Os fanáticos do bolsonarismo - Daniel Trevisan Samways

É possível dialogar com essas pessoas? É viável ter alguma empatia com quem quer nos destruir, nos aniquilar e acabar com nossa atuação social e política? É aceitável um movimento que pede a volta da ditadura e louva torturadores?

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Por Daniel Trevisan Samways *

No atual cenário, é possível tolerar quem ainda insiste em apoiar o governo Bolsonaro? Defendê-lo, depois de tudo que fez e continua fazendo, é atacar a própria democracia em nome do autoritarismo. Bolsonaro atua o tempo todo contra a democracia, afirmando defender a liberdade. Mas é a liberdade para atacar, matar, ser preconceituoso e destruir a nação. Em nome de um neoliberalismo autoritário, que persegue minorias e ataca direitos sociais e trabalhistas duramente conquistados, Bolsonaro avança no desmonte do Estado para atender um pequeno grupo.

Pare por alguns segundos e lembre tudo que prometeram desde o golpe de 2016. Era só tirar a Dilma que o PIB dobraria. Bastava aprovar a Reforma Trabalhista para gerar milhões de empregos. Faltava impor o teto de gastos para ganhar a confiança dos investidores. Ah, e uma reforma draconiana da previdência para o país não quebrar. Bolsonaro dobrou a aposta e acelerou o movimento neoliberal de desmonte da máquina pública, essencial em qualquer lugar para impulsionar o desenvolvimento. Só seguidores de Ayn Rand e filhotes da Escola Austríaca para caírem na falácia de que o Estado atrapalha a economia. O que temos hoje? Um país destruído, desemprego, fome, miséria, ataques à pesquisa e à educação. Viramos um pária, como desejava Ernesto Araújo.

O governo Bolsonaro está longe de ser apenas um movimento neoliberal de desmonte do Estado. Ele está destruindo a própria sociedade em um ritmo muito acelerado. A pandemia vem atingindo números horríveis graças ao descaso de seu governo. São milhares de mortes que poderiam ser evitadas. São vidas, histórias, abraços e sorrisos perdidos. São milhões largados à própria sorte, sem emprego, sem renda, sem futuro. Bolsonaro empurrou pessoas para o abismo numa dicotomia entre “saúde X economia”, não salvando nem a saúde, tampouco a economia. Bolsonaro só sabe salvar a si próprio e seus filhos.

Essa triste história conta com a participação de uma fatia expressiva da sociedade, crente de que segue o verdadeiro Messias. Se a internet deu voz a uma legião de imbecis, como alertou Umberto Eco, Bolsonaro conseguiu transformá-la em uma seita raivosa e antidemocrática, que parece viver em um transe coletivo. São pessoas que celebram a morte, com uma clara inspiração fascista. Vibram com discursos e rompantes autoritários e seguem berrando “mito, mito”. Para eles, Bolsonaro sempre tem razão e está sempre certo. A verdade torna-se aquilo que Bolsonaro diz que é verdade. “No fascismo, a forma máxima da verdade não exigia corroboração com evidência empírica: antes, ela emanava de uma afirmação intuitiva de noções que eram supostamente expressões dos mitos trans-históricos. O líder incorporava tais mitos”, afirma Federico Finchelstein, em “Uma breve história das mentiras fascistas”. Bolsonaro leva seu gado, literalmente, para onde quiser. Se ele diz que um medicamento funciona para a Covid-19, logo torna-se a cura real. Todos os argumentos em contrário não são aceitos, mesmo que científicos, sendo encarados como parte de um complô do “globalismo”, financiado pela esquerda e George Soros, com a divulgação da “extrema imprensa comunista”. Isso vale para tudo que Bolsonaro diz, sendo compartilhado milhões de vezes nas redes sociais. Seus apoiadores repetem incansavelmente os mesmos argumentos, atuando fortemente na destruição da democracia.

É possível dialogar com essas pessoas? É viável ter alguma empatia com quem quer nos destruir, nos aniquilar e acabar com nossa atuação social e política? É aceitável um movimento que pede a volta da ditadura e louva torturadores? Temos que nos calar frente ao autoritarismo e a tantas ameaças? Com certeza não.

*Daniel Trevisan Samways é doutor em História e professor no Instituto Federal do Triângulo Mineiro (IFTM).

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.