mesmo sentido). O "Alckmin não" parece ser uma forma de dizer "conciliar excessivamente com o mercado, não"
- Lula deu entrevista pouco depois em que trata de vários temas e, inclusive, sinaliza Alckmin como vice.
- O Valor econômico dá a notícia de que o mercado teria reagido bem à perspectiva Alckmin e o dólar teria inclusive baixado por esta razão (por um "mero" vice ...)
- O MST - movimento de importância simbólica e histórica inegável, mas de alinhamento político ao Lula sinaliza pro Alckmin "ok, sim". Setores do PT "comemoram", segundo a mídia, a boa recepção do deus mercado.
O que se depreende é que "o mercado" (que não existe, são os capitalistas e seus instrumentos):
1- Está se conformando com o horizonte de não eleger um presidente de direita
2- Está mirando na disputa do sentido do governo Lula
3- Sabe que Alckmin vice não é uma bobagem, é um fiador, alguém a quem poderão recorrer
4- Não tem compromisso em deixar de soltar seus cães de guarda para tentar a sorte da virada ou dar uns sustos que renovem a lembrança de que precisam ser contemplados. Fazem, porque podem, um jogo múltiplo: se garantir com Lula, agitar Bolsonaro, sustentar 3a via.
Lula e seus próximos estão jogando esse jogo, apostando numa reedição da "conciliação". Dá sinais de disposição para ajustes (rever parte das contrarreformas, ainda não sabemos em que medida, mas é um sinal), mas também de compromisso com o regime econômico.
A esquerda que apoia Lula vê-se em espaços bem limitados. Depois de optar por um perfil bastante discreto, vê-se agora com margem pequena para se movimentar sem ser acusada de "estragar" o caminho. Terá que ser capaz de defender um programa para manter vivo e ativo um setor para defender as maiorias e se contrapor a conservadorismos suaves e agressivos que virão. Espero que consigamos.
A "aliança" em torno do caminho aparentemente fácil da conciliação parece muito ampla, como pareceu durante muitos anos antes do golpe e da ascensão de forças protofascistas ao governo do Brasil. As condições pra esquerda são mais desafiadoras e, até aqui, seu direcionamento parece insuficientemente mobilizador.
Derrotar o bolsonarismo, o neoliberalismo e a ditadura do capital. Este ano de 2022 é só um momento. Necessário, mas um momento.
*Elídio Marques é membro do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (UFRJ).
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.