Por O Planeta Azul
A escala planetária da pandemia e os desafios complexos que ela impõe em áreas tão distintas quanto a saúde e a economia não podem ser administradas com políticas nacionais isoladas. É o que diz Dawisson Belém Lopes, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em entrevista exclusiva a Rodolpho Gamberini, para O Planeta Azul.
A Covid-19 é um exemplo bem acabado do que especialistas em relações internacionais chamam de “desafio global”. Como o sentido leigo da expressão sugere, um “desafio global” é um problema que transcende fronteiras. Mas não apenas. Academicamente, o conceito diz respeito à concertação entre complexas estruturas de poder que por vezes podem se chocar, se limitar ou competir entre si na hora de estabelecer políticas coletivas, num contexto em que a soberania nacional não desaparece, mas pode se ver relativizada.
Há vários dados simultâneos que contribuem para desgastar a imagem do país no mundo. O Brasil atravessa um dos maiores retrocessos econômico e social da sua história e está se afastando do clube dos países mais ricos. Na contramão da economia mundial, é o único país em desenvolvimento com desaceleração do crescimento no primeiro trimestre, segundo a OCDE. De sexta maior economia do mundo em 2011, hoje ocupa a 13ª posição, pelo critério de PIB em dólares. E o governo entregará, até o final deste ano, uma economia menor daquela que herdou do governo de Michel Temer. O Brasil conclui a segunda década perdida desde a redemocratização, com queda na renda per capita de 8%. No ranking do FMI, o Brasil caiu da 77ª posição para a 85ª entre 191 países.
A diplomacia adotada pelo presidente Jair Bolsonaro tem afastado o Brasil dos organismos internacionais e da possibilidade de integrar blocos comerciais relevantes. O governo norte-americano colocou um freio de mão na pretensão brasileira de ingressar na OCDE, por conta da política ambiental de Bolsonaro. E a zona de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, que era a principal aposta do governo para impulsionar o crescimento a médio prazo, já faz água pelas críticas ácidas aos líderes europeus, que estão cada vez mais pressionados em seus países para seguir compromissos climáticos. O Brasil era o condutor do Mercosul. Agora, virou um obstáculo para os seus vizinhos, que preferem negociar sem o parceiro problemático. Historicamente, é a primeira vez que o Brasil deixa de exercer sua liderança natural na América do Sul.