Talibãs no Palácio do Planalto – Por Normando Rodrigues

Mais do que tanques fumacentos, ou parlamentares a granel, é a disputa internacional de forças o que sinaliza manter Bolsonaro e seus talibãs de pé, em meio ao genocídio brasileiro

Foto: Presidência da República
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Por Normando Rodrigues *

Troglodita

Afeganistão e Brasil são agora governados por corjas misóginas, racistas, homofóbicas, irracionais, anti-intelectuais e abissalmente hipócritas a respeito de corrupção, religião e família.

Síntese desses atributos, nosso presidente recebeu o de Portugal para um almoço em 2 de agosto, e ofertou um menu temperado por estúpido anedotário sobre mulheres e portugueses.

De uma civilidade incompreensível para o tosco usurpador do Planalto, Marcelo Rebelo suportou a demonstração de barbárie sem passar recibo, e se serviu de associações culturais para o devido recado.

Recado

Portugal se sente ofendido, e aguarda pedidos de desculpas, presumíveis apenas num futuro governo brasileiro, não fascista.

A elegância do chefe de estado luso demonstrou o domínio da linguagem diplomática, idioma no qual, por vezes, se afirma o oposto do que se diz.

Exemplo concreto, quando o Secretário de Estado dos EUA declarou que a queda de Kabul não foi “uma Saigon”, é porque foi.

Derrotado

Do mesmo modo que no Vietnã, a “América” foi derrotada no Afeganistão. Biden, como Nixon e Ford em 1974-75, teve o mérito de reconhecer o fato, embora sem o chamar pelo nome, também assim imitando seus antecessores.

E um nome oculto nas duas grandes humilhações do Império Americano é o da CHINA.

O trauma da revolução chinesa de 1949, e da perda de mercado que significou para as empresas dos EUA, se tornou o vetor que afastou a Casa Branca do partido de Ho Chi Minh, e levou ao vexame ianque de 30 de abril de 1975.

Seda

Meio século depois, o maniqueísmo de Bush Jr. fez da invasão do Afeganistão uma ofensiva sem objetivos, ditada pelos contratos do Pentágono. O fruto agora colhido é um “fracasso abjeto”, segundo o Washington Post.

Revés do Império, sucesso da China. A “Nova Rota da Seda” envolve por dois lados a fronteira afegã. No norte-nordeste o faz com o gasoduto que se inicia em Gedain, no Turcomenistão, e que abastecerá o extremo-oeste chinês.

E nessa região fica a cidade-oásis chinesa de Casgar, de onde parte o corredor econômico que margeia o perímetro sul-sudeste do Afeganistão e segue até o estratégico porto paquistanês de Gwadar, na boca do Golfo Pérsico.

Cúpula

Estabilizar o Afeganistão é, portanto, estratégico para o governo chinês, que recebeu o chefe político dos talibãs em 28 de julho, e em 16 de agosto declarou que respeitará a autodeterminação afegã, no que foi logo seguido pela Rússia.

Na tentativa de recuperar o prestígio imperial e alinhar forças contra China e Rússia, Tio Sam convocou para dezembro a “Cúpula da Democracia”.

Por interessar aos americanos barrar a Huawei no 5G brasileiro, é provável que nosso presidente fascista seja convidado para a cimeira como um “democrata”, tal como o cristão-sanguinário Franco foi tratado pela Otan, nos anos de 1950-60.

Guerra Fria

No equilíbrio de poder da nova Guerra Fria, cada lado tem seus trogloditas locais. Pouco importa para as potências que Brasil e Afeganistão sejam palco de genocídio e de destruição ambiental e cultural.

Importa apenas que as “civilizadas” Washington e Pequim sejam servidas por neandertais tais como Bolsonaro e seus fascistas, de um lado, e os talibãs, de outro.

Bandos saídos das cavernas para espalhar trevas sob promessas de restauração dos valores tradicionais da família, de colocar Deus acima de tudo, de reduzir a corrupção, de aumentar a segurança pública e de estimular o comércio.

*Jorge Normando Rodrigues é assessor jurídico do Sindipetro-NF e da FUP.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.